E se existisse pena de morte no Brasil?
A ideia do projeto E SE? é incentivar os leitores do Canal Ciências Criminais a pensar sobre o futuro do sistema criminal brasileiro como um todo e permitir reflexões sobre a forma como estamos o conduzindo. Semanalmente serão formuladas perguntas envolvendo temas polêmicos, com a finalidade de estimular debates e discussões.
Pergunta de hoje
E se existisse pena de morte no Brasil?
Respostas
A aplicação da pena de morte no Brasil, ressalvada os casos de guerra, como preceitua a Constituição, não resolveria a situação da criminalidade do país como muitos erroneamente pensam, uma vez que não há dados concretos que evidenciem a pena de morte com a diminuição da criminalidade. Estaríamos vivenciando um retrocesso se fosse aplicada a pena de morte, entraríamos em confronto com o ordenamento jurídico, de forma a desrespeitar direitos inerentes à condição humana.
RAIANE KELLY SILVA VIEIRA – Advogada, Especialista em Ciências Criminais e Integrante da Comissão de Direito Penitenciário da OAB-PI
Num breve contexto histórico, podemos mensurar que o primeiro crime cometido pelos nossos ancestrais se encontra na bíblia, pois da fruta proibida, ao não se absterem do desejo de respeitar a norma imposta, veio o pecado, ou seja o primeiro crime no mundo dos humanos. Disso podemos extrair um compilado de arbitrariedades cometidas ao longo da história, donde se resultou no verdadeiro instinto humano em resolver lides através da vingança privada. É tão verdade, que, retroagindo momentos históricos, podemos ter mente diversas imagens de decapitações, enforcamentos em praça pública e, pior, os gritos dos populares buscando justiça. Justiça ou vingança privada? Disso se pode mensurar que nunca a pena de morte será a resposta da justiça. Não se pode confundir o cumprimento da lei com instinto de vingança. Pena de morte nada mais é do que o clamor ao ódio. No Brasil, tal instituto jamais teria qualquer funcionalidade, primeiro que nossa Magna Carta, conjuntamente com os tratados internacionais ratificados, jamais estabeleceria tamanho desrespeito à dignidade da pessoa humana e, segundo, mesmo que fosse instituída, infelizmente teríamos o recorde de mortes de inocentes, pelo simples fato de não haver justiça e, sim, a ânsia de punição.
SIMONE KREMER – Advogada, Pós-graduada em Direito Penal e Processual Penal pela Unicuritiba e ex-agente penitenciária (SESP-PR)
A pena de morte hoje no Brasil, em que pese não ser admitida constitucional e convencionalmente, além de não resolver o problema do aumento da criminalidade, que é tendência mundial, inclusive nos países em que esta modalidade é adotada, descortinaria um panorama de insegurança jurídica proporcionada por um sistema investigativo ineficiente e desaparelhado, incapaz de solucionar a grande maioria dos casos que lhe são submetidos, bem como por uma cultura de condenações baseadas em provas colhidas em fase de inquérito e indiciárias que não são aptas a superar o standard da presunção de inocência. Todo este cenário se torna ainda mais preocupante em decorrência dos efeitos da pena de morte, os quais não podem ser desfeitos em caso de erro.
JOSÉ MUNIZ NETO – Advogado, Pós-graduando em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Anhanguera, Mestrando em Direito Penal e Ciências Criminais pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa/Portugal
Se existisse pena de morte no Brasil o Estado Democrático de Direito passaria por tempos ainda mais sombrios. A vida é aquilo que a Constituição Federal traz como garantia fundamental máxima, e a pena de morte viola drasticamente esSe preceito, por isso é permitida somente em ocasiões inescusáveis. Inicialmente, é necessário refletir se todos no Brasil possuem um acesso digno à justiça, por consequência, se todos possuem uma defesa plena. Seguidamente, surge a questão: será que o Brasil está preparado para aplicar a pena de morte? Ou seria somente uma forma de vingança e mais um meio de segregação?
GABRIEL CARVALHO DOS SANTOS – Acadêmico de Direito, Pesquisador na seara das Ciências Sociais Aplicadas, com ênfase no Direito Penal.
O homem é o fim do Estado, sendo esse criado para lhe servir, ou seja, o homem não é meio para um final, sendo ele o próprio fim do Estado. Deve-se levar em consideração as teorias da pena, sabendo-se que a finalidade não é tão somente punição, mas também ressocialização e prevenção. Não somente a Prevenção Geral, mas também Especial. Desse modo, se existisse pena de morte no Brasil, viveríamos um ataque às garantias constitucionalmente previstas, bem como ao princípio da Dignidade Humana, princípio do qual todos os outros são derradeiros.
FILIPE DEMÉTRIO MENEZES – Acadêmico de Direito
Vida é um bem e um direito inalienável. Não há contrato social que dê ao Estado o direito sobre a vida dos indivíduos. A defesa da vida é uma obrigação de todos, sem esquecer que a vida já existe durante a gestação. Defender aborto e condenar pena de morte é incoerência. Não há necessidade de argumentos religiosos para defender a vida.
