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STJ: circunstâncias pessoais favoráveis do réu não garantem revogação da prisão

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a presença de circunstâncias pessoais favoráveis não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a justificar a imposição da segregação cautelar.

A decisão teve como relator o ministro Jesuíno Rissato (desembargador convocado do TJDFT):

Ementa

PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO QUALIFICADA, CÁRCERE PRIVADO E SEQUESTRO QUALIFICADO, ROUBO MAJORADO, DANO QUALIFICADO, CONSTITUIÇÃO DE MILÍCIA PRIVADA, INTEGRAR ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA, TORTURA E OBSTRUÇÃO DA JUSTIÇA. NEGATIVA DE AUTORIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRISÃO PREVENTIVA. ALEGADA AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO DO DECRETO PRISIONAL. SEGREGAÇÃO CAUTELAR DEVIDAMENTE FUNDAMENTADA PARA A GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. PERICULOSIDADE DO AGENTE. NECESSIDADE DE INTERRUPÇÃO DAS ATIVIDADES PELA ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. CONTEMPORANEIDADE DA MEDIDA. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA E PROCESSUAL A AUTORIZAR A APLICAÇÃO DO ART. 580 DO CPP. NOVOS ARGUMENTOS HÁBEIS A DESCONSTITUIR A DECISÃO IMPUGNADA. INEXISTÊNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. I – Para a decretação da custódia cautelar exigem-se indícios suficientes de autoria e não a sua prova cabal, o que somente poderá ser verificado em eventual decisum condenatório, após a devida instrução dos autos. II – As premissas fáticas firmadas nas instâncias ordinárias não podem ser modificadas na via estreita do mandamus. Dessarte, na hipótese, entender de modo contrário ao estabelecido pelo Tribunal a quo, quanto à existência de indícios de autoria para a preventiva, como pretende o agravante, demandaria o revolvimento, no presente mandamus, do material fático-probatório dos autos, o que é de todo inviável na via eleita. III – A prisão cautelar deve ser considerada exceção, já que tal medida constritiva só se justifica caso demonstrada sua real indispensabilidade para assegurar a ordem pública, a instrução criminal ou a aplicação da lei penal, ex vi do artigo 312 do Código de Processo Penal. IV – No caso, a segregação cautelar do agravante está devidamente fundamentada em dados concretos extraídos dos autos, que evidenciam de maneira inconteste a necessidade da prisão para garantia da ordem pública, notadamente em razão de, na condição de servidor da Assembleia Legislativa até 1º/2/2021, ter sido apontado como integrante de estruturada organização criminosa no âmbito da Assembleia Legislativa de Roraima, formada primordialmente por policiais militares da ativa e aposentados, que teria sequestrado e torturado o jornalista adversário ao Deputado Estadual Jalser. V – Segundo o decreto prisional, “O seu telefone celular IMEI 861522048319180 (terminal 95 99156-8527), fez uso de conexão de dados no dia 26 de outubro até o horário de 16:15:56 e retornou a fazer uso de conexão apenas no horário de 09:53:51 do dia 27/10/2020. – Da mesma forma, o IMEI 863259040527080 (terminal 95 99124- 3387), também de uso do investigado à época dos fatos, não registrou atividades no intervalo de 18:19:58 do dia 26/10/2020 às 10:00:47 do dia 27/10/202024; -De forma atípica, nos dias 16, 18, 19, 20, 22, 23 de outubro de 2020, período próximo à ocorrência do crime e no dia imediatamente posterior (27.10), o investigado esteve próximo à residência da vítima; O dispositivo de rastreamento veicular do investigado ? IMEI 863259040527080, a partir do dia 21/10/2020, se conectou em torres de telefonia próximas à residência do jornalista, o que indica que estava monitorando as vítimas”, circunstâncias que revelam a periculosidade concreta do agente e a imperiosidade da imposição da medida extrema ante a necessidade de se interromper ou diminuir a atuação de integrantes de organização criminosa, no intuito de impedir a reiteração delitiva, bem como para conveniência da instrução criminal. VI – Consoante r. decisum objurgado, “trata-se de organização criminosa composta por policiais militares altamente treinados e perigosos que já tentaram embaraçar as investigações e estavam comandados por Deputado Estadual, que à época era Presidente do Poder Legislativo de Roraima”, evidenciando a necessidade da medida constritiva para a conveniência da instrução criminal. VII – Ressalta-se que a presença de circunstâncias pessoais favoráveis não tem o condão de garantir a revogação da prisão se há nos autos elementos hábeis a justificar a imposição da segregação cautelar, como na hipótese. Pela mesma razão, não há que se falar em possibilidade de aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. VIII – Na hipótese, não há que se falar em extemporaneidade do decreto, tendo em vista que, embora os fatos tenham ocorrido em 26/10/2020 e a prisão temporária dos corréus tenha sido decretada mais recentemente, em 16/9/2021, e convertida em preventiva em 3/10/2021, ocasião em que também foi imposta a segregação cautelar em desfavor do agravante e de outros agentes, os indícios de autoria surgiram no decorrer da investigação e a prisão cautelar foi decretada tão logo reunidos elementos suficientes a demonstrar a necessidade da imposição da medida extrema. Feito o juízo de ponderação entre a medida imposta – restrição da liberdade de ir e vir – e os resultados que se buscam resguardar – garantia da ordem pública -, verifica-se que a determinação encontra-se em conformidade com a regra de proporcionalidade estrita. IX – Pontualmente, evidencia-se a contemporaneidade da medida, destinada, como sói de ser, à salvaguarda, por um lado, da ordem pública, ante a periculosidade do agente e, por outro e em reforço, à conveniência da instrução processual que, de outra maneira, estaria em risco pelas circunstâncias supramencionadas, em especial pela condição de integrante de organização criminosa, responsável pelo monitoramento e perseguição das vítimas, bem como porque o ora paciente e outro corréu “se negaram a apresentar o telefone celular, ao mesmo argumento de que o teriam perdido. Ou seja, os investigados LUCIANO [ora paciente] e THIAGO TELES ? já presos ? […] estão deliberadamente escondendo importante prova para a elucidação dos fatos ? ao ocultarem o telefone celular para não ser apreendido e periciado – numa clara obstrução da justiça”. X – De mais a mais, a contemporaneidade da cautelar deve ser aferida não tomando por base apenas a data dos fatos investigados, mas, igualmente, levando em conta a permanência de elementos que indicam que os riscos aos bens que se buscam resguardar com sua aplicação ainda existem. Nesse sentido, a gravidade da conduta aliada à periculosidade do agravante, integrante de organização criminosa estruturada na sede do Parlamento estadual, como destacado alhures, bem como o processamento da ação penal (na fase instrutória) evidenciam a contemporaneidade da prisão. XI – Consoante art. 580 do CPP, os efeitos da decisão que beneficia um dos acusados devem ser estendidos aos demais corréus nas hipóteses de similitude fática e processual. XII – No caso, inexiste similitude fática-processual entre o paciente e corréu Deputado Estadual beneficiado com as medidas cautelares, em decisão liminar, diante da demonstração da contemporaneidade da medida para o agravante, por um lado, e da imunidade processual que restringe a prisão preventiva de Parlamentar, por outro, nos termos do art. 53, § 2º, da CF, não configurado, no caso, prisão em flagrante a autorizar a segregação do corréu Jalser Ranier, em exercício do mandato de Deputado Estadual na Assembleia Legislativa de Roraima (ALE/RR). XIII – Em consonância com a jurisprudência desta eg. Corte Superior, não há falar em identidade na situação fática-processual das partes a ponto de autorizar, nos termos do art. 580 do CPP, a extensão dos efeitos do decisum que concedeu parcialmente a liminar e aplicou as medidas cautelares nos autos do HC n. 698.275/RR. XIV – Em consonância com a jurisprudência desta eg. Corte Superior, Pnão há falar em identidade na situação fática-processual das partes a ponto de autorizar, nos termos do art. 580 do CP, a extensão dos efeitos do decisum que concedeu parcialmente a liminar e aplicou as medidas cautelares nos autos do HC n. 698.275/RR. XV – É assente nesta Corte Superior que o agravo regimental deve trazer novos argumentos capazes de alterar o entendimento anteriormente firmado, sob pena de ser mantida a r. decisão vergastada pelos próprios fundamentos. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 700.459/RR, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), QUINTA TURMA, julgado em 23/11/2021, DJe 26/11/2021)

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