Olimpíadas 2016: polícia brasileira x turistas estrangeiros
Por Dayane Fanti Tangerino
A coluna de hoje teve seu mote na conjugação de três fatores: primeiro no fato de que sou amante de esportes e fico empolgada – apesar de todos os pesares – com o fato de recebermos uma olimpíada no Brasil; em segundo lugar, no conteúdo de uma conversa informal e despretensiosa travada entre amigos há algum tempo atrás e, por fim, no fato de que no final desta semana, mais precisamente no dia 05/08/2016, terão início, no Brasil, na cidade do Rio de Janeiro, os jogos olímpicos de 2016, evento esportivo que trará ao País inúmeros estrangeiros, muitos dos quais não conhecem nossa legislação penal.
Pois bem! Feita essa necessária introdução, narrarei, resumidamente, a situação fática verídica propulsora da coluna de hoje.
Há algum tempo atrás um grupo de amigos conversava sobre assuntos diversos quando um deles lançou um desafio: cada um dos integrantes do grupo deveria narrar algum episódio interessante e, de preferência, engraçado pelo qual havia passado, a fim de, com tais histórias engraçadas, entreter o grupo que ali se reunia para celebrar a amizade e dar boas risadas. E assim a coisa se desenvolveu, com cada um deles narrando histórias e fazendo com que todos rissem e se divertissem, até que chegou a vez de um rapaz de origem russa – que havia se radicado no Brasil com sua família havia pouco tempo e que integrava o grupo – divertir os amigos com uma de suas peripécias.
O rapaz, que falava um português bastante “arrastado”, mas bastante compreensível, passou a narrar seu feito contando que, certa vez, transitava com seu veículo automotor por uma cidade do interior paulista, na qual residia há poucos meses, quando fora abordado pela autoridade policial que, naquela oportunidade, fazia inspeções de trânsito de rotina e que, através de sinal gestual, determinou que ele parasse seu veículo.
Após estacionar o carro no local determinado pela autoridade policial, abriu o vidro do veículo para ouvir o que dizia o policial que, aproximando-se do veículo, solicitou-lhe os documentos de praxe. De posse dos documentos e verificando tratar-se de um estrangeiro, encostou, o polícial, próximo da janela do rapaz e lhe perguntou: “Você tem alguma arma no carro?”. Esta pergunta, tão corriqueira a nós, brasileiros, ao estrangeiro soou bastante amedrontadora, fazendo com que ele ficasse paralizado e com os olhos claros esbugalhados ante o policial.
Percebendo a estranha reação do rapaz o policial passou a ser mais incisivo em seu questionamento, reiterando a pergunta, de forma pontual e objetiva: “Como é? Você tem ou não uma arma no carro?”. E nada do rapaz responder! A cada vez que o polícial reperguntava sobre a existência ou não de uma arma no veículo, mais o rapaz ficava apavorado, o que causava mais estranheza e furor no policial, que passou a gritar, berrar e esbravejar com o motorista, advertindo-o das consequências que lhe sobreviriam, caso tivesse em seu porte uma arma irregular, advertências estas que, para o aterrorizado e mal compreendido estrangeiro mais pareciam ameaças, o que lhe paralizada mais e mais.
Ocorre, caro leitor, que o rapaz russo não possuia em seu veículo nada demais, mas apenas e tão-somente um boken, espada de madeira utilizada para a prática de uma luta típica japonesa, o Kendo, da qual ele era praticante… Não obstante se tratar apenas disso, o estrangeiro, quando questionado pelo policial ficou a pensar: “Boken é arma ou não é arma?” E tal dúvida, somada a sua dificuldade de comunicação, desencadeou a cena hilária e patética acima narrada, haja visto que, na maior parte das vezes, tais situações poderiam ser evitadas se as autoridades policiais considerassem que os estrangeiros, além de não conhecerem e dominarem nossa cultura e nossos costumes, bem como nossa língua, por vezes – se não em sua esmagadora maioria – não tem qualquer conhecimento sobre nossa legislação e sobre os elementos que integram os tipos penais pátrios.
No fim da história, tudo acabou bem, pois o russo conseguiu controlar-se e balbuciou ao polícial que havia um boken no porta-malas do carro, fato que fora constatado pelo policial que, ao verificar do que se tratava, liberou o rapaz, ainda trêmulo e branco de medo.
Da narrativa acima desenvolvida fica claro que o papel do agente policial neste contexto seria muito mais o de um orientador do que o de um repressor, como vemos na prática, sendo que tais autoridades deveriam olhar para estes indivíduos de origem estrangeira muito mais com um olhar de auxílio do que de reprimenda, lembrando que se não cumprem as regras jurídicas de nosso País, muitas vezes assim procedem por total falta de conhecimento. É cediço que não se pode alegar desconhecimento da lei a fim de eximir-se de cumpri-la, porém é também cediço que, como muitos de nós brasileiros embarcamos e visitamos cotidianamente inúmeros países e culturas sem conhecê-las em suas regras jurídicas, assim também ocorre com os estrangeiros que aqui chegam. Um pouco mais de boa vontade e um pouco menos de agressividade das autoridades policiais fará com que ganhem muito mais o respeito e a cooperação dos estrangeiros que aqui vem para conhecer e viver a cultura local.
Que a coluna de hoje sirva não como uma crítica aos políciais – pelos quais nutro profundo respeito e admiração, tendo inclusive integrantes da corporação como membros de minha família –, mas sim para alertar a todos, agentes governamentais, políticos, autoridades policiais e cidadãos em geral para o fato inexoravel que se avizinha: os jogos olímpicos começam em dois dias…o mundo todo estará olhando para o Brasil…que possamos mostrar ao mundo que somos tão respeitosos e humanos com os estrangeiros que estarão por todas as partes do País durante os dias do evento, mas especialmente na cidade do Rio de Janeiro, como somos cordiais, pois amabilidade sem respeito e camaradagem sem práticas humanitárias de nada adiantam!
Que os jogos olímpicas tragam bons fluídos e bons frutos ao País e que possamos aproveitar esse momento ímpar para mudar ou mesmo desconstruir alguns mitos e imagens que existem mundo afora sobre o Brasil, a cultura, os cidadãos e as autoridades brasileiras.