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PCC x CV: as inverdades da imprensa sensacionalista, secretários e ‘especialistas’

PCC x CV: as inverdades da imprensa sensacionalista, secretários e ‘especialistas’

Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade

(Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Adolf Hitler na Alemanha Nazista)

Mais uma vez volto a advertir! Tratar de assuntos do cárcere não é para meros curiosos de plantão e aventureiros da seara prisional. Há muitos leitores, pessoas interessadas em aprender sobre o cárcere, que, infelizmente, são prejudicadas pelos muitos ditos especialistas, que se aventuram em escrever livros e elaborar artigos sem que se preocupem em mostrar a verdadeira realidade da prisão.


O QUE DIZ A IMPRENSA SENSACIONALISTA? 

Nesse mesmo diapasão temos a imprensa sensacionalista. Muita “besteira” está sendo escrita ultimamente e o prejuízo é devastador, porque sabemos que uma mentira dita várias vezes vira uma verdade. Vejamos o que a imprensa atualmente tem nos informado sobre a cisão do Primeiro Comando da Capital com o Comando Vermelho.

Autoridades dos dois Estados atribuíram as mortes ao rompimento de uma aliança entre as duas maiores facções criminosas brasileiras, que hoje atuam em todas as regiões do país: o Primeiro Comando da Capital (PCC), grupo surgido em São Paulo, e o Comando Vermelho (CV), originário do Rio de Janeiro.

E segue a imprensa:

A ruptura da aliança de anos entre Comando Vermelho e Primeiro Comando da Capital pode reconfigurar o mapa do crime organizado dentro e fora das prisões e fazer o sangue chegar a muitas portas país afora.

Inclusive mencionam um possível fim do “pacto” e citam ainda o tempo de vigência do tal elo:

O possível fim da aliança de quase duas décadas entre as duas maiores facções criminosas do país, o Comando Vermelho (CV) e o Primeiro Comando da Capital (PCC), mergulha os presídios brasileiros em tensão e há o temor de que tudo termine em sangue.


E OS SECRETÁRIOS? O QUE DIZEM?

Mas o que os secretários estariam afirmando sobre esse fato? É de se espantar:

O fim da aliança entre facções criminosas do Rio e de São Paulo, que teria provocado tensão, rebeliões e mortes em presídios no país, é um tema que entrou no radar do novo secretário de Segurança do RJ, Roberto Sá.

E seguem:

Autoridades dos dois Estados atribuiram as mortes ao rompimento de uma aliança entre as duas maiores facções criminosas brasileiras, que hoje atuam em todas as regiões do país: o Primeiro Comando da Capital (PCC), grupo surgido em São Paulo, e o Comando Vermelho (CV), originário do Rio de Janeiro.

E os absurdos continuam a serem ditos:

Uziel de Castro, secretário de Justiça e Cidadania de Roraima, afirmou nesta segunda-feira que as rebeliões foram uma “determinação nacional” do PCC para que seus integrantes atacassem integrantes do CV. “Eles declararam guerra entre as facções (…) estamos percebendo nacionalmente o rompimento desse acordo entre eles.” Castro citou também rebeliões no Pará, mas a informação não foi confirmada pelas autoridades locais. Indagado sobre o racha entre as facções, o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, disse que não faria comentários “sobre grupos criminosos”, e afirmou que “não é possível se combater de forma séria e dura o crime organizado se não começarmos pelos presídios.

E segue:

A Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro também negou que houve ruptura de aliança entre as facções.

É espantoso: negam os fatos do tal rompimento e inclusive informam que as forças de inteligência dos Estados estão investigando esse fato:

A Secretaria de Segurança do Rio de Janeiro negou hoje (20) que haja, de fato, alguma ruptura entre as maiores facções criminosas do Rio de Janeiro e de São Paulo pela disputa da venda de drogas e o domínio de presídios do estado. (…) De acordo com a Secretaria de Segurança do Rio, existem informações discordantes sobre o assunto, mas a pasta descarta qualquer ruptura até o momento. Porém, segundo a secretaria, as forças de inteligência das polícias carioca e paulista estão investigando e acompanhando quaisquer desdobramentos de forma integrada.


E O QUE ESTÃO DIZENDO OS ‘ESPECIALISTAS’?

Passaremos agora a analisar o que os “especialistas” no assunto estão nos dizendo:

As mortes nos presídios de Roraima e Rondônia foram vistas por especialistas como um marco do rompimento entre as duas organizações.

