O que você precisa saber sobre o crime de perseguição (stalking)?

Por Bruna Andrino de Lima e Victória Martins Maia. Recentemente tivemos, por meio da Lei nº 14.132/2021, a inclusão de um novo crime no Código Penal, o qual acrescenta o art. 147-A ao Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940, para prever o crime de perseguição e revogar o art. 65 do Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais).

O crime de perseguição

A nova tipificação penal ficou conhecida como stalking. Trata-se do termo em inglês utilizado para referir perseguição obsessiva e constante. Segundo o legislador, a conduta típica é perseguir alguém, reiteradamente e por qualquer meio, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade.

Antes da inovação legislativa, tal conduta seria enquadrada apenas como contravenção penal, nos moldes do artigo 65 do Decreto-Lei 3.688/41 (redação antiga e ultrapassada). Ocorre que, com o avanço da tecnologia e os impactos das ações de perseguição, com, muitas das vezes, consequências gravosas ao psicológico da vítima, restou necessária a inclusão de novo tipo penal.

Desde já cabe destacar que, em que pese seja facilmente possível visualizar tal conduta criminosa no âmbito da violência doméstica (ex. ex-companheiro que rotineiramente persegue redes sociais da vítima, a intimidando e restringindo sua liberdade de expressar-se), o delito pode ser praticado em qualquer esfera, desde que observados os termos da previsão legal.

Com efeito, conforme se percebe pela redação exposta no artigo em comento, não é mera perseguição que caracteriza o delito em análise. É imprescindível a ameaça à integridade física ou psicológica ou a restrição da capacidade ou locomoção, sendo que tais requisitos devem ser evidentemente demonstrados pela acusação para que se possa chegar ao decreto condenatório.

Outrossim, igualmente indispensável que a perseguição seja reiterada, tratando-se, assim, de crime habitual. Ou seja, há a necessidade de reiteração de atos, cabendo ao Juiz analisar o caso concreto para verificar se a repetição de atos tem valor jurídico, atingindo os bens que se buscam tutelar, ou não (lembrando sempre, o direito penal deve ser utilizado como ultima ratio). Consequentemente, não há a possibilidade de tentativa nesse novo tipo penal.

Trata-se de crime apurado em processo mediante representação do ofendido (art. 147-A, § 3º do CP) e que tem a pena aumentada em caso de cometimento contra criança, adolescente ou idoso, mulher por razões da condição do sexo feminino e quando praticado mediante concurso de duas ou mais pessoas ou com emprego de arma (art. 147-A, §1º do CP). Necessário frisar que o legislador indicou emprego de arma de forma genérica, ou seja, não somente o emprego de arma de fogo, mas de qualquer objeto, ainda que não seja bélico, que possa ter utilizado como instrumento de arma contra alguém, tal como faca, pedaço de vidro, etc.

Importante destacar também que caso presente causa de aumento de pena, a competência para processamento e julgamento deixa de ser do Juizado Especial Criminal, passando a ser da Justiça Comum. Ademais, as penas deste artigo podem ser cumuladas com pena correspondente à eventual violência praticada pelo agente (ex.: além de praticar a perseguição, pratica o delito de lesão corporal contra a vítima), conforme previsão do §2º do art. 147-A.

É salutar referir que o dispositivo penal abarca a ação de perseguição praticada na esfera presencial (stalking) ou virtual (cyberstalking), posto que pode ser praticado mediante telefonemas, correspondências, e-mails, envio de presentes, contato por redes sociais, gestos, dentre outros, desde que caracterizada a ameaça à integridade física e psíquica da vítima ou a restrição de sua capacidade de locomoção ou invasão/perturbação de sua liberdade e privacidade. Trata-se de delito de ação livre, opção adotada pela legislação para abarcar de forma mais ampla a conduta do criminoso e lograr êxito em sua responsabilização.

De qualquer sorte, é notório, principalmente aos atuantes na prática penal, que a inclusão de novos tipos penais ou o agravamento da responsabilização, não são por si só suficientes ao combate de condutas criminosas. Faz-se necessário a implementação de políticas que visem efetivamente educar a população e façam com que o Estado possa atuar de forma preventiva, já que quando o direito e o processo penal são aplicados, o bem que se busca tutelar já foi atingido ou, ao menos, sofreu a tentativa de o ser.

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