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O preso condenado deve ressarcir o Estado pelas despesas com a sua manutenção

O preso condenado deve ressarcir o Estado pelas despesas com a sua manutenção

São frequentes os comentários de pessoas e até mesmo propostas de lei relacionados a necessidade de o preso ressarcir o Estado pelas despesas da sua manutenção no Sistema Prisional, como se essa fosse a ideia do século, a descoberta da pedra filosofal.

O que as pessoas muitas vezes não sabem é que isso não é novidade e tampouco passou despercebido pelo nosso Legislador ao criar a Lei de Execuções Penais (LEP).

De uma simples leitura da LEP é possível perceber que cabe ao preso arcar com as despesas da sua manutenção. Todavia, para tanto, é imprescindível que o Estado cumpra com o seu papel de assegurar direitos a quem está preso, como no caso de fornecimento de oportunidade de emprego.

Para entendermos melhor sobre isso, segue o texto legal acerca do tema:

Art. 28. O trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.
§ 1º O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:
d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado, em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nas letras anteriores.

Portanto, depreende-se que o preso condenado, com o fruto da remuneração decorrente do exercício do trabalho, ressarcirá o Estado das despesas realizadas com a sua manutenção.

Mas qual o grande problema disso (ou melhor, os grandes problemas)?

O primeiro deles é que boa parte das pessoas que se encontram presas estão nessa condição provisoriamente, ou seja, não são presos condenados, mas provisórios.

Segundo levantamento feito pelo CNJ no início do ano de 2017 (clique aqui para acessá-lo), um terço dos presos do Brasil são provisórios. Mais especificamente, dos 654.372 presos no Brasil, 221.054 são provisórios.

Esses dados levam em conta todo o Sistema Prisional brasileiro, sendo possível verificar uma grande variação de Estado para Estado. Em Sergipe, por exemplo, mais de 80% (oitenta por cento) dos presos eram, à época do levantamento, provisórios.

Isso significa que essa parcela da população prisional ainda é inocente, pois não há sentença penal condenatória definitiva em seu desfavor.

Em regra, a prisão preventiva é exceção e só deveria ser aplicada em alguns casos e não como fazemos, transformando praticamente em regra aquilo que deveria ser excepcional.

E dessa população prisional de presos provisórios, apenas 37% (trinta e sete por cento) não são condenados a penas de prisão. Ou são absolvidos ou são condenados a penas em regime aberto ou as penas privativas de liberdade são substituídas por restritivas de direito, logo, não deveriam estar presos provisoriamente.

Esse fator (grande número de prisões preventivas) impede o ressarcimento ao Estado pela manutenção de quem está preso, pois ele está lá não por ser “culpado” de praticar um crime, mas por “interesse” do Estado.

Logo, se a pessoa não é condenada por algo, ainda é inocente e os custos da sua manutenção não podem ser cobrados.

Quando se trata de presos condenados, em cumprimento de pena, a situação muda e é aí que se enquadra o texto legal transcrito anteriormente.

E aí entra o outro grande problema da aplicação do texto legal:  não há oferta de emprego remunerado para quem está preso, ao menos não em quantidade suficiente para garantir que eles arquem com essa despesa.

O Estado não oferece ao preso condenado oportunidade de trabalhar, obter remuneração e, assim, ressarcir os custos da sua manutenção. E essa impossibilidade, essa falha, não pode ser atribuída a quem está preso.

Desse modo, não se trata de lutar para que o preso seja obrigado a ressarcir ao Estado os custos, mas de batalhar para que a LEP seja cumprida integralmente.

Percebe-se, assim, que o descaso da sociedade para com a situação prisional atinge não só a população carcerária, mas a toda a sociedade, pois, se a lei fosse cumprida, o Estado e, consequentemente, a população, teriam inúmeros benefícios, dentre eles o de ordem financeira.

Assim, antes de criticar, de querer impor alguma coisa a alguém ou propor a alteração legislativa, procure saber o que a lei vigente estabelece sobre o assunto. Na maioria das vezes vai perceber que não é omissão na lei, mas falta de empenho/vontade em fazer ela valer.

Um grande abraço e até semana que vem!

Pedro Magalhães Ganem

Especialista em Ciências Criminais. Pesquisador.

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