E os “estudos” seguem:

Para Marcelle Figueira, pesquisadora em segurança pública e professora da Universidade Católica de Brasília, o que está acontecendo entre as facções é grave, e há uma grande chance de essa violência transbordar para as ruas e gerar um maior número de homicídios. “Tudo indica que essa ruptura entre eles pode ser uma mudança no comando das facções e, a última vez que isso aconteceu, teve o ‘salve geral’ em São Paulo em 2006.

E os especialistas no assunto seguem:

Camila Nunes Dias – As informações ainda são muito escassas, mas está claro que houve uma ruptura entre o PCC e o CV.

E de novo:

A socióloga Camila Nunes Dias, pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo, diz que as duas facções já vinham se ameaçando desde julho em enfrentamentos pontuais dentro do sistema penitenciário. “Houve tentativas de evitar a ruptura definitiva, mas após os acontecimentos desse final e semana isso deixou de ser possível”, diz.


MAS, AFINAL, QUAL É A REALIDADE DOS FATOS?

Após mostrar aos leitores os absurdos que estão sendo “ditos”, vamos mostrar a realidade dos fatos:

O PCC realmente tinha laços com o Comando Vermelho e isso pode ser constatado através da análise do Primeiro Estatuto do PCC (Diário Oficial do Estado, Poder Legislativo, São Paulo, 107 (93), terça-feira, 20 de maio de 1997-5):

(…) Em coligação com o Comando Vermelho – CV e PCC iremos revolucionar o país dentro das prisões e nosso braço armado será o Terror “dos Poderosos” opressores e tiranos que usam o Anexo de Taubaté e o Bangú I do Rio de Janeiro como instrumento de vingança da sociedade na fabricação de monstros. Conhecemos nossa força e a força de nossos inimigos Poderosos, mas estamos preparados, unidos e um povo unido jamais será vencido. LIBERDADE! JUSTIÇA! E PAZ![1] O Quartel General do PCC, Primeiro Comando da Capital, em coligação com Comando Vermelho CV. UNIDOS VENCEREMOS.

Não acho necessário aqui me alongar explicando que o estreitamento dos laços entre essas duas organizações ocorreu em virtude das transferências de membros do PCC para o Rio de Janeiro e de membros do Comando Vermelho para São Paulo, resumidamente seria isso (Beira-Mar para o Estado de São Paulo e Geleião para o Estado do Rio de Janeiro).

Analisem agora o que nos diz o art. 11 do Segundo Estatuto do PCC:

Sem título

Se os leitores observarem, afora algumas “mudanças” no texto, a menção da irmandade com o Comando Vermelho passou do art. 16 do Primeiro Estatuto para o art. 11 do Segundo Estatuto.

Nunca é demais lembrar que os “especialistas” no assunto desconhecem a existência de outros Estatutos do PCC, então tenho a oportunidade de analisar o Primeiro Comando da Capital pela ótica de seus Estatutos. Importante mencionar a importância de se analisar os regulamentos de conduta criminal das organizações criminosas, pois eles nos explicam desde o nascimento das mesmas até os dias atuais, nos mostrando assim as transformações a que se submeteram.

O crime também se amolda as mudanças da sociedade, gerando muitas vezes outras necessidades ao mundo criminógeno. Assim, dou por encerrado o artigo dessa semana, me comprometendo a dar continuidade ao mesmo e explicar os equívocos ditos pelos especialistas, secretário e pela imprensa e mostrar a relação da importância da abordagem do Terceiro Estatuto do PCC para explicar o rompimento dos laços de irmandade entre essas duas organizações criminosas.


NOTAS

[1] Alguns “especialistas” dizem que o PCC tem o mesmo lema do CV. Ledo engano, na verdade possui o inverso do lema do CV. (PCC = L, J e P (LIBERDADE! JUSTIÇA! E PAZ) (CV = P, J e L (PAZ, JUSTIÇA e LIBERDADE). Importante também frisar que o Comando Vermelho tem esses princípios e também cinco pilares (L.R.L.J.U.) segundo nos informa o Estatuto em vigor no ano de 2013. O Estatuto do CV criado em 12/02/2002 deixa claro em seu artigo 1 – Respeito, Lealdade, Justiça e União. (AMORIM, Carlos. CV – PCC: a irmandade do crime. Rio de Janeiro: 2003, pag. 438) pcc x cv pcc x cv pcc x cv pcc x cv pcc x cv pcc x cv pcc x cv pcc x cv pcc x cv pcc x cv pcc x cv

Diorgeres de Assis Victorio

Agente Penitenciário. Aluno do Curso Intensivo válido para o Doutorado em Direito Penal da Universidade de Buenos Aires. Penitenciarista. Pesquisador

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