Por Henrique Saibro
Era na Lei de Execução Penal, especificamente no art. 146-B, que o monitoramento eletrônico possuía previsão na legislação criminal, possibilitando ao magistrado da Execução Penal a fiscalização das saídas temporárias no regime semiaberto e a prisão domiciliar dos apenados.
Mas foi com a vigoração da Lei das Medidas Cautelares (Lei nº 12.403/11), que o monitoramento eletrônico (vulga tornozeleira) virou uma opção ao julgador frente à grave prisão preventiva, desde que respeitados os princípios do fumus commissi delicti e periculum libertatis – conforme inciso IX do art. 319 do CPP.
O Projeto de Lei (PL) nº 8.045/10, de autoria de José Sarney, visa reformar o atual CPP. Há profundas alterações no que concerne às medidas cautelares, mas, à míngua do presente artigo, vamos abordar a monitoração eletrônica. Para maior aprofundamento na matéria, recomenda a leitura do livro “Processo Penal e Garantias Constitucionais”, organizada por Nereu José Giacomolli e Vinicius Gomes de Vasconcellos. O capítulo III aborda especificamente as modificações trazidas pelo PL das medidas cautelares pessoais diversas do encarceramento.
Pois bem. Uma das inovações do PL consiste na redação do art. 591, que limita a implantação do monitoramento eletrônico apenas em crimes cujo limite máximo da pena privativa de liberdade cominada seja igual ou superior a 4 anos. Notável o zelo do legislador em somente permitir a aplicação de tal medida em casos mais graves, pois, dentre as outras cautelares pessoais diversas da prisão, é a que mais atinge a intimidade e liberdade do réu.
Igualmente, o art. 592 do PL pressupõe, para a implantação da monitoração, a prévia anuência do acusado como alternativa a outra medida, devendo ser externada em termo específico. Sem falar na preocupação que o art. 593 apresenta à imagem do imputado, pois refere que o dispositivo eletrônico “não terá aspecto aviltante ou ostensivo, nem colocará em risco a saúde do imputado, sob pena de responsabilidade do Estado” – o que se presume o encargo de uma indenização.
Sobre esse ponto específico, já é hora de o legislador dar atenção ao hardware vexatório dos aparelhos de monitoramento, pois todos dispositivos que conheço atualmente são enormes e aparentam um tijolo; alguns impossibilitam, por sua estrutura, a utilização de calças – o que obrigam o apenado a ostentar a marca de um apenado à sociedade.
Já os incisos do art. 594 do PL indicam quais as hipóteses de descumprimento da medida cautelares:
(I) a danificação ou rompimento do dispositivo eletrônico, ou de qualquer maneira a atitude que adulterá-lo ou ludibria-lo;
(II) o desrespeito aos limites territoriais fixados na decisão judicial;
(III) deixar de manter contato regular com a central de monitoramento ou não anteder à solicitação de presença.
Todavia, não devemos passar em branco a crítica de que pontos polêmicos sobre a monitoração eletrônica foram esquecidos ou ignorados. Afinal, o monitoramento eletrônico pode ser um meio legítimo de obtenção de prova; há possibilidade de utilização de seus dados em outros processos, que não aquele em que o imputado estaria sendo vigiado? Ou seja, essas informações serviriam de prova de cometimento de um delito ou como comprovação de álibi?
E mais: admitindo a monitoração como meio legítimo de prova, bastaria um mero pedido do Ministério Público, ou seria necessária uma autorização judicial, por decisão fundamentada, para a obtenção desses dados? Poderia a polícia solicitar esses dados em inquérito policial?
Todas essas perguntas ficam, ao menos por ora, sem uma resposta legal.
Imagem: The Gazette (2014)