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Reflexões sobre as mazelas práticas na atuação dos advogados dativos

Reflexões sobre as mazelas práticas na atuação dos advogados dativos

De uns tempos para cá, venho observando com mais cautela a atuação dos assim chamados de advogados dativos, com especial destaque ao múnus que recebem no âmbito do processo penal para o exercício do o direito de defesa.

Apesar de constitucionalmente ser atribuição da Defensoria Pública a defesa das pessoas em condição de vulnerabilidade, não se ignora a falta de estruturação do órgão público para alcançar sua atividade fim. Surgindo, em razão disso, a necessidade do estabelecimento de convênios de assistência judiciária para delegar o exercício de tal atividade e, consequentemente, abrindo espaço para a figura do advogado dativo.

Apesar de a intenção ser louvável, até mesmo como forma de adequar os ditames traçados pela Constituição Federal, na prática é sensível a fictícia reação defensiva exercida por tais atores processuais, que ao final culminam com qualquer hipótese de resistência da pretensão deduzida por parte do acusado.

O que se verifica na imensurável maioria dos casos, é uma imaginária reação à acusação, muitas vezes, para o espanto de qualquer leigo, representando verdadeiro reconhecimento jurídico do pedido postulado pelo Ministério Público. Para a infelicidade do Estado Democrático de Direito e do princípio da ampla defesa, o sistema de justiça brasileiro conforma-se que exista defesa em tais casos, quando a bem da verdade está fechando os olhos para a realidade.

Não é incomum se deparar com a não apresentação de requerimentos de revogação de custódia cautelar – mesmo que diante de manifesta ilegalidade -, poucas são as interposições de recursos e as defesas são ofertadas apenas para cumprir formalidades essenciais ao procedimento, destituindo qualquer chance de reação pelo réu.

Para exemplificar a situação, conforme relatado por um colega, em hipótese real ocorrida, o acusado foi condenado pela prática do delito de tráfico privilegiado (art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06) às penas de 1 ano e 8 meses de reclusão no regime inicial fechado. Não obstante o entendimento firmado pelo Juízo seja contrário a atual jurisprudência adotada pelo STF, com grandes chances de modificação do regime de cumprimento de pena ou com a possibilidade de substituição da pena, o advogado dativo renunciou ao direito de recorrer no termo de audiência e deixou transitar em julgado, prejudicando severamente o réu.

A problemática vai se agravando conforme o distanciamento das Comarcas das capitais. No interior se verifica um verdadeiro desestímulo ao exercício do direito de defesa por parte dos dativos, através de própria influência do Poder Judiciário local para que não sejam efetuados requerimentos defensivos, ou o tratamento diferenciado para aqueles que não observarem os padrões “normais” de atuação, vistos como verdadeiros empecilhos a administração da justiça e, por consequência, os assistidos são exemplarmente punidos para não encorajar novos adeptos.

De nenhuma forma se ignora a importância dos aludidos convênios de assistência judiciária, mas deve ser repensada sua forma de atuação, ou a instituição de maiores mecanismos de controle sobre o seu exercício. O próprio Ministério Público diante do caso concreto, na qualidade de garantidor de direito individuais indisponíveis, deveria zelar pelo efetivo direito de defesa dos acusados em gerais.

No contexto destacado o único prejudicado é o acusado, que para fins legais tem um advogado regularmente nomeado nos autos. Porém, no exercício concreto sua defesa é fictícia e todo o arcabouço defensivo fica desamparado e maculado por algo que jamais será atingido no plano ideal, garantido apenas a formalidade procedimental e a não ocorrência das nulidades processuais.

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André Fini Terçarolli

Advogado Criminalista. Membro do Núcleo de Advocacia Criminal.

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