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O papel do advogado no acordo de não persecução penal

O papel do advogado no acordo de não persecução penal

Como é notório, o acordo de não persecução penal transformou o Direito Penal e Processual Brasileiro, tornando-se a maior novidade legislativa do Pacote Anticrime. Consequentemente, trouxe também o referido instituto como o maior difusor ampliativo da Justiça Consensual no Brasil, ao lado da transação penal, suspensão condicional do processo e colaboração premiada.

Sintetizando o conceito de não persecução penal, Rogério Sanches Cunha:

Ajuste obrigacional celebrado entre o órgão de acusação e o investigado (assistido por advogado), devidamente homologado pelo juiz, no qual o indigitado assume sua responsabilidade, aceitando cumprir, desde logo, condições menos severas do que a sanção penal aplicável ao fato a ele imputado”.

Mas afinal, você sabe realmente qual é o papel e o grau de importância do advogado no acordo de não persecução penal?

Para que seja possibilitado ao acusado o oferecimento do referido instituto despenalizador, o art. 28-A do Código de Processo Penal prevê algumas condições:

I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo;

II – renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

III – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);

IV – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal),a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito;

V – cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

A partir daí você consegue observar a importância da participação do advogado no acordo de não persecução penal. O que chama atenção é o que consta no inciso  V do art. 28-A do CPP:

V – cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal imputada.

O dispositivo transcrito esclarece que as condições a serem firmadas com o acusado não precisam ser necessariamente as já prescritas legalmente, podendo o órgão acusador indicar condições que considere adequadas a imputação delituosa do caso em análise. Perceba o grau de discricionariedade que o legislador possibilitou ao Ministério Público para acrescentar no referido acordo a cláusula que entender pertinente a cada caso concreto.

Diante de tal discricionariedade da referida previsão, acaba reforçando a necessidade não só do advogado para as tratativas do presente acordo, mas de uma postura ativa para discutir as cláusulas mais viáveis ao caso concreto. Até porque a própria legislação nos traz, em seu §3º do art. 28-A, a estrita obrigatoriedade de que o advogado esteja presente e assine o termo de não persecução em conjunto com o acusado. Mas não deve ser só simplesmente uma participação de “cumprimento de tabela”.

A presença não pode ser observada de maneira passiva, sendo de total importância que a advogado assuma uma postura interventiva e incisiva nas formulações pretendidas pelo Ministério Público. Ou seja, permitindo no caso concreto o melhor cenário ao acusado na formulação de condições compatíveis.

Então perceba que para que o acordo de não persecução penal seja firmado de maneira coerente, sem que haja qualquer afronta aos direitos fundamentais ou garantias constitucionais, é necessário que o advogado estude de forma criteriosa o caso concreto e participe ativamente na elaboração das condições, construa o termo em conjunto com o Ministério Público, impedindo-o de criar condições de cumprimento prejudiciais ao acusado, ou, que venham a significar restrição à sua liberdade de forma indevida e desnecessária.

Urge salientar, por óbvio, que o acordo de não persecução penal deve-se tratar de iniciativa voluntária, não devendo ser o acusado, de qualquer forma, induzido ou instigado para realização a formalização e homologação do acordo, devendo o advogado sempre  priorizar para que isso não ocorra durante todo o acompanhamento e tratativa do referido instituto despenalizador, sempre zelando para que o magistrado competente certifique-se e averígue tal requisito.

Ou seja, para que venha a se tratar de uma proposta legalmente efetiva, é de suma importância que o acusado possa estar assistido por uma defesa plena, para que haja uma participação extremamente ativa quanto a elaboração das condições, sua forma de cumprimento e também no que diz respeito aos requisitos legais e preceitos constitucionais a serem observados.

A participação incisiva do advogado é, sem dúvida alguma, necessária na elaboração destes acordos, pois caso contrário, estamos sujeitos a virarmos refém de uma cultura de justiça penal consensual já introduzida em nosso país onde raramente se vê a discussão real de cláusulas e termos. Ou seja, estaríamos possibilitando ao Ministério Público tornar-se ativo e abrangente de maneira exorbitante, acumulando-se de funções do próprio juiz.

Deve então as particularidades e regras processuais do acordo de não persecução penal serem estabelecidos de maneira totalmente detalhada, não possibilitando lacunas no tocante ao procedimento a ser seguido e que possam vir a resultar qualquer tipo de prejuízo ao acusado.

REFERÊNCIAS

CUNHA, Rogerio Sanches. Pacote Anticrime Lei 13.964/2019: comentários às Alterações no CPP, CPP e LEP. Salvador: Juspodvm, 2020.

Leia também:

The Post: a guerra secreta


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Pedro Monteiro

Sócio do escritório Araujo & Sandini Advogados Associados, Advogado Criminalista, Especializando em Ciências Criminais pelo Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina – CESUSC, Especializando em Direito Penal Econômico pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais - PUC/MG e Presidente da Comissão de Segurança Pública e Assuntos Prisionais da 30ª Subseção da OAB/SC.

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