STJ estabelece contornos sobre ampla defesa e indeferimento de prova nova
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que viola o princípio constitucional da ampla defesa o indeferimento de prova nova sem a demonstração de seu caráter manifestamente protelatório ou meramente tumultuário, mormente quando esta teve como causa situação processual superveniente.
A decisão teve como relator o ministro Rogerio Schietti Cruz:
Ementa
HABEAS CORPUS. TRÁFICO TRANSNACIONAL DE DROGAS. PROVA NOVA SUPERVENIENTE. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA. LEGITIMIDADE. NULIDADE DO JULGAMENTO. EXCESSO DE PRAZO CONFIGURADO. ORDEM CONCEDIDA. 1. Segundo o disposto no art. 397 do CPC – aplicável, por analogia, ao processo penal, por força do art. 3º do CPP –, “É lícito às partes, em qualquer tempo, juntar aos autos documentos novos, quando destinados a fazer prova de fatos ocorridos depois dos articulados ou para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos”. Objetivamente, o fato novo surgido no Tribunal Regional Federal foi a juntada, pelo Desembargador relator da apelação, da suposta íntegra das mensagens obtidas por meio das interceptações telemáticas (BlackBerry messenger), o que gerou o confronto pericial pela defesa. 2. É bem verdade que a “regra insculpida no art. 231 do CPP, no qual se estabelece que as partes poderão apresentar documentos em qualquer fase do processo, não é absoluta, sendo que nas hipóteses em que forem manifestamente protelatórias ou tumultuárias podem ser indeferidas pelo magistrado” (HC n. 250.202/SP, Rel. Ministra Marilza Maynard – Desembargadora convocada do TJ/SE, DJe 28/11/2013). No entanto, caberia ao Tribunal de origem demonstrar, ainda que minimamente, as razões pelas quais a prova juntada aos autos pela defesa teria caráter manifestamente protelatório ou meramente tumultuário, o que, contudo, não ocorreu. Mais ainda, a Corte regional poderia, evidentemente, até refutar, motivadamente, as conclusões apresentadas no laudo pericial trazido pela defesa, mas não simplesmente se negar a examiná-lo sob a alegação de que sua juntada aos autos teria sido intempestiva, sob pena de violação do próprio disposto no art. 93, IX, da CF, máxime quando verificado que o pedido defensivo teve como causa situação processual superveniente, gerada pelo próprio Desembargador relator da apelação criminal. 3. Quanto à alegação do Tribunal de que a regularidade das interceptações telefônicas/telemáticas já teria sido examinada em momento anterior (por ocasião do julgamento do HC n. 0028984-47.2015.4.03.0000/SP), certo é que, embora não se tenha trazido à colação cópia do acórdão proferido nos autos do referido habeas corpus, é razoável inferir, ao menos em tese, que essa análise anterior não se deu sobre a íntegra do conteúdo das interceptações, pois, se assim o fosse, não haveria sentido em o Desembargador relator haver determinado, já depois da apresentação das razões de apelação pela defesa, a juntada aos autos de cópia das mídias contendo todos os áudios e mensagens pertinentes à interceptação telefônica/telemática. 4. Uma vez que se reconhece a nulidade do acórdão da apelação, com a determinação de que seja realizado novo julgamento, configurado está o apontado excesso de prazo na custódia cautelar, que perdura há mais da metade do tempo pelo qual foi o paciente condenado (12 anos de reclusão). 5. Ordem concedida, nos termos do voto do relator. Diante do excesso de prazo identificado na espécie, fica relaxada a prisão preventiva do paciente, assegurando-lhe o direito de aguardar em liberdade o novo julgamento da apelação, se por outro motivo não estiver ou não houver a necessidade de ser preso, ressalvada, ainda, a possibilidade de nova decretação da custódia cautelar, caso demonstrada a superveniência de fatos novos que indiquem a sua necessidade, sem prejuízo de fixação de medida cautelar alternativa, nos termos do art. 319 do CPP. (HC 545.097/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 28/09/2021, DJe 08/10/2021)
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