ODIOMBAR RODRIGUES – Doutor em literatura e Professor universitário aposentado
Como nosso Código Penal tutela o patrimônio e possui penas menos gravosas para crimes de colarinho branco, certamente mais pobres seriam “ assassinados” pelo Estado, e os corruptos e corruptores continuariam a desviar verbas essenciais da saúde, da merenda escolar e da educação. O que num looping infinito permitiria o extermínio em massa dos pobres e favelados, que torna-se-iam ainda mais vulneráveis. Num país onde os julgamentos são muito mais políticos que jurídicos; que provas são descartadas com imensa facilidade; que a “ verdade real” é amoldada à pena que se quer impor; onde o sistema processual penal trabalha em favor de encarcerar e “ esconder”; onde a seletividade negativa diz o quanto esse sistema é excludente; seria muito temerário se a pena de morte fosse uma realidade. Se a pena de morte existisse no Brasil, tal qual é hoje, teríamos que viver nos desculpando pelas mortes de inocentes.
MYRNA ALVES DE BRITTO – Estudante de Direito, Integrante do ICCS e do GPCC (UFRRJ)
Falar de pena de morte é, no mínimo, uma grande afronta à evolução humana – quando chamamos a filosofia e a sociologia. Uma grande tragédia se imaginar o ser humano condenado à morte por um ou mais casos/crimes sem compreender o que o levou a ter tal comportamento e as circunstâncias geradas, as causas e não os efeitos que se compreendidos, não o levariam a pena de morte (controverso demais). Um equívoco se assim pensar que poderia estar sanando variados problemas, desde a criminalidade do lado de fora (realidade fática, com sensacionalismo diário-midiático), bem como a criminalidade do lado de dentro – o caos carcerário/sistema prisional. Para o senso comum mal informado que imagina que a grande solução para todos os problemas sociais existentes é a morte do indivíduo, percebe-se a sociedade completamente doentia e frágil. O discurso punitivista munido de ódio, exclusão e desigualdade lhe faz parecer cabível, diante de um cenário ocupado por inimigos – aqueles jogados às margens, traçados como subumanos. Quando a sociedade possui venda aos olhos para as profundezas dos problemas sociais, elas preferem atirar no escuro.
ANA FLÁVIA SILVEIRA – Advogada, Pós-graduanda em Filosofia e Direitos Humanos pela PUC-PR e Integrante da Comissão Especial de Estudos de Medidas Alternativas à Prisão (CEMAP) do Canal Ciências Criminais
Pena de morte é um tema afrontoso não só a Constituição Federal, como também a uma história de longas e duras batalhas; é, em outras palavras, uma violação aos Direitos Humanos. A clemência pela pena de morte em diversos povos não acalenta a sua própria. O cidadão, historicamente falando, cultiva um sentimento perverso para com seus pares. O desejo de ver outra pessoa ser espancada, de julgar, de punir, de ver outra pessoa passando por situações calamitosas sasseia um dos sentimentos mais primitivos do ser humano, que é a agressividade, esta que aprendemos a controlar por vivermos em sociedade. Paremos para analisar a situação quando um dos nossos são postos em voga para uma punição com pena de morte, será a última coisa que queremos. Porque a ideia maior é que quando se trata de outras pessoas pode, mas conosco ou nossos familiares não. Em um país repleto de perversidade e arbitrariedades, a pena de morte é o último caso a ser cogitado, isto se ainda houver espaço. Os arbítrios perpetrados pelo Estado acusador, a punição excessiva e desnecessária só nos demonstram que não estamos preparado para outras vertentes.
MACKYSUEL MENDES LINS – Advogado, Pós-graduando em Ciências Criminais (PUC/MG), Conselheiro da Associação dos Advogados Criminalistas de Alagoas (ACRIMAL), Membro da Comissão do Advogado Criminalista e de Relações Penitenciárias e da Comissão de Defesa das Prerrogativas da OAB/AL.
Trazendo uma breve reflexão sobre a pena de morte no Brasil, até que ponto a execução de criminosos seria a melhor solução? A CF/88 proíbe a pena de morte, bem como quanto às de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento ou cruéis. Muitos acreditam que a pena de morte devolveria à pessoa do condenado por crimes violentos o mal que tenha praticado. Outrossim, consideram que a pena de morte reduziria os níveis de criminalidade. Porém, como se atenta a Anistia Internacional, nos EUA, um dos cinco países que mais aplicam a pena de morte, a ampla maioria dos criminologistas avalia que não há redução. E vale ressaltar que algumas das penas capitais são resultados de perseguição político-religiosa. Algumas razões contra a pena de morte seria que a mesma não tem efeito inibidor, conforme observamos nos casos de países em que ela é aplicada, bem como que o efeito inibidor só ocorreria para assassinatos premeditados. Ademais, há possibilidades de erros e inocentes serem condenados à morte, prejudicando dessa forma o equilíbrio entre justiça e punição. Infelizmente há casos no Brasil, como em muitos outros países de condenações injustas tendo-se verificado a inocência do réu depois de executado. O Estado tem a incumbência de combater crimes utilizando políticas de prevenção, a fim de manter a ordem e proteger a sociedade. A pena capital não impedirá que o condenado se redima ou que outros crimes violentos ocorram. Ela vai contra o Estado democrático de Direito e o respeito à liberdade e à dignidade da pessoa humana. Segundo penso, deve-se empenhar a praticar uma efetiva política preventiva ao crime, uma mudança no Código Penal Brasileiro, um melhor investimento no Sistema de Segurança Pública e um efetivo trabalho de conscientização dos atos do preso, fazendo com que o mesmo se ressocialize. Caso isso não ocorra, um criminoso deve ser confinado enquanto não mudar sua mentalidade e sua atitude, mas sendo absolutamente necessária a conservação da dignidade do preso.
BÁRBARA FUZÁRIO – Bacharel em Direito, Pesquisadora em Segurança Pública, Especialista em Ciências Criminais e Especialista em Gestão de Segurança Pública
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