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Prisão extradicional

Por Cleopas Isaías Santos

A prisão cautelar para fins de extradição, ou simplesmente prisão extradicional, foi finalmente regulamentada pela recente Lei nº 12.798/2013, a qual alterou significativamente o Estatuto do Estrangeiro (Lei nº 6.815/1980), acabando, ou ao menos reduzindo, as divergências doutrinárias e jurisprudenciais sobre o seu regime.

Segundo a nova redação do art. 82 da Lei nº 6.815/1980, a legitimidade para requerer a prisão cautelar do extraditando será: a) tanto do Estado interessado na extradição; b) quanto do Ministro da Justiça.

Com efeito, o Estado interessado na extradição poderá, em caso de urgência e antes da formalização do pedido de extradição, ou conjuntamente com este, requerer a prisão cautelar do extraditando por via diplomática ou, quando previsto em tratado, ao Ministério da Justiça, que, após exame da presença dos pressupostos formais de admissibilidade exigidos nesta Lei ou em tratado, representará ao Supremo Tribunal Federal.

O pedido de prisão cautelar noticiará o crime cometido e deverá ser fundamentado, podendo ser apresentado por correio, fax, mensagem eletrônica ou qualquer outro meio que assegure a comunicação por escrito.

Poderá ainda o pedido de prisão cautelar ser apresentado ao Ministério da Justiça por meio da Organização Internacional de Polícia Criminal (Interpol), devidamente instruído com a documentação comprobatória da existência de ordem de prisão proferida por Estado estrangeiro.

Na hipótese de o Estado interessado na extradição requerer a prisão cautelar do extraditando antes do pedido de extradição, este deverá ser formalizado no prazo limite de 90 (noventa) dias, contados da data em que for cientificado da prisão do extraditando, sob pena de sua imediata colocação em liberdade e não se admitindo novo pedido de prisão cautelar pelo mesmo fato sem que a extradição haja sido devidamente requerida.

A competência para decretar esta modalidade prisional é do Ministro Relator do Supremo Tribunal Federal do processo de extradição.

Quando o pedido do Estado interessado for feito diretamente ao Ministro da Justiça, a este caberá apenas a análise dos pressupostos de admissibilidade do pedido, cabendo exclusivamente ao STF a análise acerca da necessidade da decretação da medida prisional.[1]

O processualista Renato Brasileiro,[2] acompanhando o posicionamento do STF[3] anterior à Lei nº 12.798/2013, entende que esta prisão extradicional é uma modalidade de prisão preventiva, que ele chama de prisão preventiva para fins de extradição (PPE). E, a partir dessa constatação, advoga que ela se submete ao regramento da preventiva, inclusive aos requisitos do art. 312, sob pena de tratamento desigual do extraditando.

Apesar de sedutora a ideia, não nos parece a mais acertada. Antes de tudo, devemos admitir que o Estatuto do Estrangeiro é um ato normativo que trata desigualmente os estrangeiros, na medida de suas desigualdades com os brasileiros, claro. Não à toa que autoriza a extradição do estrangeiro, como regra, ao passo que a do brasileiro, apenas de forma excepcional. E esse tratamento diferenciado não torna as normas extradicionais do Estatuto do Estrangeiro inconstitucionais.

Além disso, seguindo o entendimento do citado doutrinador, forçoso defendermos, por coerência lógica, que a prisão extradicional somente seria cabível nas hipóteses da preventiva (art. 313, por exemplo). Ocorre que, como regra, segundo esse dispositivo, não caberá prisão preventiva nos crimes dolosos punidos com pena igual ou inferior a 4 (quatro) anos. Contudo, segundo o Estatuto do Estrangeiro (art. 77, IV), é possível a extradição por crime punido com pena superior a 1 (um) ano. Ou seja, a entendermos da forma como defende Renato Brasileiro, teríamos que admitir que nos crimes com pena igual ou inferior a 4 (quatro) e superior a 1(um) ano, embora possível a extradição, não caberia a prisão cautelar extradicional.

Outra decorrência lógica do entendimento de que se trata de prisão preventiva, seria sua excepcionalidade e subsidiariedade em relação às demais medidas alternativas à prisão. Mas, ao que parece, a prisão extradicional não está condicionada ao não cabimento de outras medidas menos gravosas, como ocorre com a preventiva.

Por estas razões, defendemos que o regime jurídico da prisão para fins de extradição é autônomo e diverso do regramento da prisão preventiva.

De igual modo, entendemos não se tratar de uma espécie de prisão preventiva, mas de uma nova terceira modalidade de prisão cautelar. E, como tal, os requisitos do art. 312 do CPP deveriam servir de parâmetro para sua concessão, mas as hipóteses de cabimento seriam aquelas que autorizam a extradição, e não as da preventiva. De igual modo, deveria ser excepcional e subsidiária em relação às demais medidas cautelares alternativas à prisão.

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[1] LIMA, Renato Brasileiro de. Manual de processo penal. Salvador: Juspodivm, 2014, p. 809.

[2] LIMA, Renato Brasileiro de. Op. cit., p. 810. No mesmo sentido, cf. SANGUINÉ, Odone. Prisão cautelar, medidas alternativas e direitos fundamentais. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 179 e ss.

[3] HC 91.657/SP, Rel. Min. Gilmar Mendes, j. 13.09.2007, DJe 13.03.2008, p. 293.

CleopasSantos

Imagem do post – “Fortress”, por Nicola Jones

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