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STJ firma entendimento quanto ao crime do art. 1º, I, da Lei n.º 8.137/1990

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende que o crime do art. 1º, I, da Lei n.º 8.137/1990 se tipifica em virtude da incompatibilidade entre a não apresentação de declaração de rendimentos à Receita Federal, ou a apresentação de declaração com valores a menor, e a elevada cifra efetivamente movimentada em conta bancária, no período dos fatos. Dessa forma, devidamente comprovada a incompatibilidade entre os valores movimentados e a ausência de declaração, encontra-se demonstrada a materialidade penal, não havendo se falar em condenação baseada em presunção ou em inversão do ônus da prova.

A decisão teve como relator o ministro Reynaldo Soares da Fonseca:

Ementa

PENAL E PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL. 1. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. DECISÃO PROFERIDA COM OBSERVÂNCIA DO RISTJ E DO CPC. POSSIBILIDADE DE INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DOMINANTE. 2. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO JUIZ NATURAL. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO VERIFICAÇÃO. SUBMISSÃO DA MATÉRIA AO COLEGIADO. INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO REGIMENTAL. 3. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 28-A DO CPP. APLICAÇÃO RETROATIVA. NÃO CABIMENTO. PRECEDENTES. 4. OFENSA AO ART. 619 DO CPP. NÃO VERIFICAÇÃO. ARGUMENTOS DEFENSIVOS EFETIVAMENTE ANALISADOS. 5. IRRESIGNAÇÃO COM O MÉRITO. NÃO CABIMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 6. AFRONTA AOS ARTS. 4º E 111, I, DO CP. MOMENTO CONSUMATIVO. INÍCIO DA PRESCRIÇÃO. OBSERVÂNCIA À SV 24/STF. 7. VIOLAÇÃO DO ART. 2º DO CP E DO ART. 9º DO PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA. NÃO OCORRÊNCIA. APLICAÇÃO DA SV 24/STF A FATOS ANTERIORES À SUA EDIÇÃO. POSSIBILIDADE. 8. OFENSA AO ART. 6º DA LC 105/2001. NÃO VERIFICAÇÃO. EXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. 9. AFRONTA AOS ARTS. 83 E 387, III, DO CPP. MATÉRIAS JÁ ANALISADAS PELO STJ. RHC 83.753/SP. 10. VIOLAÇÃO AO ART. 155 DO CPP. NÃO VERIFICAÇÃO. PROVAS NÃO REPETÍVEIS. 11. OFENSA AO ART. 156 DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. PRESUNÇÃO ADMINISTRATIVA. INCOMPATIBILIDADE DE VALORES. CIRCUNSTÂNCIA CONSTANTE DO TIPO PENAL. 12. AFRONTA AO ART. 45, § 1º, DO CP. PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA CONCRETAMENTE FIXADA. REVISÃO QUE DEMANDARIA REEXAME FÁTICO. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. 13. VIOLAÇÃO DO ART. 60 DO CP. ATUAL SITUAÇÃO ECONÔMICA DO AGRAVANTE. EXAME QUE ENCONTRA ÓBICE NA SÚMULA 7/STJ. 14. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. Não há óbice ao julgamento monocrático do recurso especial, conforme autoriza o RISTJ, bem como o art. 932 do CPC. Ademais, é possível interpretação extensiva do Regimento Interno para monocraticamente dar ou negar provimento a recurso contra decisão contrária ou em consonância com jurisprudência dominante. 2. “A decisão monocrática proferida por Relator não afronta o princípio da colegialidade e tampouco configura cerceamento de defesa, ainda que não viabilizada a sustentação oral das teses apresentadas, sendo certo que a possibilidade de interposição de agravo regimental contra a respectiva decisão, como ocorre na espécie, permite que a matéria seja apreciada pela Turma, o que afasta absolutamente o vício suscitado pelo agravante” (AgRg no HC 485.393/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, DJe 28/3/2019). 3. Com relação ao art. 28-A do CPP, tem prevalecido o entendimento no sentido de não ser cabível sua aplicação retroativa “quando a persecução penal já ocorreu, estando o feito sentenciado, inclusive com condenação confirmada por acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça” (AgRg no REsp 1860770/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, Quinta Turma, julgado em 1°/9/2020, DJe 9/9/2020). 4. Para que haja violação ao art. 619 do CPP, é necessário demonstrar que o acórdão embargado efetivamente padece de um dos vícios listados – ambiguidade, obscuridade, contradição e omissão -, e que o Tribunal de origem, embora instado a se manifestar, manteve o vício. diferentemente do que alega o recorrente, os temas suscitados nos embargos de declaração foram efetivamente analisados, sendo apresentados fundamentos suficientes e claros para refutar todas as alegações deduzidas. 