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Proporcionalidade pro reo e a utilização de provas ilícitas como meio de defesa

Proporcionalidade pro reo e a utilização de provas ilícitas como meio de defesa

Uma prova é admitida sempre que nenhuma norma a exclua. Ademais, existe uma relação de ato anterior com o posterior e, para Aury Lopes Jr. (2019, apud CORDERO, 2000, p. 44), somente podem ser admitidas as provas que podem ser produzidas.

De acordo com a Constituição Federal de 1988 em seu artigo 5º, inciso LVI, “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”. Outrossim, o Código de Processo Penal, em seu artigo 157, complementa a norma retromencionada, esclarecendo que “são inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais”. Assim, deve-se fazer a distinção entre prova ilegítima e prova ilícita.

A prova ilegítima viola uma regra de direito processual penal no momento em que é produzida em juízo, através da inobservância do procedimento. Encontra-se no plano da nulidade, haja vista já estar no processo, com produção nula. Apesar disso, é possível que seja renovada ou retificada – quando antes não tiver sido sanada – nos moldes do CPP, art. 573, caput.

Em contrapartida, nas palavras de Aury Lopes Jr. (2019, p. 483), a prova ilícita viola uma regra de direito material ou até mesmo a Constituição no momento de sua coleta fora do processo, gerando uma violação de intimidade, privacidade ou dignidade. Situa-se no plano da inadmissibilidade, o que impede a sua inclusão ou manutenção no processo, bem como a sua valoração.

Em análise ao exposto, surge uma situação complexa quando uma prova é legítima, haja vista a correta produção nos autos do processo; contudo, ao mesmo tempo, é ilícita, ao passo que viola algum dos direitos supracitados, colocando sob questionamento a possibilidade de vir a ser valorada.

Neste ponto, importa esclarecer que as provas ilícitas não são possíveis de repetição, diante do vício vincular-se ao momento de sua obtenção. Ao contrário são as provas ilegítimas, vez que, se tratando de vício processual, existe a possibilidade de repetição do ato. Além disso, as provas ilícitas perdem o status de prova, uma vez que não produzem nenhum efeito jurídico.

De outra banda, contudo, existe a prova ilícita a partir da proporcionalidade pro reo, ou seja, a utilização daquelas como meio de defesa. Isso porque, diante do choque entre a liberdade e a utilização de uma prova obtida de forma ilícita com o condão de comprovação de inocência, esta deveria ser aceita, de forma excepcional.

Nas palavras de Greco Filho (1989, p. 112), uma prova obtida por meio ilícito, mas que levaria a absolvição de um inocente (…) teria de ser considerada, porque a condenação de um inocente é a mais abominável das violências e não pode ser admitida, ainda que sacrifique algum outro preceito legal.

No mesmo sentido, Aury Lopes Jr. (2019, p. 489) afirma que, quando da obtenção ilícita da prova, o réu estaria acobertado pelas excludentes da legítima defesa ou do estado de necessidade, também sendo perfeitamente sustentável a tese de inexigibilidade de conduta diversa (excludente de culpabilidade), afastando, dessa forma, a ilicitude da conduta e da própria prova, legitimando seu uso no processo.

Seguindo esta linha, Paulo Rangel (2002, p. 431) esclarece ser acertada a aplicação da chamada “teoria da exclusão da ilicitude”, uma vez que a prova não poderia ser considerada ilícita quando a conduta do réu estivesse amparada por uma causa de exclusão de ilicitude.

Diante do exposto, verifica-se que nem toda a vedação sofrida pelas provas têm natureza ilícita. Em se tratando de inobservância procedimental, estaremos diante de uma prova ilegítima. A ilicitude, por sua vez, ocorrerá fora do processo e em decorrência da violação de intimidade, privacidade ou dignidade. Todavia, em relação à utilização de provas ilícitas como meio de defesa, excepcionalmente, estas a situação deveria ser consideradas, uma vez que o bem jurídico alcançado é maior que o direito violado.


REFERÊNCIAS

CORDERO, Franco. Procedimiento Penal. Trad. Jorge Guerrero. Santa Fé de Bogotá: Temis, 2000.

GRECO FILHO, Vicente. Tutela Constitucional das Liberdades. São Paulo: Saraiva, 1989.

LOPES Jr., Aury. Direito Processual Penal. 16 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.

RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 6 ed. Rio de janeiro: Lumen Juris, 2002.


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