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O crime de caixa 2 eleitoral e a audiência pública de 10/10/2016

O crime de caixa 2 eleitoral e a audiência pública de 10/10/2016

Na última oportunidade (clique aqui) falamos sobre a origem do projeto de lei das 10 medidas contra a corrupção (PL 4850/2016) e da apresentação, pelo Senador Telmário Mota (PDT – RR), do PLS (Projeto de Lei do Senado) n. 348/2016, um dia após a tentativa de votação apressada de uma anistia a quem tivesse cometido a conduta até aquele momento.

A proposta é de alterar a Lei n. 9504/97 para incluir o art. 32-A, que prevê como pena reclusão de 2 a 5 anos, prevê como crime “manter, movimentar ou utilizar qualquer recurso ou valor paralelamente à contabilidade exigida pela legislação eleitoral”.

Trata-se de proposta, no tocante ao crime de caixa 2 eleitoral, idêntica a do projeto de lei que trata das 10 medidas contra a corrupção, mas tramitará autonomamente e em outra casa legislativa, pois apresentado diretamente no Senado Federal, enquanto as “10 medidas” tramitam na Câmara dos Deputados.

O §1º dispõe que incorrem nas penas do caput os candidatos e os gestores e administradores dos comitês financeiros dos partidos políticos e das coligações. Por esta redação, trata-se de crime próprio. O seu §2º prevê causa de aumento de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), no caso de algum agente público ou político concorrer, de qualquer modo, para a prática criminosa.

No dia 10 de outubro de 2016, a Comissão especial que analisa o PL 4850/2016 realizou audiência pública para tratar especificamente, no bojo daquele projeto, da criminalização do caixa 2 eleitoral. Foram ouvidos os Srs. Nicolau Dino, Procurador Geral Eleitoral, José Eduardo Alckmin, jurista e ex-Ministro do Tribunal Superior Eleitoral, Fabrício Juliano Medeiros, professor de Direito Constitucional e Eleitoral e Cristiano Maronna, advogado, professor e represente do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais.

O relator da Comissão especial, Deputado Federal Onyx Lorenzoni, afirmou que “o Caixa 2 é um dos maiores fantasmas da vida pública brasileira. Por isso é preciso deixar esse tema bem esclarecido, bem definido. Que ele deva ser definido como crime a partir de agora, eu não tenho nenhuma dúvida”.

Nicolau Dino, defendendo a criminalização do caixa 2, afirmou que são insuficientes as atuais disposições sobre o acerca do caixa 2, seja para a responsabilização pessoal seja para prever consequências aos partidos políticos que se valham deste mecanismo. Para o Procurador, não há um tipo penal específico atualmente na legislação penal que seja aplicável a todas as situações de caixa 2 eleitoral. Justifica afirmando que o art. 350 do Código Eleitoral é aplicado apenas no momento da prestação de contas dos partidos políticos, quando há omissão ou prestação de declaração falsa, ou seja, quando não houver prestação de contas, o tipo penal não incide.

José Eduardo Alckmin concordou com a exposição do Procurador Geral Eleitoral e defendeu que o art. 350 do Código Eleitoral é um tipo aberto e não há crime quando não há prestação de contas. Para justificar este posicionamento, José Eduardo Alckmin afirmou a existência de vários acórdãos do E. TSE que a denúncia não foi aceita por entender que sem uma demonstração cabal do dolo específico, não há crime. Por fim, sugeriu que em relação a este tipo do art. 32- A deveria esclarecer que, nestas situações, não há aplicação do art. 350 do Código Eleitoral, “para não haver mais a esta dúvida que vem atormentando os tribunais”.

Segundo José Eduardo Alckmin, a atual redação da proposta ensejaria uma discussão infindável sobre qual a correta tipificação da conduta.

Fabrício Juliano Medeiros concordou com os expositores anteriores, inclusive no tocante à inaplicabilidade do art. 350 do Código Eleitoral em todas as situações e a necessidade de criação de um tipo específico para o caixa 2 eleitoral.

Afirmou que a redação do art. 32-A ainda pode ser aperfeiçoada e sugere que inclua no caput o bem estimável em dinheiro, já que pode haver caixa 2 não apenas em dinheiro em espécie, mas como doação estimada (prestação de serviço). A segunda sugestão é de alterar a parte final do caput de “legislação eleitoral” para “lei eleitoral”, pois naquela primeira expressão incluem-se também as resolução do Tribunal Superior Eleitoral.

Sugere também a supressão do §1o do art. 32-A porque restringe a aplicação ampla do caput. Isto porque o caixa 2 pode ser praticado por terceiros e a atual redação da proposta limita a prática do crime apenas aos candidatos e aos gestores e administradores dos comitês financeiros dos partidos políticos e das coligações.

Ainda, entende que o projeto deveria definir, para fins de aplicação da norma, quem são os agentes públicos ou políticos.

Estes foram os posicionamentos favoráveis à aprovação do projeto de lei em questão, com algumas sugestões pontuais de redação legislativa.

Antes de tratarmos do único posicionamento contrário à aprovação, do professor e advogado Cristiano Maronna, tema da nossa próxima semana, é importante apontar uma incongruência nas falas dos eminentes juristas ouvidos naquela audiência pública.

Caso o crime de caixa 2 eleitoral não tivesse previsão legal alguma, haveria razão de sustentarem que o tipo penal do art. 350 do Código Eleitoral apenas incide nas hipóteses de apresentação da prestação de contas?

E mais. Caso o crime de caixa 2 eleitoral não tivesse previsão legal alguma, haveria razão de apoiarem que o tipo do art. 32- A deveria esclarecer que, nestas situações, não há aplicação do art. 350 do Código Eleitoral?

E por fim, com o intuito de fomentar o debate e instigar o leitor, questiono se não seria mais razoável um projeto de lei para alteração do tipo penal do art. 350 do Código Eleitoral, fazendo-o incidir indiscriminadamente em todas as situações (com ou sem prestação de contas), ao invés de propor um novo tipo penal autônomo. crime de caixa 2 eleitoral crime de caixa 2 eleitoral crime de caixa 2 eleitoral crime de caixa 2 eleitoral

Danyelle da Silva Galvão

Advogada. Doutoranda em Direito Processual. Mestre em Direito Processual. Professora de Direito.

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