Ordem pública e dignidade da pessoa humana
Ordem pública e dignidade da pessoa humana
O debate perdura.
De um lado, a garantia fundamental da dignidade humana: esse termo tão batido que mais parece uma ficção ou um jargão retórico de pouca valia na estrutura argumentativa processual.
De outro lado, essa incógnita processual penal que justifica a maioria das prisões preventivas no Brasil, ainda que os seus signatários pouco saibam o seu real significado: a ordem pública, ou a garantia da ordem pública – esse híbrido conceitual que melhor se vislumbra quando se diz o que não é [a ordem pública].
O debate aqui vislumbrado, essa dicotomia (ou dilema) facilmente resolúvel, se põe entre a dignidade humana e a prisão preventiva com o cenário carcerário que verificamos no Brasil.
Salvo melhor juízo, as atuais condições carcerárias representam a ilegalidade da prisão.
Não por acaso, a Corte Interamericana de Direitos Humanos acaba de publicar decisão que proíbe a entrada de mais presos na unidade carcerária de Bangu.
Pelo motivo evidente da superlotação, a Corte anotou que
nos últimos três anos, 70 (setenta) presos morreram no Instituto Plácido de Sá Carvalho, muitos por problemas decorrentes da saúde e da superlotação. A determinação também requer que o Estado adote imediatamente medidas necessárias para proteger eficazmente a vida e a integridade pessoal de todos os que estão na unidade. (Reportagem integral publicada em 16/12/2018 aqui)
Dignidade da pessoa humana
Assim, é certo que, política criminal à parte, a garantia fundamental (dignidade da pessoa humana) deve se sobrepor ao requisito processual (preservação da ordem pública).
O debate também envolve um raciocínio que pode ser assim colocado: o comando imediato que vem à mente é a garantia fundamental da proibição da tortura e do tratamento desumano ou degradante (cf. art. 5º, III da CR: Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante). Tal comando merece complemento da Lei nº 9.455/97, que assim dispõe sobre os crimes de tortura:
Art. 1º Constitui crime de tortura: (…)
II – submeter alguém, sob sua guarda, poder ou autoridade, com emprego de violência ou grave ameaça, a intensivo sofrimento físico ou mental, como forma de aplicar castigo pessoal ou medida de caráter preventivo. (…)
§1º Na mesma pena incorre quem submete pessoa presa ou sujeita a medida de segurança a sofrimento físico ou mental, por intermédio da prática de ato não previsto em lei ou não resultante de medida legal.(…)
Fica evidenciado que é incompatível a atual condição carcerária brasileira com a dignidade humana. A única compatibilidade aqui é a tortura praticada por quem pede ou manda prender.