ArtigosDireito Penal Econômico

Preciso gastar com Compliance?

Com a popularização de investigações e ações penais, como a Lava Jato e o Mensalão, muitos institutos jurídicos se tornaram conhecidos da população. Um deles é o Compliance e interessa tanto mais ao empresário. Muito se discute sobre sua eficiência e se não seria apenas mais um gasto desnecessário.

Na prática, o Compliance de que todos falam é, na verdade, a criação de um programa de integridade destinado a salvaguardar empresa, patrimônio e seus dirigentes de atos lesivos. Muito complicado? Numa linguagem mais direta, são mecanismos para prevenir e reprimir atos ilícitos e até criminosos.

Mas, novamente, por que é preciso investir nisso?

Bem, se os casos públicos de condenação por corrupção e lavagem de dinheiro não são o bastante para inspirar o administrador a adotar medidas de integridade, convido você a refletir sobre o funcionamento da atividade empresária.

Imagine que, no topo, temos os sócios figurando como presidente e vice-presidente da empresa. Mais abaixo, três diretores: um para cada equipe de quatro técnicos que, por sua vez, respondem a outros três gerentes.

Imagine também que, em tempos de maior demanda, o diretor financeiro autoriza a contratação temporária de dois ou três assistentes para cada equipe de técnicos, apenas para desafogar o serviço. Nestes casos, as contratações são avalizadas pelo diretor de recurso humanos, com a anuência do vice-presidente que, por fim, reporta tudo ao big boss.

Se você perdeu algum detalhe, não se preocupe. É exatamente assim que opera a dinâmica das empresas. Não é humanamente possível a qualquer administrador, por mais talentoso ou profissional, acompanhar passo a passo o desenvolvimento das tarefas de seus subordinados. Menos ainda se responsabilizar pessoalmente por elas.

São comuns os relatos de administradores de empresa que, depois de anos trabalhando com a mesma pessoa, descobrem que, pelo mesmo período, foram vítimas de desvios bancários ou outras formas de fraude por meio de maquiagem de extratos, recibos, balanços, etc.

Por vezes, as condutas ilícitas são assumidas em nome da própria personalidade jurídica, o que torna o cenário ainda mais preocupante. As consequências negativas podem ser irreparáveis. E, não raro, o administrador sequer sabe se registra a ocorrência criminal, requer a instauração de inquérito ou fica na demissão por justa causa.

É exatamente aí que o compliance aparece.

Um bom programa de integridade, como também pode ser chamado o compliance, tem como objetivo a elaboração de um manual de procedimentos que resguarde a empresa, sua imagem e a figura individual dos dirigentes, de modo a não haver hesitação em momentos inquietantes.

Desta maneira, o compliance surge para, por meio de um estudo detido da empresa, composição e histórico, bem como pela análise do risco atinente à atividade, elaborar e implementar um conjunto de normas e métodos que permita a visualização panóptica do negócio, suas etapas e responsáveis, com vistas a, inclusive, interpor vigilância mútua entre os colaboradores.

Por certo, a concepção de um programa de integridade é um desafio. Não basta copiar um modelo de regulamento interno e esperar que sirva aos interesses da empresa ou mesmo aos fins das leis. Tampouco há de funcionar um canal de denúncias atendido, por exemplo, pelo supervisor da equipe.

Há que se entender pelo profissionalismo. A aplicação de medidas de integridade envolve estudo normativo, capacitação de funcionários, aperfeiçoamento das autoridades internas, estruturação de organograma e critério na confecção dos procedimentos. Sem mencionar o compromisso da alta gestão em fazer valer aqueles princípios.

Na prática, a existência de mecanismos internos de integridade, tais como auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades e a aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta no âmbito da pessoa jurídica, traz resultados práticos, não apenas concorrenciais, mas diante da apuração de atos lesivos.

O que acontece dentro das empresas e como se comportam comercialmente passou a interessar à toda coletividade. Foi-se o tempo em que a forma como se desenvolve a atividade empresária importava apenas ao dono dos meios de produção.

Se nada disso for, ainda, a resposta que precisa para se convencer pelo compliance, é bom lembrar que empresas com programas de integridade são preferidas na hora de fazer negócios.

Corporações com programas de integridade optam por empresas de mesma conduta, por questões de segurança mercantil. Não é à toa que os contratos comerciais passaram a prever cláusulas de obrigações de compliance que, uma vez descumpridas, podem levar à rescisão contratual sem qualquer pagamento.

A bem da verdade, é comum no Brasil que negócios nasçam e despontem apenas pelo tino comercial de seu idealizador. Mas o momento econômico é outro.

As obrigações, administrativas, legais e de mercado, são muitas e, normalmente, escapam ao empreendedor – sobretudo ao pequeno e médio. E por isso o compliance se tornou uma exigência de mercado (ao menos, para os que desejam se manter atrativos).

À vista de tudo, a resposta para o administrador não se revelará unicamente em cifra ou no incremento do valor comercial da empresa mas, especialmente, na criação de um consciente social íntegro que, por mero desdobramento, preserva o negócio.

Esta é, seguramente, a razão de imposição das práticas de integridade: a permanência dos melhores players.

Amanda da Mata

Pós-graduanda em Direito Penal Econômico. Advogada.

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo