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STF: não cabe habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal

STF: não cabe habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal

A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que não cabe habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal e que não se pode afastar a causa de diminuição do artigo 33, § 4º, da Lei de Drogas em decorrência da existência de atos infracionais anteriores. A decisão liminar (HC 193.816/SP) teve como relatora a ministra Cármen Lúcia. 

Ementa

HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. PENAL. ACÓRDÃO CONFIRMATÓRIO DE CONDENAÇÃO TRANSITADO EM JULGADO. DESCABIMENTO DE HABEAS CORPUS SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTE. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006 AFASTADA COM BASE EM ATOS INFRACIONAIS PRATICADOS PELO PACIENTE. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. HABEAS CORPUS AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. Relatório 1. Habeas corpus, com requerimento de medida liminar, impetrado pela Defensoria Pública de São Paulo, em benefício de Daniel Ferraz da Silva, contra acórdão da Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que, em 20.10.2020, negou provimento ao Agravo Regimental no Habeas Corpus n. 615.917, Relator o Ministro Ribeiro Dantas. O caso 2. Consta dos autos ter sido o paciente condenado às penas de cinco anos de reclusão, em regime inicial fechado, e de quinhentos dias-multa, pela prática do crime previsto no caput do art. 33 da Lei n. 11.343/2006. 3. A Terceira Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo negou provimento à apelação defensiva: “APELAÇÃO – TRÁFICO DE ENTORPECENTES – (ARTIGO 33, “CAPUT”, DA LEI 11.343/06) – Recurso defensivo buscando o reconhecimento da causa de diminuição prevista no artigo 33, §4º da Lei 11.343/06; abrandamento do regime prisional, substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos e aplicação da pena de multa no mínimo legal – Pena que não comporta alteração – Inviabilidade de se aplicar o redutor, pois demonstrado que o acusado dedicava-se a atividades criminosas – Regime fechado compatível com a gravidade em concreto do crime – Inviabilidade de substituição por penas restritivas, eis que ausentes os requisitos legais – Impossibilidade de se afastar a pena de multa, já que prevista no preceito secundário da norma e aplicada no mínimo legal – Apelo defensivo desprovido”. 4. Contra esse acórdão a defesa impetrou o Habeas Corpus n. 615.917 no Superior Tribunal de Justiça e, em 28.9.2020, o Relator, Ministro Ribeiro Dantas, indeferiu liminarmente a impetração. Essa decisão foi mantida pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, que negou provimento o agravo regimental interposto pelo paciente: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA. ART. 33, § 4º, DA LEI N. 11.343/2006. INAPLICABILIDADE. QUANTIDADE E NATUREZA DA DROGA. DIVERSOS REGISTROS PRETÉRITOS DE ATOS INFRACIONAIS ANÁLOGOS AO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS. MANUTENÇÃO DO REGIME PRISIONAL FECHADO. PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Os Tribunais Superiores vêm reiteradamente decidindo que tanto a quantidade e a natureza da droga apreendida, como o envolvimento do acusado com atos infracionais no passado, podem servir idoneamente para impedir a aplicação do disposto no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, quando restar consignado pelas instâncias ordinárias que tais circunstâncias denotam sua dedicação a práticas criminosas. Precedentes. 2. Estabelecida a pena em 5 anos de reclusão, o regime fechado mostra-se adequado para o início do cumprimento da sanção imposta, diante da aferição de circunstâncias judiciais desfavoráveis (105g de cocaína e 5 pedras de crack), nos termos dos art. 33 do CP c/c o art. 42 da Lei n. 11.343/2006. 3. Agravo regimental desprovido”.  5. Esse acórdão é o objeto do presente habeas corpus, no qual a impetrante alega que “a decisão submete a parte paciente a evidente constrangimento ilegal porquanto não se aplicou o redutor do §4º do art. 33 da Lei de Drogas, mesmo sendo primária, de bons antecedentes e não havendo provas de que se dedique às atividades criminosas e nem que integre organizações criminosas, tudo reconhecido na própria sentença que fixou a pena no mínimo legal”. Sustenta que “a quantidade de drogas (…) poderá eventualmente servir para determinar o quantum de redução, não para obstar a aplicação do redutor”. Enfatiza que “a quantidade de drogas apreendidas não é excessiva (250 (duzentas e cinquenta) porções de cocaína, pesando aproximadamente 105g (cento e cinco gramas), e 05 (cinco) porções (pedras) de cocaína na forma de crack)”.  Argumenta que “os antecedentes infracionais não podem ser lavados para fins de dosimetria da pena”. Defende que, “inobstante a pena tenha sido fixada no mínimo legal, com as circunstâncias judiciais sendo consideradas favoráveis à parte paciente, quando da fixação do regime inicial, considerando a gravidade em abstrato do delito, entendeu-se pela fixação do regime inicial fechado”. Salienta que, “tendo em vista o quantum de pena aplicada à parte paciente, caso se acolha a tese do tráfico privilegiado, é premente a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, nos exatos moldes do que prevê o Código Penal”. Tem-se no requerimento e no pedido: “Ante o exposto, demonstrada a ilegalidade do ato da autoridade coatora, requer-se o deferimento da medida liminar do presente writ, para que a parte paciente aguarde o julgamento do presente em regime aberto e, ao final, requer-se a concessão da ordem para aplicar no caso concreto o redutor do art. 33, §4º da Lei de Drogas em seu grau máximo, fixando o regime inicial de acordo com os parâmetros do art. 33 do Código Penal, com a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos”. Examinada a matéria posta à apreciação, DECIDO. 6. Consta do sítio do Tribunal de Justiça de São Paulo que o acórdão confirmatório da condenação do paciente neste habeas corpus transitou em julgado em 12.8.2019. A presente impetração foi protocolizada em 6.11.2020, mais de um ano após o trânsito em julgado do acórdão confirmatório da condenação. Este Supremo Tribunal tem jurisprudência consolidada no sentido da inviabilidade de utilização do habeas corpus como sucedâneo de revisão criminal, salvo em caso de manifesta ilegalidade. Assim, por exemplo: “AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. REITERAÇÃO DOS ARGUMENTOS EXPOSTOS NA INICIAL QUE NÃO INFIRMAM OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. UTILIZAÇÃO DO WRIT COMO SUCEDÂNEO DE REVISÃO CRIMINAL. INADMISSIBILIDADE. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – O agravante apenas reitera os argumentos anteriormente expostos na inicial do habeas corpus, sem, contudo, aduzir novos elementos capazes de afastar as razões expendidas na decisão agravada. II – A jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal Federal não admite o uso do writ como sucedâneo de revisão criminal. Precedentes. III – Agravo a que se nega provimento” (HC n. 161.656-AgR, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe 31.10.2018). “PROCESSUAL PENAL. EMBARGOS DECLARATÓRIOS EM HABEAS CORPUS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. 1. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, tendo em vista a pretensão da parte recorrente em ver reformada a decisão impugnada. 2. O entendimento do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o “habeas corpus não se revela instrumento idôneo para impugnar decreto condenatório transitado em julgado” (HC 118.292-AgR, Rel. Min. Luiz Fux). Confiram-se, nessa mesma linha, os seguintes precedentes: HC 128.840-AgR, de minha Relatoria; RHC 116.108, Rel. Min. Ricardo Lewandowski; HC 117.762, Rel. Min. Dias Toffoli; HC 91.711, Rel.ª Min.ª Cármen Lúcia. 3. Na situação concreta não se verifica teratologia, ilegalidade flagrante ou abuso de poder que justifique a concessão da ordem de ofício. 4. Agravo regimental a que se nega provimento” (HC n. 154.106-ED, Relator o Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 6.8.2018). Confiram-se também os julgados a seguir: HC n. 137.153-AgR, Relatora a Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 16.11.2018; HC n. 161.267-AgR, Relator o Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 15.10.2018; HC n. 135.239-AgR, Relator o Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe 17.9.2018; HC n. 134.691-AgR, Relator o Ministro Alexandre de Moraes, Primeira Turma, DJe 1º.8.2018; HC n. 149.653-AgR, Relator o Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 6.2.2018; HC n. 123.182-AgR, Relator o Ministro Edson Fachin, Primeira Turma, DJe 29.9.2016; e HC n. 134.974, de minha relatoria, Segunda Turma, DJe 9.8.2016. 7. A despeito daquele óbice, o exame das circunstâncias do caso concreto demonstra ilegalidade flagrante na espécie, pelo que a ordem deve ser concedida de ofício. A pena-base foi exasperada em um sexto em razão da natureza e da quantidade dos entorpecentes apreendidos com o paciente. Na segunda fase da dosimetria, foi reconhecida a atenuante genérica da confissão, retornando a pena ao mínimo legal: “Na primeira fase, deve observar que, embora se trate de réu tecnicamente primário, o artigo 42, da Lei 11.343/2006, determina que o juiz, na fixação das penas, considerará com preponderância sobre o contido no artigo 59 do Código Penal, a natureza e a quantidade da substância ou do produto, a personalidade e a conduta social do agente. Neste particular, no que diz à quantidade da substância ou do produto, cabe observar que foi apreendido com o réu, ao todo, 250 (duzentas e cinquenta) porções de cocaína e 05 (cinco) porções de crack, é natural supor que a quantidade de droga apreendida em poder do réu causará maior perigo em relação à saúde pública. (…) Portanto, na primeira fase de aplicação penal fixo a pena-base acima do mínimo legal em 1/6 (um sexto), passando para 05 (cinco) anos e 10 (dez) meses de reclusão e pagamento de 583 (quinhentos e oitenta e três) dias-multa. Na segunda fase, cabe reconhecer a atenuante genérica da confissão, visto que, tanto na delegacia quanto em juízo, o réu confessou a prática do ilícito, razão pela qual retorno a pena ao seu mínimo legal, ou seja 05 (cinco) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, nos termos da súmula 231 do STJ. Não há agravantes a considerar”. Na terceira fase, a incidência da causa de diminuição de pena do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 foi afastada pelo juízo de origem com base em atos infracionais praticados pelo paciente quando adolescente: “Na terceira fase, justifico que o réu não faz jus à redução do artigo 33, § 4º da Lei 11.343/06, ante a existência de diversos atos infracionais cometidos pelo agente (págs. 151/152), todos análogos ao crime de tráfico, os quais denotam evidentemente a dedicação do agente às atividades criminosas. No caso, a personalidade do agente é extremamente desvirtuada, demonstrando que de modo algum o crime é um fato isolado em sua vida. Conforme demonstra a certidão encartada nos autos, o réu em sua adolescência reiterava com frequência, crimes de extrema gravidade, como tráfico. Embora tais fatos não sirvam como maus antecedentes são hábeis para demonstrar que a personalidade do réu é voltada para práticas delitivas, não se importando com a repressão estatal, e que as medidas aplicadas visando sua reeducação e socialização não foram aptas para afastá-lo do universo da criminalidade. Por óbvio, essa circunstância judicial lhe é extremamente desfavorável e permite o afastamento da causa de diminuição especial”. 8. No julgamento do Agravo Regimental no Habeas Corus n. 184.979, de minha relatoria (DJe 7.8.2020), a Segunda Turma deste Supremo Tribunal concluiu que a menção a atos infracionais praticados pelo agente não configura fundamentação idônea para afastar a causa de diminuição de pena do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006: “AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PENAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DO § 4º DO ART. 33 DA LEI N. 11.343/2006. INQUÉRITOS E PROCESSOS EM CURSO. ATOS INFRACIONAIS. INVIABILIDADE. