É possível aplicar a prisão domiciliar em substituição à prisão preventiva?
É possível aplicar a prisão domiciliar em substituição à prisão preventiva?
Inicialmente, antes de adentrarmos no tema, cumpre mencionar que a prisão domiciliar, hodiernamente, possui aplicabilidade em diversas situações, podendo ser imposta em substituição ao regime semiaberto, quando inexistir colônia agrícola ou estabelecimento adequado, como também em razão das hipóteses elencadas no artigo 117 da lei de execuções penais (Lei 7.210/84), que são hipóteses nas quais o indivíduo que está em regime aberto pode cumprir a pena em regime domiciliar.
Nessa esteira, é correto afirmar que a prisão domiciliar possui previsão tanto no código de processo penal, quanto na lei de execuções penais (Lei 7.210/84), podendo ser aplicada em diversas situações, como medida cautelar, como também em substituição a um regime de cumprimento de pena.
Partindo-se dessa premissa, trataremos nesse artigo especificamente da prisão domiciliar utilizada em substituição a prisão preventiva, traçando um paralelo com o recolhimento domiciliar noturno previsto no inciso V, do artigo 319, do código de processo penal.
Em outras palavras, o objeto do nosso estudo será única e exclusivamente a prisão domiciliar de natureza cautelar, ou seja, falaremos apenas da prisão domiciliar que é aplicada antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
O artigo 318 do código de processo penal, por meio de sua nova redação, dada pela lei 12.403/2011, traz situações nas quais a prisão preventiva poderá ser substituída pela prisão domiciliar.
Assim, estando presentes alguns dos requisitos do artigo 318 do código de processo penal, o juiz poderá decretar a prisão domiciliar ao invés de decretar a prisão preventiva.
Não se trata, por evidente, de uma nova modalidade de prisão cautelar, mas apenas de uma especial forma de cumprimento da prisão preventiva, restrita aos poucos casos estabelecidos no art. 318 do CPP. (LOPES JR, 2013, p. 163). A prisão domiciliar advém da decretação da prisão preventiva, em lugar de se manter o preso em presídio comum, diante de suas particulares condições especiais, pode-se transferi-lo para o recolhimento domiciliar. (NUCCI, 2013, p. 112).
Partindo-se dessa premissa, só caberá a substituição da prisão preventiva pela domiciliar se, no caso concreto, os requisitos necessários para a substituição estiverem presentes. Desse modo, a prisão domiciliar atuará como uma alternativa a prisão preventiva para àqueles que preencherem as condições necessárias.
Assim, se o agente for: a) maior de 80 (oitenta) anos; ou b) extremamente debilitado por motivo de doença grave; ou c) imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência; ou d) gestante; ou e) mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; ou f) homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; a prisão domiciliar poderá ser decretada em substituição à prisão preventiva.
Nota-se que as hipóteses de substituição são hipóteses exaustivas, não cabendo portanto, decretação de prisão domiciliar de cunho cautelar fora das hipóteses elencadas no artigo 318 do código de processo penal.
Valendo ressaltar que o agente pode provar que preenche os requisitos exigidos e se encaixa em alguma das hipóteses através de qualquer meio probatório, desde que seja idôneo.
O magistrado pode substituir a prisão preventiva pela domiciliar. É uma faculdade admissível para as hipóteses descritas nos novos incisos I a IV do artigo 318 (NUCCI, 2013, p. 113).
A substituição da prisão preventiva pela domiciliar não é algo obrigatório, é uma faculdade do juiz. A própria redação do artigo 318 já nos diz isso ao dispor “poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando…”.
IV - A Lei n. 13.257/16 acrescentou ao artigo 318, do Código de Processo Penal, o inciso V, o qual prevê que o juiz poderá realizar a substituição da prisão preventiva por domiciliar de "mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos". V - Não obstante a novel modificação legislativa, permanece inalterado o verbo contido no caput do art. 318, que revela a possibilidade, não a obrigatoriedade, da concessão do benefício, que deve se revelar consentâneo com os parâmetros de necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais e adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado, tudo nos termos do art. 282, incisos I e II, do Código de Processo Penal (precedentes). (HC n° 368.277/SP. Relator: Min. FELIX FISCHER. Quinta Turma. Julgado em: 02/02/2017).
O STJ, seguindo essa linha de raciocínio, tem entendimento no sentido de que não há obrigatoriedade na concessão do benefício da prisão domiciliar para os indivíduos que se encaixam em alguma das hipóteses do artigo 318, pois a concessão é facultativa, e por ser uma medida de natureza cautelar a concessão só será idônea caso seja necessária e adequada para o caso concreto.
Assim, a prisão domiciliar não será concedida, única e exclusivamente em razão das condições especiais do sujeito passivo, já que se observado também se a prisão domiciliar é a medida adequada e necessária para o caso concreto.
Nucci (2013) diz que a prisão domiciliar não constitui direito absoluto do réu ou indiciado, pois a concessão do referido benefício ocorrerá apenas depois de se analisar o caso concreto.
O autor exemplifica dizendo que não há sentido em conceder o benefício da prisão domiciliar a um chefe de uma quadrilha perigosa só pelo fato dele ter mais de 80 anos de idade.
Assim, é correto afirmar que estando presentes os elementos da preventiva, e o agente possuindo alguma das condições especiais do artigo 318, o juiz poderá decretar a prisão domiciliar em substituição à preventiva.
Valendo ressaltar que a substituição não é automática, pois se o juiz verificar que a substituição será prejudicial no fim de tutelar o processo,ou seja, se ele verificar que a prisão domiciliar pode acarretar problemas na aplicação da lei penal ou na coleta da prova, por exemplo, poderá não conceder o benefício da prisão domiciliar.
Lembremos que a prisão domiciliar não é nova medida cautelar restritiva da liberdade; cuida-se, apenas, do cumprimento da prisão preventiva em residência, de onde somente pode o sujeito sair com autorização judicial. (NUCCI, 2011, p. 625).
Em outras palavras, existem apenas três modalidades de prisão cautelar, quais sejam, prisão em flagrante (há autores que não a consideram uma modalidade de prisão cautelar propriamente dita em razão da sua insuficiência e precariedade), prisão preventiva e prisão temporária.
Assim sendo, é correto afirmar que a prisão domiciliar não é uma medida cautelar autônoma, mas sim uma forma alternativa de cumprimento da prisão preventiva ou forma alternativa de cumprimento de pena, quando se estiver falando de sentença penal condenatória transitada em julgado.
Nucci (2013, p. 111-112) diz que, a prisão domiciliar como medida cautelar substitutiva da prisão preventiva só deve ser aplicada nos casos expressamente previstos no artigo 318 do Código de Processo Penal.
Em outros dizeres, se o acusado não se encaixar em alguma das hipóteses do artigo 318 será melhor revogar a preventiva e impor alguma medida cautelar do artigo 319 do código de processo penal, pois não cabe prisão domiciliar como forma de substituição da prisão preventiva fora dos casos elencados no artigo 318 do Código de Processo Penal.
Em suma, não se pode banalizar a prisão domiciliar, nela inserindo os presos que não preenchem os requisitos expressos e taxativos do art. 318 do CPP. É preferível revogar a preventiva ou substituí-la por outra medida cautelar a inserir, por analogia pessoa qualquer em prisão domiciliar, desvalorizando o novo instituto. (NUCCI, 2013, p. 113-114).
Por fim, vale salientar ainda que a prisão domiciliar aplicada como forma de cumprimento de pena ou como forma de substituição da prisão preventiva não se confunde com a medida cautelar do artigo 319, inciso V do Código de Processo Penal.
A medida constante do art. 319, V, tem outra natureza, pois lá o agente tem liberdade para, durante o dia, exercer suas atividades profissionais, devendo recolher-se ao domicílio apenas no período noturno e nos dias de folga. (LOPES JR, 2013, p. 163).
Ademais, o recolhimento no período noturno não exige nenhuma condição especial do sujeito passivo para que possa ser concedido, diferindo assim da prisão domiciliar prevista no artigo 318 do código de processo penal.
Sendo assim, não há que se confundir o recolhimento domiciliar noturno com a prisão domiciliar do artigo 318, pois apesar de ambas possuírem natureza cautelar, diferenciam-se pelo fato desta exigir condições especiais do sujeito passivo, e aquela não, além do fato de o recolhimento no período noturno ter uma sistemática totalmente diferente da prisão domiciliar do artigo 318.
REFERÊNCIAS
LOPES JR, Aury. Prisões Cautelares. 4 ed. São Paulo. Saraiva. 2013.
NUCCI, Guilherme de Souza. Prisão e Liberdade: de acordo com a Lei 12.403/2011. 3 ed. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2013.