O instituto da alienação antecipada de bens na Lei da Lavagem de Capitais
Por Felipe Faoro Bertoni
Art. 4º-A. A alienação antecipada para preservação de valor de bens sob constrição será decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou por solicitação da parte interessada, mediante petição autônoma, que será autuada em apartado e cujos autos terão tramitação em separado em relação ao processo principal.
Ninguém pode ser privado de seus bens ou de sua liberdade sem o devido processo legal. Sobretudo se essa privação não decorrer de sentença penal condenatória com trânsito em julgado. Todavia, eventual e excepcionalmente pode ocorrer a alienação antecipada de bens no âmbito de um processo penal.
A medida cautelar real mencionada não é inovação em nosso ordenamento jurídico, tendo já referência no próprio Código de Processo Penal, na Lei n.º 11.343/2006 e, mais recentemente, na Lei n.º 12.694/2012. O instituto é digno de grande relevo e constitui-se na possibilidade de alienação de bens apreendidos a ser determinada pelo magistrado antes da formação final da culpa, perfectibilizada por uma condenação definitiva.
De fato, tal figura jurídica se mostra plenamente apropriada e sua aplicação se justifica em determinadas situações, excepcionais, evidentemente. As hipóteses legais de cabimento da alienação antecipada encontram-se dispostas no artigo 4º, §1º, da Lei 9.613/1998, verbis:
Art. 4o O juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação do delegado de polícia, ouvido o Ministério Público em 24 (vinte e quatro) horas, havendo indícios suficientes de infração penal, poderá decretar medidas assecuratórias de bens, direitos ou valores do investigado ou acusado, ou existentes em nome de interpostas pessoas, que sejam instrumento, produto ou proveito dos crimes previstos nesta Lei ou das infrações penais antecedentes.
§1º Proceder-se-á à alienação antecipada para preservação do valor dos bens sempre que estiverem sujeitos a qualquer grau de deterioração ou depreciação, ou quando houver dificuldade para sua manutenção.
No ponto, importa atentar para a extrema amplitude da disposição legal, devendo esta ser interpretada de forma restritiva. Exemplificativamente, nos casos de bens infungíveis – como obras de arte preciosas – em que haja dificuldade para manutenção, mas não a desvalorização ou deterioração com o tempo, faz-se necessária grande ponderação acerca da aplicação do instituto, a fim de evitar afronta ao direito patrimonial de sujeito presumidamente inocente.
Ademais, é prudente a advertência de que a aplicação desta medida deve-se constituir em excepcionalidade e observar os estritos requisitos legais. Se assim não for o entendimento, corre-se o risco de cometer flagrantes injustiças. Toma-se como exemplo ocasião em que há a apreensão de bens de grande valor comercial, os quais sofrem uma avaliação deficitária e são alienados por valor ainda mais baixo do que o avaliado. O deslinde processual demonstra um panorama favorável à absolvição, que efetivamente ocorre. Nesse caso hipotético, o prejuízo financeiro sofrido pelo cidadão é patente e irreparável.
No mesmo sentido, entende-se que a participação da defesa do acusado, por meio de vista do pedido e possibilidade de manifestação e impugnação – em atenção ao princípio do contraditório e também da ampla defesa – é medida imprescindível ao correto procedimento e lisura da medida assecuratória.
Desta forma, de grande valia e extrema importância este instituto para a persecução, prevenção e controle da lavagem de capitais. Contudo, atenta-se para a necessidade de parcimônia e serenidade em sua aplicação.