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STJ: o cometimento do delito, por si só, não evidencia “periculosidade” exacerbada do agente

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entende que o cometimento do delito, por si só, não evidencia “periculosidade” exacerbada do agente ou “abalo da ordem pública”, a demandar a sua segregação antes de qualquer condenação definitiva.

A decisão teve como relator o ministro Reynaldo Soares da Fonseca:

Ementa

AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA COM MERA REFERÊNCIA À GRAVIDADE ABSTRATA DO DELITO DE TRÁFICO DE DROGAS ILÍCITAS, SEM DEMONSTRAÇÃO DE URGÊNCIA. ILEGITIMIDADE DA MEDIDA CAUTELAR EXTREMA. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. Como registrado na decisão impugnada, que nesta oportunidade se confirma, as disposições previstas nos art. 64, III, e 202 do Regimento Interno do Superior Tribunal de Justiça, não afastam do Relator a faculdade de decidir liminarmente, em sede de habeas corpus e de recurso em habeas corpus, a pretensão que se conforma com súmula ou a jurisprudência consolidada dos Tribunais Superiores ou a contraria (AgRg no HC n.º 513.993/RJ, Relator Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 25/6/2019, DJe 1º/7/2019; AgRg no HC n.º 475.293/RS, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 27/11/2018, DJe 3/12/2018; AgRg no HC n.º 499.838/SP, Relator Ministro JORGE MUSSI, Quinta Turma, julgado em 11/4/2019, DJe 22/4/2019; AgRg no HC n.º 426.703/SP, Relator Ministro RIBEIRO DANTAS, Quinta Turma, julgado em 18/10/2018, DJe 23/10/2018; e AgRg no RHC n.º 37.622/RN, Relatora Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Sexta Turma, julgado em 6/6/2013, DJe 14/6/2013). 2. Nesse diapasão, “uma vez verificado que as matérias trazidas a debate por meio do habeas corpus constituem objeto de jurisprudência consolidada neste Superior Tribunal, não há nenhum óbice a que o Relator conceda a ordem liminarmente, sobretudo ante a evidência de manifesto e grave constrangimento ilegal a que estava sendo submetido o paciente, pois a concessão liminar da ordem de habeas corpus apenas consagra a exigência de racionalização do processo decisório e de efetivação do próprio princípio constitucional da razoável duração do processo, previsto no art. 5º, LXXVIII, da Constituição Federal, o qual foi introduzido no ordenamento jurídico brasileiro pela EC n.º 45/2004 com status de princípio fundamental” (AgRg no HC n.º 268.099/SP, Relator Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 2/5/2013, DJe 13/5/2013). 3. No mais, pontue-se que a prisão em flagrante aconteceu na residência do réu, sem que as instâncias ordinárias tenham referido a existência de mandado judicial nesse sentido, sem prévia perseguição e sem que algo de ilícito tenha sido constatado no imóvel, antes do ingresso, o qual teria sido autorizado verbalmente pelo abordado, em evidente autoprejuízo. 4. Os autos não foram instruídos com o decisum que converteu a prisão em flagrante em preventiva, mas esse ato pode ser obtido em consulta ao andamento processual disponível no site do TJSE, de onde se extrai, em cotejo com o acórdão constante dos autos, que o paciente teria perpetrado o crime de tráfico de drogas ilícitas, tendo sido flagrado armazenando maconha em sua residência, e que sua prisão preventiva foi decretada em função da gravidade abstrata do delito. 5. Ocorre que, dessas passagens, não se identifica a razão pela qual a prisão processual seria imprescindível, mostrando-se inidônea a fundamentação relativa ao fumus comissi delicti, pois não se percebe que o paciente esteja a evidenciar notável risco à ordem pública ou à aplicação da lei penal, especialmente em se tratando de réu primário e de crime sem violência ou grave ameaça. 6. Na esteira de incontáveis precedentes desta Corte, a prisão cautelar é invariavelmente excepcional, subordinando-se à demonstração de sua criteriosa imprescindibilidade, à luz dos fatos concretos da causa, e não em relação à percepção do julgador a respeito da gravidade abstrata do tipo penal. 7. Desse modo, o cometimento do delito, por si só, não evidencia “periculosidade” exacerbada do agente ou “abalo da ordem pública”, a demandar a sua segregação antes de qualquer condenação definitiva. 8. Ademais, a teor do art. 8º, § 1º, I, “c”, e do art. 4º, I, “c”, ambos da Recomendação/CNJ n. 62, de 17/3/2020 – a qual foi editada em resposta à pandemia da COVID-19 -, o reconhecimento de que o suposto crime em tela não envolve violência ou grave ameaça reforça a necessidade de relaxamento da custódia cautelar. 9. Em tempo, convém esclarecer que a referência a ato do Conselho Nacional de Justiça prescinde de prévio requerimento das partes e que a aparente violação das garantias domiciliares do investigado constou na decisão ora agravada como obiter dictum, e não como razão de decidir. 10. Agravo regimental não provido. (AgRg no HC 698.649/SE, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 16/11/2021, DJe 19/11/2021)

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