5. Resolvida a questão com fundamentação satisfatória, acaso a parte não se conforme com as razões declinadas ou considere a existência de algum equívoco ou erro de julgamento, não são os embargos, que possuem função processual limitada, a via própria para impugnar o julgado ou rediscutir a causa. Nesse contexto, é possível aferir, de forma manifesta, que a irresignação da defesa diz respeito, em verdade, ao mérito do acórdão embargado, o que não revela violação do art. 619 do CPP. 6. Devidamente esclarecido o momento da consumação do crime tributário, conforme estabelece a SV 24/STF, não há se falar em ofensa aos art. 4º e 111, I, do CP. De fato, se a materialidade delitiva só existe com o lançamento definitivo do crédito tributário, tem-se que as condutas praticadas pelo recorrente em momento anterior não revelam o momento da ação criminosa, porquanto inexistente, ainda, crime. 7. No que concerne à alegada afronta ao art. 2º do CP e ao art. 9º do Pacto de São José da Costa Rica, constato que “o entendimento exarado pela Corte de origem está em harmonia com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, segundo a qual não representa violação do princípio da irretroatividade da norma penal mais gravosa a aplicação da Súmula Vinculante 24/STF a delitos praticados em momento anterior à edição do citado verbete”. (AgRg no AREsp 1534331/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, SEXTA TURMA, julgado em 23/06/2020, DJe 4/8/2020). 8. As instâncias ordinárias registraram que as informações que deram subsídio ao processo penal foram obtidas por meio de quebra de sigilo bancário autorizado judicialmente, consignando-se, igualmente, que “o acesso aos dados que serviram de base para a constituição do crédito tributário decorreu de procedimento administrativo regularmente instaurado”. Nesse contexto, não há se falar em ofensa ao art. 6º da LC n.º 105/2001. 9. No que diz respeito à alegada afronta ao art. 387, III, do CPP, bem como ao art. 83 do CPP, constata-se que matéria afeta a mencionadas violações já foi exaustivamente analisada pela Quinta Turma do STJ, por ocasião do julgamento do RHC n. 83.753/SP, da minha relatoria. Dessarte, não é possível conhecer da referida alegação. 10. O entendimento do Tribunal Regional se encontra em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior, no sentido de que, “consoante a literalidade do disposto no art. 155, caput, do CPP, há uma ressalva para o cabimento de condenação exclusivamente com base em elemento não repetível colhido na fase administrativa”. (AgRg no AREsp 1404660/SP, Rel. Ministro JOEL ILAN PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 19/11/2019, DJe 28/11/2019). 11. O crime do art. 1º, I, da Lei n.º 8.137/1990, se tipifica em virtude da incompatibilidade entre a não apresentação de declaração de rendimentos à Receita Federal, ou a apresentação de declaração com valores a menor, e a elevada cifra efetivamente movimentada em conta bancária, no período dos fatos. Dessa forma, devidamente comprovada a incompatibilidade entre os valores movimentados e a ausência de declaração, encontra-se demonstrada a materialidade penal, não havendo se falar em condenação baseada em presunção ou em inversão do ônus da prova. 12. No que concerne à apontada ofensa aos art. 45, § 1º, do CP, constata-se que a majoração da pena de 1 cesta básica trimestral durante 2 anos para 24 salários mínimos foi concretamente fundamentada “porque o valor se mostra adequado à finalidade da pena e proporcional ao dano causado”, não havendo se falar, portanto, em afronta a dispositivo de lei. Ademais, para se desconstituir a motivação declinada, seria imprescindível o reexame de fatos e provas, o que não se admite na via eleita, haja vista o óbice do enunciado 7/STJ. 13. Quanto à alegada violação do art. 60 do CP, ao argumento de que não se considerou a situação econômica atual do recorrente, constato que, de igual forma, desconstituir a motivação declinada pela Corte Regional, demandaria o reexame de fatos e provas, o que não se admite na via eleita, haja vista o óbice do enunciado 7/STJ. Com efeito, “a pretensão de reduzir o valor do dia-multa esbarra na Súmula 7/STJ”. (AgRg no REsp 1931725/SC, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 3/8/2021, DJe 10/8/2021). 14 . Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg nos EDcl no REsp 1858165/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 16/11/2021, DJe 19/11/2021)

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