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO”. Como anotei no voto condutor daquele julgado, a prática de atos infracionais não é suficiente para afastar a minorante, pois adolescente não comete crime, nem recebe pena. Nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/1990), as medidas aplicadas são socioeducativas e objetivam a proteção integral do adolescente infrator. O paciente ter praticado atos infracionais em sua adolescência, portanto, não é hábil a afastar a aplicação da causa de diminuição. 9. Ao negar provimento à apelação defensiva, o Tribunal de Justiça de São Paulo mencionou também a quantidade de entorpecentes apreendidos na posse do paciente para afastar a aplicação da minorante: “Na terceira fase, a magistrada singular entendeu incabível a aplicação da causa especial de diminuição prevista no artigo 33, §4º, da Lei 11.343/06, já que, pelas circunstâncias do caso concreto, demonstra-se que o réu dedicava-se a atividades criminosas. Com efeito, a expressiva quantidade de entorpecentes apreendida, bem como o fato de ter contra si diversos procedimentos relativos a atos infracionais análogos ao tráfico (fls.151/152) tornam inaplicável a benesse prevista no artigo 33, § 4º da Lei 11.343/06, criada com objetivo de apenar minimamente aquele que se está iniciando no narcotráfico. Ademais, o acusado não demonstrou possuir trabalho lícito, restando evidente que se dedicava à traficância fazendo dela seu meio de vida, mesmo porque o tráfico não é crime artesanal e quem nele se envolve necessariamente integra organização de pessoas para o seu cometimento”. Também nesse sentido decidiu o Superior Tribunal de Justiça, ao negar provimento ao Agravo Regimental no Habeas Corpus n. 615.917: “(…) os Tribunais Superiores vêm reiteradamente decidindo que tanto a quantidade e a natureza da droga apreendida, como o envolvimento do acusado com atos infracionais no passado, podem servir idoneamente para impedir a aplicação do disposto no § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006, quando restar consignado pelas instâncias ordinárias que tais circunstâncias denotam sua dedicação a práticas criminosas. A jurisprudência aplica-se ao caso em apreço, em que o paciente foi flagrado com 105g de cocaína e 5 pedras de crack, além de ostentar diversos registros de atos infracionais análogos ao tráfico de entorpecentes”. A quantidade de entorpecentes, entretanto, não foi mencionada pelo magistrado de primeira instância para afastar a incidência da minorante do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006. Assim, não poderiam o Tribunal paulista e o Superior Tribunal de Justiça inovar a fundamentação da sentença em sede de apelação defensiva e habeas corpus para acrescentar novos fundamentos ao decreto condenatório, sob pena de incorrer em indevida reformatio in pejus. Nesse sentido, decidiu este Supremo Tribunal: “HABEAS CORPUS. PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. PENAL. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DO ART. 59 DO CP. FUNDAMENTAÇÃO GENÉRICA. INVIABILIDADE. APLICAÇÃO DA CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI DE DROGAS NA FRAÇÃO DE 1/6. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO. REGIME PRISIONAL A SER EXAMINADO COM A FIXAÇÃO DA NOVA REPRIMENDA. ORDEM CONCEDIDA. (…) 3. Esta Corte possui entendimento consagrado no sentido de que configura constrangimento ilegal a imposição da fração mínima de redução (§ 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006) sem a devida motivação, não sendo permitido ao Tribunal de segunda instância, em recurso exclusivo da defesa, o acréscimo de fundamentos não utilizados na sentença condenatória, sob pena de incorrer-se em reformatio in pejus. Precedentes. 4. O regime prisional deverá ser estabelecido depois de fixada nova reprimenda ao paciente, à luz do art. 33 do CP. 5. Ordem concedida para determinar ao juízo competente que proceda à nova fixação da pena imposta ao paciente, com o estabelecimento do novo regime prisional, à luz do art. 33 do Código Penal” (HC n. 110.356, Relator o Ministro Teori Zavascki, Segunda Turma, DJe 27.11.2013). “PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS IMPETRADO CONTRA DECISÃO DE RELATOR DE TRIBUNAL SUPERIOR QUE INDEFERIU PLEITO CAUTELAR EM IDÊNTICA VIA PROCESSUAL. FLAGRANTE ILEGALIDADE. SÚMULA 691/STF. SUPERAÇÃO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. FIXAÇÃO