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A resolução da OAB sobre investigação penal defensiva

A resolução da OAB sobre investigação penal defensiva

Em texto anterior sobre a relação entre a investigação penal defensiva e a sua admissibilidade diante do modelo processual penal brasileiro discorremos sobre a compatibilidade do sistema processual com essa maior atuação da defesa na produção de elementos de informação em sede de investigação pré-processual, sobre o papel da defesa no âmbito deste momento do processo penal e a tentativa de regulamentação que ocorreu na época da edição da Lei nº 13.245/2016, que alterou o Estatuto da OAB, de maneira que remetemos o leitor a tal artigo como leitura inicial sobre o tema.

Hoje temos como proposta analisar a Resolução aprovada no último dia 11 de janeiro de 2019 pelo Conselho Pleno da OAB, que regulamenta a investigação realizada pela defesa. Inicialmente se deve compreender qual a amplitude de regulamentação do citado provimento.

É importante frisar que a Resolução tem caráter meramente orientadora no âmbito ético e de condutas dos advogados. Não há, portanto, como se falar em uma prerrogativa profissional ao exercício da investigação defensiva.

Neste ponto, ressaltam-se as considerações feitas no texto anterior sobre o assunto: atualmente não há caráter mandatório nas requisições investigatórias realizadas pela defesa no âmbito da investigação pré-processual.

Pelo que se pode inferir do que prescreve o art. 2º, §§ 1º e 2º, da Lei 12.830/2013, conhecida como Lei de Investigação Criminal, é da autoridade policial a competência pela condução das investigações, sendo, consequentemente, discricionária dentro de suas atribuições a escolha das medidas que deverão ser adotadas para a apuração das infrações penais. Em síntese: ao advogado resta pedir e ao delegado decidir se adotará as medidas requeridas.

Entretanto, a Resolução não se limita a propor uma atuação da defesa na fase pré-processual. A amplitude da investigação defensiva se expande para antes, durante e depois do processo penal. Dispõem expressamente os arts. 1º e 2º da Resolução que a investigação pela defesa poderá ocorrer em qualquer fase da persecução penal, procedimento ou grau de jurisdição, seja na investigação preliminar, durante a fase processual, recursal, na execução penal e também como medida preparatória para propositura da revisão criminal ou durante sua tramitação.

Percebe-se, então, que os materiais colhidos devem ser vistos a priori como elementos de informação e somente se colhidos ou submetidos ao contraditório passarão a ser compreendidos enquanto meios de prova.

No que concerne a tais questões técnicas quanto a prova, nota-se que o parágrafo único do art. 3º da Resolução é atécnico ao falar de “[…] elementos destinados à produção de prova para o oferecimento da queixa”, uma vez que neste momento da persecução penal não se tem produção probatória (leia-se: submetida ao contraditório), mas sim mera recolha de elementos necessários para fundamentar o início da ação penal privada.

Referente ao dever de sigilo do advogado, a Resolução foi certeira ao prever nos arts. 5º e 6º que as informações obtidas estarão inicialmente abrangidas por tal obrigação do representante, entretanto, poderão ser comunicadas ou publicizadas desde que expressamente autorizado pelo cliente.

Por fim, é importante frisar que quando se fala em investigação penal defensiva não se está a tratar de uma obrigação da defesa em realizar tal investigação. Ao contrário, a estrutura (teoricamente) acusatória do nosso sistema processual impõe ao Ministério Público a obrigatoriedade na produção probatória capaz de superar a presunção de inocência do acusado, de maneira que se assim não proceder deverá o órgão julgador declarar a absolvição do réu.

Não obstante as existência de tais determinações legais, hoje a conjuntura das políticas criminais cada vez mais tensionadoras da presunção de inocência impõem uma atuação mais ativa do defensor no exercício de suas atribuições durante a persecução penal.

É dizer que o momento atual do processo penal brasileiro impõe ao advogado adotar todas as medidas necessárias para comprovar a sua tese defensiva, mesmo que seja de encargo do Ministério Público a produção das provas necessárias para fundamentar a denúncia ou para justificar ou exculpar a conduta do réu, uma vez que ele deve ser visto como titular da ação penal e não especificamente como órgão acusador.

Há materialmente uma inversão do ônus probatório dentro no atual processo penal brasileiro. Por exemplo, hoje se discute no nosso ordenamento de quem é a obrigação de provar causas de justificação ou de exclusão de culpabilidade; o aumento do número de condenações com base em provas indiretas (enquanto provas indiciárias) também contribui para esse efeito.

É por estes motivos que cada vez mais se faz necessária a inclusão no CPP de disposições que regulem as práticas de investigação defensiva, no intuito de tentar garantir maior paridade de armas, levando em consideração, inclusive, as situações especiais referentes à colaboração premiada.


REFERÊNCIAS

LIMA, Daniel; MUNIZ NETO, José. Investigação penal defensiva e o modelo investigatório brasileiro. Disponível aqui.

Resolução OAB sobre investigação penal defensiva. Disponível aqui.

EL HIRECHE, Gamil Föppel. Regulamentação da investigação defensiva: nem tudo que reluz é ouro. Disponível aqui.


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Daniel Lima

Mestrando em Direito Penal e Ciências Criminais. Especialista em Direito Penal e Processo Penal. Advogado.

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