STJ: não ocorre bis in idem em face da valoração negativa das consequências do delito
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não há se falar em bis in idem, em face da valoração negativa das consequências do delito, fundada no real grau de violação sofrido pelo bem jurídico tutelado, e a fração de redução da pena aplicada em decorrência da minorante da tentativa, nesse aspecto considerado o iter criminis percorrido pelo agente.
A decisão teve como relator o ministro Jesuíno Rissato (desembargador convocado do TJDFT):
Ementa
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO. DOSIMETRIA. PENA-BASE. CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. FRAÇÃO DE REDUÇÃO PELA TENTATIVA. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DOS ELEMENTOS FÁTICO-PROBATÓRIOS. RECONHECIMENTO DO HOMICÍDIO PRIVILEGIADO. DECISÃO DO TRIBUNAL DO JURI FUNDAMENTADA E RESPALDADA PELAS PROVAS DOS AUTOS. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA SOBERANIA DOS VEREDICTOS. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO INVIAVEL NA ESTREITA VIA DO MANDAMUS. AGRAVO DESPROVIDO. I – A parte que se considerar agravada por decisão de relator, à exceção do indeferimento de liminar em procedimento de habeas corpus e recurso ordinário em habeas corpus, poderá requerer, dentro de cinco dias, a apresentação do feito em mesa relativo à matéria penal em geral, para que a Corte Especial, a Seção ou a Turma sobre ela se pronuncie, confirmando-a ou reformando-a. II – A via do writ somente se mostra adequada para a análise da dosimetria da pena, quando não for necessária uma análise aprofundada do conjunto probatório e houver flagrante ilegalidade. III – Na hipótese, o Tribunal de origem apreciou concretamente a intensidade da reprovabilidade da conduta, assentando que o paciente “vinha perseguindo e praticando reiteradas condutas intimidatórias contra F. L. N., filha da vítima, bem como vinha ameaçando toda a família”, fatores que apontam maior censura na conduta e justificam a exasperação da pena-base. Nesse sentido, a violência psicológica, as ameaças e chantagens cometidas pelo réu (fls. 129 e 131) extrapolam a culpabilidade do tipo penal violado, constituindo elemento concreto idôneo para exasperar a pena-base (AgRg no HC n. 622.022/SC, Sexta Turma, Rel. Min. Sebastião Reis Junior, DJe de 29/03/2021). IV – No que se refere à conduta social do paciente, não há ilegalidade na fundamentação, porquanto “o comportamento possessivo do réu vinha de longa data. Chega-se à esta conclusão a partir dos depoimentos de F. D., que bem denotam um reiterado comportamento agressivo (agressões psicológicas, especialmente) por parte do réu durante a convivência do casal. Para além disso, há diversos indicativos de que o réu já se comportava desse modo em relacionamentos afetivos anteriores, considerando que há registros de ocorrências relativas a ameaças e agressões físicas contra namoradas/companheiras anteriores”, elementos que exigem resposta penal superior, em atendimento aos princípios da proporcionalidade e da individualização da pena. V – Sobre o desvalor das consequências do crime, também houve justificativa concreta, porque “a vítima Donizete teve de passar por intervenção médica para extrair o projétil que ficou alojado em seu corpo, do que resultou cicatriz na região do pescoço. A par do dano estético evidente, há de se considerar o natural sofrimento (físico e psíquico) decorrente da lesão. Ainda, Donizete disse que sofreu modificação em sua voz após a lesão sofrida, o que, segundo assegurou, foi certamente decorrência da lesão. Ademais, importa destacar os danos psicológicos causados a Fabiana, filha da vítima Donizete, o que ficou bastante evidente em seus depoimentos em Juízo, quando expressou muito medo do réu. Em plenário, aliás, Fabiana disse que está se mudando para outra cidade, o que reforça a impressão de que foi severamente abalada psicologicamente pelo crime (por todo o contexto criminoso, do qual o crime central é o homicídio tentado praticado pelo réu contra o pai dela).” Nesse diapasão, insta consignar que é firme a jurisprudência desta Corte Superior no sentido de que não há se falar em bis in idem, em face da valoração negativa das consequências do delito, fundada no real grau de violação sofrido pelo bem jurídico tutelado, e a fração de redução da pena aplicada em decorrência da minorante da tentativa, nesse aspecto considerado o iter criminis percorrido pelo agente” (AgRg no AREsp n. 1.881.761/CE, Quinta Turma, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, DJe de 20/09/2021). VI – Quanto à fração da tentativa, a Corte de origem destacou a adequação da fração mínima aplicada, levando em conta o critério do iter criminis, que foi substancialmente percorrido e chegou muito próximo da consumação, pois, “o projétil de arma de fogo efetivamente atingiu a vítima em região vital, de forma a causar-lhe efetivo risco de morte.” Qualquer incursão que escape a moldura fática ora apresentada, demandaria inegável revolvimento fático-probatório, não condizente com os estreitos lindes deste átrio processual, ação constitucional de rito célere e de cognição sumária. VII – No tocante ao reconhecimento do homicídio privilegiado, na espécie, o Tribunal local constatou a existência de provas em consonância com a conclusão dos jurados, no sentido que o paciente NÃO agiu sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima. Diante dessa situação, não há como se infirmar esse entendimento sem o reexame fático-probatório – inviável em habeas corpus -, e sem afronta à soberania dos veredictos. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 671.316/SC, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), QUINTA TURMA, julgado em 28/09/2021, DJe 05/10/2021)
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