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No processo penal, quem defende também deve atacar

No processo penal, quem defende também deve atacar

Se pensarmos em termos futebolísticos, o time que apenas defende tem somente dois resultados possíveis: empate ou derrota. A vitória é impossível. Por outro lado, caso esse mesmo time defenda muito bem e realize contra-ataques efetivos, terá muitas chances de vitória.

No processo penal, não basta defender, negar e contrariar as acusações feitas pelo Ministério Público ou querelante, especialmente em caso de imputações falsas, ilegais ou arbitrárias, que a cada dia são mais corriqueiras.

Assim, dependendo do caso, é cabível que a defesa registre boletim de ocorrência por crime de denunciação caluniosa, previsto no art. 339 do Código Penal, que diz:

Dar causa à instauração de investigação policial, de processo judicial, instauração de investigação administrativa, inquérito civil ou ação de improbidade administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente. 

A pena é de 2 a 8 anos de reclusão, sendo, portanto, incabíveis a transação penal e a suspensão condicional do processo.

Salienta-se que, quando cabível, o registro de boletim de ocorrência por crime de denunciação caluniosa pode inviabilizar que seja feita nova “noticia criminis” falsa. Cita-se, por exemplo, o caso de vizinhos que disputam terras e fazem, indevidamente, inúmeros registros por crime de esbulho possessório.

Em caso de imputações mútuas, em que duas pessoas são, ao mesmo tempo, em processos diversos, acusado e vítima, é recomendável que seja feito um contra-ataque por meio da assistência à acusação.

Destarte, se A é acusado e B é vítima no processo 1, sendo que A é vítima e B é acusado no processo 2, A deve defender-se no processo 1 e atuar como assistente à acusação no processo 2.

Se ocorrerem ilegalidades ou abusos decorrentes de condutas de autoridades públicas, como Promotores e Juízes, deve-se contra-atacar por meio de reclamações ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Entrementes, exige-se cautela para que não haja o risco de que esse contra-ataque gere, para o reclamante, um processo por crime de denunciação caluniosa, porquanto, segundo o art. 339 do Código Penal, é crime dar causa à instauração de investigação administrativa contra alguém, imputando-lhe crime de que o sabe inocente.

No júri, tão importante quanto expor adequadamente as alegações defensivas é atacar as argumentações da acusação, por meio de apartes estratégicos, questões de ordem, correção sobre afirmações relativas aos fatos ou às provas etc. Em outras palavras, no júri, a defesa deve defender e contra-atacar.

Em alguns casos, o ataque deve ser realizado em forma de bombardeio, com várias batalhas simultâneas, como “habeas corpus” para trancamento do processo, exceção de suspeição, reclamação na Corregedoria e no CNMP/CNJ, correições parciais, contradita de testemunhas, incidente de falsidade de documento etc.

Atualmente, não é admissível que um Advogado ingresse em um processo penal e, passivamente, apenas apresente resposta à acusação, participe das audiências e faça as alegações finais, aguardando a provável condenação. Isso seria apenas legitimar o processo penal, fazendo da defesa uma mera formalidade.

Aliás, para nós, Advogados Criminalistas, atacar é muito mais fácil do que para a acusação.

Explico: muitos Juízes tratam a defesa com desprezo, indeferem tudo que requeremos e acolhem tudo que o Ministério Público postula. Contudo, os Promotores de Justiça possuem uma demanda enorme. Em comarcas do interior, com varas judiciais (sem varas especializadas), é comum ver Promotores que atuam em mais de 10 mil processos.

Quando era Defensor Público, entrava nas audiências em uma situação parecida com a dos Promotores. Atuava simultaneamente em milhares de processos e tinha pouco tempo para me dedicar a cada caso.

Entretanto, quando ingressei na Advocacia Criminal, percebi que, atuando em uma quantidade significativamente menor de processos, sobrava muito mais tempo para cada caso, o que me permitia conhecer detalhadamente os autos e definir estratégias e táticas de contra-ataque.

Assim, acredito que nós, Advogados Criminalistas, por dedicarmos um tempo maior que a acusação para cada processo, podemos realizar contra-ataques artesanais, travando múltiplas batalhas que, efetivamente, podem gerar algum resultado.

De qualquer sorte, considerando que o ônus probatório é exclusivo da acusação, nem sempre a defesa precisará contra-atacar. Entretanto, em alguns casos, deve-se, de forma consciente – e não apenas “jogando bola alta na área” -, partir para o contra-ataque, sem esquecer que, acima de tudo, o papel da defesa é defender.

Evinis Talon

Mestre em Direito. Professor. Advogado.

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