STJ: notícia anônima não é motivo suficiente para a invasão do domicílio
STJ: notícia anônima não é motivo suficiente para a invasão do domicílio
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a invasão do domicílio necessita ser amparada em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto.
A simples notícia anônima de que, na residência do paciente, estavam sendo armazenadas substâncias entorpecentes – que ele, de fato, estivesse praticando delito de tráfico de drogas, ou mesmo outro ato de caráter permanente, no interior da residência, não demonstra argumento razoável para a mitigação da inviolabilidade do domicílio, ainda que tenha havido posterior descoberta e apreensão.
A decisão (HC 499.163/SP) teve como relator o ministro Rogerio Schietti Cruz.
Ementa
HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. FLAGRANTE. DOMICÍLIO COMO EXPRESSÃO DO DIREITO À INTIMIDADE. ASILO INVIOLÁVEL. EXCEÇÕES CONSTITUCIONAIS. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. INVASÃO DE DOMICÍLIO PELA POLÍCIA. NECESSIDADE DE JUSTA CAUSA. NULIDADE DAS PROVAS OBTIDAS. TEORIA DOS FRUTOS DA ÁRVORE ENVENENADA. ABSOLVIÇÃO QUE SE MOSTRA DEVIDA. HABEAS CORPUS CONCEDIDO. 1. O Supremo Tribunal Federal definiu, em repercussão geral, que o ingresso forçado em domicílio sem mandado judicial apenas se revela legítimo – a qualquer hora do dia, inclusive durante o período noturno – quando amparado em fundadas razões, devidamente justificadas pelas circunstâncias do caso concreto, que indiquem estar ocorrendo, no interior da casa, situação de flagrante delito (RE n. 603.616/RO, Rel. Ministro Gilmar Mendes, DJe 8/10/2010). No mesmo sentido, neste STJ, REsp n. 1.574.681/RS. 2. Não houve, no caso, referência a prévia investigação, monitoramento ou campanas no local. Não houve, da mesma forma, menção a eventual movimentação de pessoas na residência típica de comercialização de drogas. Também não se tratava de averiguação de denúncia robusta e atual acerca da ocorrência de tráfico naquele local. Há apenas a descrição de que, em razão de denúncias anônimas relatando que o imóvel serviria para depósito de drogas, os policiais dirigiram-se ao local e, lá chegando, ingressaram no domicílio e, nele, realizaram buscas. No entanto, ao que tudo indica, não houve a realização de nenhuma diligência prévia para apurar a veracidade e a plausibilidade dessas informações recebidas anonimamente. 3. Uma vez que não há nem sequer como inferir – de fatores outros que não a simples notícia anônima de que, na residência do paciente, estavam sendo armazenadas substâncias entorpecentes – que ele, de fato, estivesse praticando delito de tráfico de drogas, ou mesmo outro ato de caráter permanente, no interior da residência onde se homiziou, não há razão séria para a mitigação da inviolabilidade do domicílio, ainda que tenha havido posterior descoberta e apreensão, em sua residência (mais especificamente dentro de um armário), de 23 porções de maconha, 110 porções de cocaína, 220 porções de crack e 67 frascos de lança-perfume. 4. Uma vez reconhecida a ilicitude das provas obtidas por meio da medida invasiva, bem como de todas as que delas decorreram, fica prejudicada a análise das demais matérias aventadas na impetração. 5. Ordem concedida, para reconhecer a ilicitude das provas obtidas por meio de invasão de domicílio, bem como de todas as que delas decorreram, e, por conseguinte, absolver o paciente, com fulcro no art. 386, II, do Código de Processo Penal. (HC 499.163/SP, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 09/06/2020, DJe 17/06/2020)
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