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A determinação dos papéis na colaboração premiada

A determinação dos papéis na colaboração premiada

Na colaboração premiada, é fundamental analisar as funções desempenhadas pelas partes até o momento da homologação do acordo, ressaltando a importância de resguardar os direitos e garantias dos Colaboradores e Delatados, bem como analisar a função dos Juízes, Delegados de Polícia, Ministério Público e demais envolvidos.

O Colaborador possui função principal na negociação processual com as provas apresentadas, documentos e elementos trazidos, sendo determinantes para as investigações, conforme dispõe a Lei nº 12.850/2013, bem como devem ser observados os limites e garantias processuais penais nos casos concretos.

O Estado, a partir das dificuldades em encontrar mecanismos eficientes de investigação, tendo em vista a complexidade dos delitos e agentes envolvidos, oferece um prêmio ou benefícios aos Colaboradores, no intuito de obter resultados satisfatórios.


Leia também:

  • A valoração das provas na colaboração premiada (aqui)
  • O contraditório e ampla defesa na colaboração premiada (aqui)

No que tange aos Delatados, demonstra-se um ponto de tensão, pois os mesmos temem o que pode vir a ser demonstrado pelos Colaboradores em suas declarações. Em decorrência disso, é fundamental o contraditório das provas e alegações apresentadas no trâmite processual aos terceiros envolvidos com o intuito de minimizar esses riscos (VASCONCELLOS, 2017. p. 82)

Nesse sentido, aduz VASCONCELLOS (2017, p. 82):

Uma das maiores preocupações que permeiam o cenário da justiça criminal negocial diz respeito à proteção do réu colaborador, em seus diversos sentidos: em âmbito jurídico, assegurar previsibilidade na sua conduta, de modo que a prestação de efetiva cooperação resulte no benefício acordado; no cenário processual, criando mecanismos para evitar ao máximo indevidas pressões que corrompam a sua voluntariedade para aceitar ou não o acordo; e, no panorama extraprocessual, guarnecendo sua integridade física em relação a eventuais ameaças’.

Portanto, é fundamental que tais requisitos sejam observados, a fim de garantir um resultado efetivo na persecução penal, não sendo possível aceitar a homologação dos acordos de colaboração premiada permeados por vícios, ilegalidades, abusos e coações aptos a prejudicar os agentes envolvidos nos casos concretos.

1.1. Garantias processuais em face dos delatados

Os Delatados nas colaborações possuem direitos para resguardar a veracidade dos fatos e informações obtidas. A persecução penal deve observar as garantias dos Delatados e dos Colaboradores, no intuito de evitar ilegalidades e arbitrariedades. Portanto, é garantido aos Delatados o direito de confrontar as informações prestadas pelo Colaborador. Conforme PEREIRA (2013, p. 157):

O exercício do contraditório, advinda dos protagonistas na instrução processual constitui, de fato, o melhor auxílio na busca de uma decisão justa, muito provavelmente o instrumento mais precioso de que dispõe o sujeito revelado pelo colaborador para afastar, ou ao menos, atribuir dúvidas consistentes à hipótese acusatória reside na técnica de contraditar as informações prestadas pelo pentito’.

Sendo terceiros alheios aos acordos de colaboração e aos depoimentos prestados pelos Colaboradores, necessitam e possuem garantias na persecução penal devendo ser informados dos atos, documentos e provas apresentados contra os mesmos.

A posição dos Delatados possui extrema fragilidade diante da colaboração premiada, ocasionando diversas tensões processuais, primordialmente no tocante à possibilidade de impugnações às provas trazidas (VASCONCELLOS, 2017. p. 103). Dessa forma, aduz VASCONCELLOS (2017, p. 103):

Além disso, já na etapa da colaboração efetiva do delator durante o processo, deve-se atentar ao direito ao confronto dos coimputados em face do colaborador, especialmente com o exame cruzado das suas declarações

O exame cruzado de suas declarações consiste na possibilidade do contraditório pelas provas apresentadas em face dos Delatados, garantindo um equilíbrio na aplicação da negociação e observado os problemas oriundos das respectivas incriminações.

Conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça, no HC 364.785/ PE (6ª Turma, Relator Ministro Sebastião Reis Junior, julgado 16/02/2017). é nula “a sentença que considera, mesmo que ao lado de outras provas , prova que não foi submetida ao contraditório, que não pode ser criticada, contestada, respondida e contraditada pela defesa’”.

A realização das colaborações premiadas envolve a incriminação de terceiros às investigações, sendo fundamental garantir em face dos Delatados o contraditório e acesso às informações prestadas nos acordos, sob o risco de dar margem a arbitrariedades e ilegalidades processuais.

Sendo assim, enfatiza VASCONCELLOS (2017. p. 106.) que:

O benefício/ prêmio oferecido pelo Estado ao colaborador se caracteriza como um incentivo à incriminação de terceiros. Por um lado, resta evidente que ao Estado deve ser vedado premiar acusados com incentivos ilegais. Desse modo, há sim interesse dos corréus delatados, pois são claros o potencial prejuízo causado pelo auxílio do colaborar à persecução estatal e a possibilidade de sua evitação por meio de impugnação ao acordo de colaboração premiada.

É fundamental que os Delatados possam defender-se durante o processo, possibilitando o contraditório de todas as provas, documentos e demais questões apresentadas nos acordos, possibilitando o exame cruzado de tais incriminações e objetivando resguardar os direitos inerentes ao coimputados.

Isso porque a lei prevê a necessidade de exclusão das provas processuais obtidas ilicitamente ou por meio de coações, promessas ilegais e acordos abusivos, devendo ser retiradas dos processos. Dessa forma:

A ilicitude de uma prova não pode acarretar consequências somente no âmbito de sua valoração, mas ocasionar o seu desentranhamento completo (VASCONCELLOS, 2017, p. 108).

Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal no Inquérito 3.983/ DF, devem ser impedidas situações nas quais, contra qualquer acusado, possa ocorrer coação ou demais arbitrariedades ao decorrer da persecução penal, conforme aduz o voto do Ministro Teori Zavascki:

É preciso ter presente, neste ponto – consideradas as gravíssimas implicações éticas e jurídico sociais que derivam da instauração, contra quem quer que seja, de ‘persecutio criminis’ , que se impõe, por parte do Poder Judiciário, rígido controle sobre a atividade persecutória do Estado, em ordem a impedir que se instaure, contra qualquer acusado (não importando de quem se trate), injusta situação de coação processual, pois ao órgão da acusação penal não assiste o poder de deduzir, em juízo, imputação criminal desvestida de um mínimo suporte probatório.

Sendo assim, vislumbra-se a importância de resguardar os direitos inerentes aos Delatados em face das declarações e incriminações elaboradas pelos Colaboradores, com o intuito de garantir o contraditório na persecução penal, possibilitando o equilíbrio e paridade de armas no trâmite processual penal.

As informações trazidas pelos Colaboradores aumentam expressivamente a quantidade de terceiros envolvidos nos delitos cometidos e observado as garantias constitucionais previstas para todos os indivíduos que respondem criminalmente.

É fundamental que possuam todos os direitos garantidos, possibilitando sua defesa, de modo a obter conhecimento dos fatos imputados e garantir o contraditório e a ampla defesa processual.


REFERÊNCIAS

VASCONCELLOS, Vinicius Gomes. Colaboração premiada no Processo Penal. Revista dos Tribunais. São Paulo, 2017.

PEREIRA, FREDERICO VALDEZ. Delação premiada. Legitimidade e procedimento. 3ª edição revista e atualizada de acordo com a Lei nº 12.850/2013. Curitiba. Juruá, 2013.

Paula Yurie Abiko

Pós-graduanda em Direito Penal e Processual Penal - ABDCONST. Pós-Graduanda em Direito Digital (CERS). Graduada em Direito - Centro Universitário Franciscano do Paraná (FAE).

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