Existem muitos questionamentos a respeito da real motivação para aplicação das penas no âmbito penal. Alguns a defendem como sendo um mal necessário, outros são avessos à sua aplicação, haja vista que de fato, na prática, não alcançam o resultado pretendido.
Na teoria, a pena possui basicamente, dupla finalidade no direito penal brasileiro: correção/retribuição e a prevenção. Isso porque, aquele que atenta contra a norma, cometendo uma ação tipificada pelo Código Penal, deve sofrer a retaliação pelo mal praticado, afinal, atentou não apenas contra a vítima, mas sua ação, em tese, atingiu à coletividade. Em contrapartida, espera-se que com a pena o indivíduo reformule o seu comportamento, de modo que não realize novas práticas criminosas.
Aliada a esta justificativa, que para muitos se mostra plausível, constata-se a necessidade da aplicação do direito penal como uma medida preventiva. Dessa forma, a sua aplicabilidade no caso concreto deve servir de exemplo para que outros membros da sociedade evitem o caminho da delinquência.
Entretanto, temos ainda, a terceira finalidade da pena, que deveria ser a base para o emprego de qualquer medida no âmbito jurídico penal: a ressocialização. Nesse ponto, é fácil constatar que se mostra cada vez mais difícil aplicar medidas que viabilizem este viés no âmbito carcerário. Isso porque, se mostra contraditório falar-se em retribuição (leia-se, castigo!) e possibilidade de (res) socialização em uma mesma frase, no contexto apresentado.
Verifica-se que a pena não é utilizada apenas como meio para correção do indivíduo, serve também para apartar aquele que não está agindo de acordo com os padrões exigidos para convivência em sociedade. Afinal, não se sabe o que fazer com ele diante da prática criminosa. Em razão disso, a única alternativa plausível e eficaz é segregá-lo, mantendo-o afastado da coletividade, pelo maior tempo possível.
Neste contexto, podemos pensar a pena de morte e a de caráter perpétuo como solução imediata a esta preocupação, afinal, com a morte do agente ou com a sua reclusão perpétua, não há motivos para se pensar no que fazer com ele após o término da pena. Assim, a pena torna-se um fim em si mesma. O problema está resolvido, pois não se mostra necessário pensar em alternativas para reinserir o condenado na sociedade.
Todavia, até que ponto a pena de prisão, por tempo determinado ou perpétua e a pena de morte se assemelham? Existe entre elas uma diferença quantitativa. Na primeira, há possibilidade de regresso, de reintegração, nas outras, a segregação perpétua do sentenciado. Entretanto, existe um ponto em comum a ser compartilhado: a possibilidade de exclusão total do indivíduo.
Constata-se, portanto, que os muros que separam as casas prisionais da sociedade não estão presentes apenas para demarcação de espaço, mas servem também como uma ruptura no tempo daquele que cumpre a pena. O tempo daquele que goza da liberdade difere daquele que cumpre a pena. Para este a vida para, o tempo cessa, a partir do momento que adentra o outro lado das grades.
Conforme retrata Ana Massuti[2], a pena privativa de liberdade se difere de todas as outras penas em razão da forma que combina estes dois elementos: o tempo e o espaço. Isso porque, o tempo, mais que o espaço, torna-se o verdadeiro sentido da pena.
Tanto na pena privativa de liberdade, quanto na pena de morte é verificada a existência de “negação do outro”. Nega-se ao sujeito, afastando-o, pois o que se deseja em realidade é que ele não continue existindo no presente de todos, por isso a segregação se faz necessária.
Nesse sentido, constata-se que da tríade dos fundamentos para a aplicação da pena no âmbito jurídico brasileiro, aplica-se de fato apenas no seu caráter retributivo. Isso porque, os institutos da prevenção e (res) socialização não encontram solidez na estrutura social atual em que vivemos.
Numa sociedade em que a criminalidade vem ascendendo a cada dia, constata-se que o real fundamento da pena tornou-se a segregação total do indivíduo, pelo maior tempo possível, o que justifica o rigor máximo das reprimendas penais constantes em nossa legislação. Portanto, constata-se que “o tempo como pena”, tornou-se o principal fundamento para a sua aplicação, não havendo espaço, por consequência, para pensar a pena privativa de liberdade como forma de reabilitação daquele que cumpre a pena imposta, de forma a promover o seu retorno à comunidade.
REFERÊNCIAS
MASSUTI, Ana. O tempo como pena. Editora Revistas dos Tribunais: São Paulo, 2003, p.33-38.