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Os impactos da resolução 4.844/20, do CMN, nos crimes de evasão de divisas

Os impactos da resolução 4.844/20, do CMN, nos crimes de evasão de divisas         

O Conselho Monetário Nacional (CMN) editou, no dia 30 de julho de 2020, a Resolução nº 4.844/2020, com vigência desde o dia 1º de setembro. Esta Resolução alterou o artigo 26, caput, da Resolução 3.568/2008. Tal artigo determina o montante mínimo para o registro da operação cambial no Sistema do Banco Central, o Sisbacen. Antes da alteração, o montante mínimo era de R$ 10 mil (dez mil reais). Com a nova Resolução, o montante passou para R$ 100 mil (cem mil reais).

A alteração impacta o Sistema Financeiro Nacional e, por consequência, os crimes da Lei 7.492/86. Mais precisamente e mais diretamente, o crime do artigo 22. O famoso e conhecido crime de evasão de divisas determina ser punível, com reclusão de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa aquele que “efetuar operação de câmbio não autorizada, com o fim de promover evasão de divisas do País”, bem como aquele que, “a qualquer título, promove, sem autorização legal, a saída de moeda ou divisa para o exterior, ou nele mantiver depósitos não declarados à repartição federal competente.”

Uma rápida lida no caput e Parágrafo Único do artigo 22 da Lei de Crimes do Colarinho Branco já é suficiente para se perceber que o crime de evasão de divisas é uma norma penal em branco. O caput tem como elementar a operação de câmbio não autorizada. Já o Parágrafo Único, primeira parte, determina ser crime equiparado promover a saída de moeda ou divisa para o exterior “sem autorização legal”. E qual a norma complementar do crime de evasão de divisas?

Atualmente, são duas normas que complementem o crime citado e cada uma é voltada para uma situação específica. A primeira norma é a Lei 9.069/95, cujo artigo 65 determina regras para o chamado câmbio manual. Aqui, determina-se que a saída ou ingresso de dinheiro no País no formato físico, manual, devem ocorrer através da Declaração Eletrônica de Bens do Viajante. Conforme o § 1º do artigo 65, a referida Declaração é dispensável a quem portar valor inferior a R$ 10 mil (dez mil reais) em moeda nacional ou o equivalente em moeda estrangeira.

Já a segunda regra é aplicada quando por movimentações ocorridas dentro do Sistema Financeiro Nacional e é regulado exatamente pela Resolução 3.658/08. Com a nova alteração, o montante mínimo a ser declarado é de R$ 100 mil (cem mil reais), sendo considerado irrelevante administrativo e penal as movimentações inferiores a esse piso.

Dessa forma, as operações de câmbio ou saídas de divisas ou moedas do país nos montantes acima dos acima citados, sem a Declaração Eletrônica ou sem o registro no Sisbacen é considerado crime de evasão de divisas.

E qual o impacto da modificação da Resolução 4.844/20 aos crimes de evasão de divisas anteriormente cometidos? Pela própria Constituição Federal (artigo 5º, XL) e o Código Penal (artigo 2º, Parágrafo Único), a lei nova, por ser mais benéfica, retroagirá, atingindo as condutas cometidas antes de sua vigência.

E por conduta cometida antes de sua vigência entende-se durante a vacatio legis da Resolução 4.844/20 e mesmo as cometidas antes de sua publicação, os crimes em investigação, com processos em curso ou mesmo com trânsito em julgado da decisão.

Em todos os casos, uma vez que a nova norma descriminalizou a conduta de evasão de divisas sem registro no Sisbacen, pelo Sistema Financeiro Nacional, entre o valor de R$ 10 mil (dez mil reais) e R$ 100 mil (cem mil reais), a punibilidade desta conduta deverá ser decretada extinta em todos os processos ou inquéritos em curso que investiguem ou processam os culpados, à luz do inciso III do artigo 107 do Código Penal.

Há, entretanto, uma única exceção: as chamadas operação dólar-cabo. Tais operações, ocorridas pelos populares doleiros, ocorrem quando um indivíduo paga determinada quantia ao doleiro, em reais, para este liberar, em conta estrangeira, o mesmo valor em moeda estrangeira.

O Superior Tribunal de Justiça, reiteradamente, já entendeu sobre a ilegalidade de tal conduta e, por seu viés clandestino, configura crime de evasão de divisas ainda que o valor inferior ao mínimo legal, conforme nos desprendemos do voto abaixo:

No caso das operações dólar-cabo existe uma grande facilidade na realização de centenas ou até milhares de operações fragmentadas sequenciais. É muito mais simples do que a transposição física, por diversas vezes, das fronteiras do país com valores inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais). Admitir a atipicidade das operações do tipo ‘dólar-cabo’ com valores inferiores a R$ 10.000,00 (dez mil reais) é fechar a janela, mas deixar a porta aberta para a saída clandestina de divisas (REsp 1.535.956/RS, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, julgado em 1 de maio de 2016).

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