DE REGIME INICIAL FECHADO COM FUNDAMENTO APENAS NO ART. 2º, § 1º, DA LEI 8.072/90. ACRÉSCIMO DE NOVOS FUNDAMENTOS EM SEDE DE HABEAS CORPUS. REFORMATIO IN PEJUS. VEDAÇÃO. ART. 2º, § 1º, DA LEI 8.072/90. INCONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO PLENÁRIO DESTA CORTE NO HC 111.840. HABEAS CORPUS EXTINTO POR INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO. 1. O Supremo Tribunal Federal não é competente para julgar habeas corpus impetrado em face de decisão de Relator de Tribunal Superior que indefere pedido de liminar em idêntica via processual (Súmula 691/STF). A supressão de instância inequívoca, revela-se a malferir o princípio do Juiz natural (art. 5º, XXXVII e LIII) na hipótese em que o writ impetrado nesta Corte versa a mesma fundamentação submetida ao Tribunal inferior. Precedentes: HC 107.053-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ de 15.04.11; HC 107.415, Segunda Turma, Relator o Ministro Joaquim Barbosa, DJ de 23.03.11; HC 104.674-AgR, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 23.03.11; HC 102.865, Segunda Turma, Relatora a Ministra Ellen Gracie, JD de 08.02.11. 2. O artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90 – que determina que o início do cumprimento da pena privativa de liberdade imposta em razão da prática de crime hediondo dar-se-á, necessariamente, no regime fechado – foi declarado inconstitucional pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do HC 111.840, Pleno, Relator o Ministro Dias Toffoli, sessão de 27 de junho de 2012. 3. A reformatio in pejus justifica a superação da Súmula 691/STF, máxime na hipótese em que o julgamento de recurso exclusivo da defesa, o relator adiciona circunstâncias não reconhecidas na sentença para agravar a situação do réu. Precedentes: HC 108.183, Primeira Turma, Relator o Ministro Luiz Fux, DJ de 18.10.12; HC 105.768, Primeira Turma, Relatora a Ministra Cármen Lúcia, DJ de 1º.06.11; HC 98.307, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJ de 23.04.10; HC 93.778, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, DJ de 15.08.08. 4. In casu, a) o juiz de primeiro grau condenou o paciente a 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, pelo cometimento do crime de tráfico de entorpecentes, fixando o regime inicial fechado para o início do cumprimento da pena, com fundamento tão somente no disposto no artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90; b) o Tribunal Estadual, em sede de habeas corpus, embora tenha reconhecido a inconstitucionalidade daquele dispositivo, acrescentou novos fundamentos que autorizariam a fixação do regime inicial fechado, agravando por conseguinte, a situação do paciente. 5. Habeas corpus extinto por inadequação da via eleita. Ordem concedida, de ofício, para que o Juízo da Primeira Vara Criminal da Comarca de Rondonópolis/MT, afastado o óbice constante do artigo 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, verifique se o paciente preenche, ou não, os requisitos necessários à fixação do regime inicial semiaberto” (HC n. 117.155, Relator o Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 17.5.2013). 10. Pelo exposto, nego seguimento ao presente habeas corpus (§ 1º do art. 21 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal), mas concedo a ordem de ofício para determinar ao juízo da Segunda Vara da Comarca de Porto Feliz/SP aplicar a causa de diminuição do § 4º do art. 33 da Lei n. 11.343/2006 e, considerada a nova pena a ser imposta, reexaminar os requisitos para eventual substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e para fixação do regime prisional. Oficie-se ao juízo da Segunda Vara da Comarca de Porto Feliz/SP para, com urgência, ter ciência e adotar as providências necessárias ao integral cumprimento desta decisão. Remeta-se, com o ofício a ser enviado, com urgência e por meio eletrônico, cópia da presente decisão.

(HC 193816 / SP – SÃO PAULO; HABEAS CORPUS; Relator(a): Min. CÁRMEN LÚCIA; Julgamento: 10/11/2020; DJe 12/11/2020)

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Pedro Ganem

Redator do Canal Ciências Criminais

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