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A relativização da presunção de inocência em crimes contra dignidade sexual

Por Breno Luís Silva Fontes. Como bem se sabe, o Processo Penal caminha em consonância com a Constituição Federal brasileira, principalmente quando se trata de garantias. De início, é evidente que o instituto da presunção de inocência constitui maior relevância para o direito penal em geral, uma vez que a Carta Magna dispõe que nenhuma pessoa será considerada culpada até o trânsito em julgado de sentença condenatória, conforme prevê o art. 5º, inciso LVII.

Relativização da presunção de inocência

Desse modo, faz-se necessário uma análise frente aos trabalhos de nossas cortes superiores em aplicar ou não este instituto nos casos de crimes sexuais, em que a palavra da vítima torna-se prova majorante e de maior relevância. Por tanto, o presente trabalho tem por objeto identificar de que modo este princípio é relativizado com as decisões condenatórias que utilizam como fundamento a palavra da vítima, justificando-se por oferecer novos dados para o aprofundamento dos debates a respeito do tema.

No presente trabalho, portanto, abordaremos a existente relativização da presunção de inocência nos casos de delitos sexuais, principalmente quando estes provêm de denunciação falsa, através de uma análise do histórico sustentada pela lógica dedutiva. Assim, aplicaremos a revisão bibliográfica como principal método de pesquisa, bem como uma breve, porém sucinta, consulta aos textos legislativos e jurisprudenciais mais recentes a respeito do tema.

De início, será feita uma análise a respeito do instituto de presunção de inocência, bem como a sua utilização e importância nos dias atuais. Nesta mesma linha, analisaremos ainda o endurecimento trazido pela Lei 12.015/09 aos crimes contra a liberdade e a dignidade sexual. Por fim, mas não menos importante, por meio do método de revisão bibliográfica, analisaremos de que modo os textos legislativos e as jurisprudências aplicam ou não o referido instituto nos casos de crimes sexuais, onde a palavra da vítima é aqui a prova principal e de maior relevância.

Destarte, após uma análise jurisprudencial, o que se pode notar é que nossas cortes superiores admitem que há a necessidade de relativizar o principio da presunção de inocência nos casos de crimes contra a dignidade e a liberdade sexual, pois, segundo eles, a palavra da vitima deve prevalecer em relação às demais provas.

Por outro lado, a importância e também assim a valorização do citado principio constitucional foi diminuída com o passar do tempo, na medida em que a palavra da vitima ganhou maior valor no acervo probatório do crime tipificado no art. 213 do Código Penal brasileiro (estupro). Deste modo, é evidente que se criou jurisprudências no sentido de tornar o depoimento da vitima como principal elemento probatório nos processos de crimes contra a liberdade e a dignidade sexual. Como resultado, os casos de condenações injustas baseadas em falsas alegações, falsas lembranças, falsos reconhecimentos aumentaram definitivamente no território brasileiro com o passar dos anos.

Quanto à vítima, considero totalmente compreensivo e justo tal jeito de pensar. Porém, devemos destacar que, para o principio da presunção de inocência, tal pensamento é aterrorizante, pois existe contra ele algo capaz de, por si só, fundamentar uma sentença condenatória.

Ao agir desta maneira, acolhendo somente a palavra da vitima para fundamentar uma sentença condenatória, o juiz relativiza o principio da presunção de inocência, pois ele se sobrepõe, assim, aos argumentos defensivos. Um perfeito exemplo se encontra no caso de uma negação de autoria, ao qual o juiz se baseia somente no depoimento da vítima, que não possui obrigação nenhuma em honrar seu compromisso com a verdade. Deste modo, o magistrado desconhece o fato de que essa pessoa, vitima de uma suposta violência, está completamente dominada por inúmeras porções de sentimentos, na maioria das vezes, ódio ou paixão.

Assim, não importa qual seja a instância em que o processo tramita, ao agir desta maneira, o magistrado aniquila o instituto da presunção de inocência fundamentando sua sentença na palavra de alguém que pode possuir interesse na repressão penal contra aquele que “cometeu” um mal, e não na garantia do devido processo legal, tampouco numa valorização principiológica. Deste modo, acredito que seja um equívoco considerar a palavra da vitima de modo a criar uma presunção da verdade, em verdadeira relativização da presunção de inocência, pois cria-se aqui uma premissa inconsequente de que a vitima fala sempre a verdade e não possui motivo algum para mentir ou até mesmo errar.

Frente ao exposto, compreendo que a palavra da vitima deveria possuir menor valor probatório, ao contrário do que se tem, sua posição deveria ser condicionada a um conjunto probatório. Caso se faça presente um conjunto de provas harmônicas, detentora de coesão e capazes de elevar os indícios da pratica de um crime, deve-se então dar tão valoração a palavra da vítima. Por fim concluo que não se pode de fato estigmatizar a palavra da vítima, enxerga-la como algo descartável, porém tê-la como premissa máxima e absoluta, na falta de elementos probatórios e harmônicos com o restante do processo, é um erro ainda mais grave, uma vez que o interesse da vítima nem sempre é o de agir em favor da verdade.

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Pedro Ganem

Redator do Canal Ciências Criminais

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