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Qual é o bem jurídico tutelado no crime de lavagem de dinheiro?


Por Cezar de Lima


Quando estudamos o crime de lavagem de dinheiro, nos deparamos com inúmeros pontos controversos, dentre eles a questão do bem jurídico.

No âmbito nacional é sendo possível encontrar três correntes distintas: a primeira defende que o bem tutelado pela lavagem é a ordem econômica; ao passo que a segunda defende que o bem a ser tutelado é administração da justiça; e, por fim, uma terceira corrente sustenta que, por ser a lavagem um crime pluriofensivo, atinge não somente a ordem econômica como a administração da justiça e o bem jurídico protegido pelo crime antecedente.

À primeira vista, MAIA (2004, p.57) aponta que a administração da justiça é o objeto jurídico predominante a ser protegido pelo tipo da lavagem de dinheiro. Neste sentido, destaca-se a definição dada por BOTTINI E BADARÓ (2012, p. 53-62) onde afirmam que

“a administração da Justiça como bem jurídico tutelado pela lavagem de dinheiro trás característica de favorecimento (arts. 348 e 349 do CP), pois o comportamento afeta a capacidade da justiça de exercer suas funções de investigação, processamento, julgamento e recuperação do produto do delito. A lavagem aqui coloca em risco a operacionalidade e a credibilidade do sistema de Justiça, por utilizar complexas transações a fim de afastar o produto de sua origem ilícita e com isso obstruir seu rastreamento pelas autoridades públicas.”

Os defensores desta teoria ressaltam que a prática do crime afeta substancialmente o poder de ação estatal para descobrir a origem dos bens e/ou ativos.

Por outro lado, existe o entendimento que o bem jurídico tutelado pela Lavagem de dinheiro é a ordem econômica ou sistema financeiro, pois, no caso, a inclusão do capital ilícito com aparência lícita na economia prejudica o desenvolvimento normal da ordem econômica.

Seguindo este entendimento, DE CARLI (2012, p. 106-110) defende que o bem a ser tutelado seria a ordem socioeconômica, pois, segundo sua compreensão, a lavagem de dinheiro apresenta quatro implicações:

a) distorções econômicas: pois a lavagem de dinheiro pode resultar em um grande abalo ou até mesmo na perda do controle da econômica pelo Estado, pois quem pratica o crime de Lavagem disponibiliza produtos muitas vezes com preços inferiores aos de mercado; b) risco à integridade e à reputação do sistema financeiro: problemas de liquidez aos bancos podem ocorrer quando grandes somas de dinheiro lavado chegam às instituições financeiras ou delas rapidamente desaparecem. Além disso, a lavagem de dinheiro pode ‘manchar’ a reputação e a confiabilidade de uma instituição financeira; c) diminuição dos recursos governamentais: A lavagem de dinheiro dificulta a arrecadação dos impostos e diminui a receita tributária porque as transações a ela relacionadas ocorrem na economia informal; d) repercussões socioeconômicas: possibilita o crescimento das atividades criminais, o que traz maiores problemas sociais e aumenta os custos implícitos e explícitos do sistema penal como um todo.”

Em contrapartida, há autores que sustentam a aplicação da terceira corrente, cuja posição é de que a prática do crime de lavagem de dinheiro ofende concomitantemente a administração da justiça e a ordem econômica (MENDRONI, 2013. p.75).

Apesar da pluralidade de teorias apresentada pela doutrina, vem prevalecendo com maior força pela maioria dos doutrinadores brasileiros o entendimento de que o bem jurídico do crime de Lavagem seria a ordem econômica.

Por fim, verifica-se que a questão está longe de encontrar um consenso, sobretudo no âmbito doutrinário, em que pese existir uma inclinação doutrinária o entendimento de que o bem deve ser a ordem econômica. No entanto, está na hora de fazermos um debate sério sobre esse ponto, até porque definir de forma clara e criteriosa qual bem é tutelado pelo delito de lavagem de dinheiro mostra-se fundamental para não haver uma expansão demasiada do crime em comento.


REFERÊNCIAS

BOTTINI, Pierpaolo Cruz; BADARÓ, Gustavo Henrique. Lavagem de dinheiro: aspectos penais e processuais penais: comentários à Lei 9.613/98, com alterações da Lei 12.683/2012. São Paulo: RT, 2012.

DE CARLI, Carla Veríssimo. Lavagem de dinheiro: ideologia da criminalização e análise do discurso. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2012.

MAIA, Rodolfo Tigre. Lavagem de dinheiro: lavagem de ativos provenientes de crime. 2004.

MENDRONI, Marcelo Batlouni. Crime de lavagem de dinheiro. São Paulo, Atlas: 2013.

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