NoticiasJurisprudência

STJ: ingresso forçado em domicílio sem mandado é possível quando amparado em fundadas razões

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo – a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno – quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito.

A decisão teve como relator o ministro Reynaldo Soares da Fonseca:

Ementa

AGRAVO REGIMENTAL EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. TRÁFICO ILÍCITO DE ENTORPECENTES. INQUÉRITO POLICIAL. BUSCA DOMICILIAR EFETUADA POR POLICIAIS MILITARES SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. CONSENTIMENTO ORAL DADO POR MORADOR. FUNDADAS RAZÕES PARA REALIZAÇÃO DA BUSCA: FORTE CHEIRO DE MACONHA VINDO DA RESIDÊNCIA DO ACUSADO. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. QUESTIONAMENTO SOBRE A VALIDADE DOS DEPOIMENTOS PRESTADOS POR POLICIAIS EM SEDE INQUISITORIAL QUE NÃO FOI EXAMINADO NA CORTE DE ORIGEM: SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se à nova jurisprudência da Corte Suprema, também passou a restringir as hipóteses de cabimento do habeas corpus, não admitindo que o remédio constitucional seja utilizado em substituição ao recurso ou ação cabível, ressalvadas as situações em que, à vista da flagrante ilegalidade do ato apontado como coator, em prejuízo da liberdade do paciente, seja cogente a concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus. (AgRg no HC 437.522/PR, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 07/06/2018, DJe 15/06/2018) 2. O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral, que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo – a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno – quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito (RE n. 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes) DJe 8/10/2010). Nessa linha de raciocínio, o ingresso em moradia alheia depende, para sua validade e sua regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio. Precedentes desta Corte. 3. Em recente decisão, a Colenda Sexta Turma deste Tribunal proclamou, nos autos do HC 598.051, da relatoria do Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Sessão de 02/03/2021 (….) que os agentes policiais, caso precisem entrar em uma residência para investigar a ocorrência de crime e não tenham mandado judicial, devem registrar a autorização do morador em vídeo e áudio, como forma de não deixar dúvidas sobre o seu consentimento. A permissão para o ingresso dos policiais no imóvel também deve ser registrada, sempre que possível, por escrito. 4. No caso concreto, a leitura do auto de prisão em flagrante revela que, em diligência para averiguar denúncia de que vinha ocorrendo tráfico de drogas no beco em que reside o recorrente, um dos policiais afirmou ter sentido forte cheiro de maconha, oriundo de sua casa, chamaram-no ao portão e obtiveram sua permissão para realizar busca domiciliar, permissão essa confirmada tanto pelo recorrente quanto por sua namorada quando ouvidos em sede policial, após o que encontraram os entorpecentes (maconha e crack), em relação aos quais o recorrente teria confirmado, em sede policial, ser de sua propriedade apenas a maconha, para consumo próprio, e a balança de precisão. 5. Não há como se aferir, na via estreita do habeas corpus, se tal consentimento teria sido viciado por coação exercida pela autoridade policial, sobretudo porque não há, nos autos, evidências da alegada agressão sofrida pelo recorrente, mas apenas, indicação de que o magistrado de 1º grau determinou a realização de exame de corpo de delito no recorrente, durante a audiência de sua apresentação, realizada no dia seguinte à sua prisão, com o objetivo de esclarecer a veracidade das alegações. 6. De mais a mais, revela-se despiciendo o consentimento do morador para a realização de busca domiciliar se existem fundadas razões aptas a levar a crer que dentro do imóvel ocorre um delito, o que ficou evidenciado, na hipótese em exame, em virtude do depoimento de um dos policiais, que asseverou ter sentido forte odor de maconha proveniente da casa do recorrente, afirmação confirmada pelo recorrente e sua namorada, na delegacia, quando admitiram estar consumindo a droga no momento em que os policiais chamaram do portão da residência. 7. Se a alegação de nulidade dos depoimentos prestados pelos policiais no auto de prisão em flagrante não chegou a ser objeto de deliberação no acórdão recorrido, é inviável o conhecimento do tema por esta Corte, sob pena de indevida supressão de instância. 8. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no RHC 150.798/MG, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 24/08/2021, DJe 30/08/2021)

Leia também

STJ: reconhecimento fotográfico sem observância do art. 226 do CPP impede prisão cautelar


Quer estar por dentro de todos os conteúdos do Canal Ciências Criminais?

Siga-nos no Facebook e no Instagram.

Disponibilizamos conteúdos diários para atualizar estudantes, juristas e atores judiciários.

Redação

O Canal Ciências Criminais é um portal jurídico de notícias e artigos voltados à esfera criminal, destinado a promover a atualização do saber aos estudantes de direito, juristas e atores judiciários.

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo