STJ: quanto maior o iter criminis percorrido pelo agente, menor será a fração da causa de diminuição
A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adota o critério de diminuição do crime tentado de forma inversamente proporcional à aproximação do resultado representado: quanto maior o iter criminis percorrido pelo agente, menor será a fração da causa de diminuição.
A decisão teve como relator o ministro Ribeiro Dantas:
Ementa
PROCESSO PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. COMPENSAÇÃO DA ATENUANTE DA CONFISSÃO ESPONTÂNEA COM A AGRAVANTE DA REINCIDÊNCIA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO UTILIZAÇÃO DA CONFISSÃO NA FORMAÇÃO DA CULPA. TERCEIRA FASE DA DOSIMETRIA. MAJORANTES. NÃO UTILIZAÇÃO DO CRITÉRIO MERAMENTE MATEMÁTICO. TENTATIVA. ITER CRIMINIS AMPLAMENTE PERCORRIDO. REDUÇÃO PROPORCIONAL. CONTINUIDADE DELITIVA. INAPLICÁVEL. INOCORRÊNCIA DE UNIDADE DE DESÍGNIOS. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A individualização da pena é submetida aos elementos de convicção judiciais acerca das circunstâncias do crime, cabendo às Cortes Superiores apenas o controle da legalidade e da constitucionalidade dos critérios empregados, a fim de evitar eventuais arbitrariedades. Dessarte, salvo flagrante ilegalidade, o reexame das circunstâncias judiciais e dos critérios concretos de individualização da pena mostram-se inadequados à estreita via do habeas corpus, pois exigiriam revolvimento probatório. 2. Nos moldes da Súmula 545/STJ, no que se refere à segunda fase do critério trifásico, a atenuante da confissão espontânea deve ser reconhecida, ainda que tenha sido parcial ou qualificada, judicial ou extrajudicial, quando a manifestação do réu for utilizada para fundamentar a sua condenação. Em concreto, verifica-se que as instâncias ordinárias não utilizaram da confissão para concluir pela culpa do paciente, o que afasta a incidência da referida Súmula. 3. No que concerne à terceira fase da dosimetria, vê-se que as instâncias ordinárias, ao reconhecerem a incidência das majorantes do concurso de agentes e uso de arma de fogo, aplicaram a fração de 3/8 para majorar a pena, sem que reste evidenciada violação da Súmula 443/STJ. 4. Isso porque o crime de roubo foi praticado pelo apelante e sua comparsa, com a utilização de arma de fogo, surpreendendo as vítimas no interior de um estabelecimento comercial. Pelo mero fato de uma das vítimas demorar a entregar a bolsa, o paciente deflagrou duas munições em direção à vítima, não a atingindo por falha da arma. Tais circunstâncias concretas denotam a necessidade de maior resposta penal, em atendimento ao princípio da individualização da pena e, portanto, não se infere ilegalidade no aumento superior a 1/3 pela incidência das duas majorantes dos crimes de roubo. 5. Como regra, o Código Penal, em seu art. 14, II, adotou a teoria objetiva quanto à punibilidade da tentativa, pois, malgrado semelhança subjetiva com o crime consumado, diferencia a pena aplicável ao agente doloso de acordo com o perigo de lesão ao bem jurídico tutelado. Nessa perspectiva, jurisprudência desta Corte adota critério de diminuição do crime tentado de forma inversamente proporcional à aproximação do resultado representado: quanto maior o iter criminis percorrido pelo agente, menor será a fração da causa de diminuição. 6. Quanto ao momento consumativo do crime de roubo, nos mesmos moldes do crime de furto, é assente a adoção da teoria da amotio por esta Corte e pelo Supremo Tribunal Federal, segundo a qual os referidos crimes patrimoniais consumam-se no momento da inversão da posse, tornando-se o agente efetivo possuidor da coisa, ainda que não seja de forma mansa e pacífica, sendo prescindível que o objeto subtraído saia da esfera de vigilância da vítima. 7. No crime de latrocínio em questão o paciente acionou por mais de uma vez o gatilho para atingir a vítima com disparos de arma de fogo, somente não alcançado o propósito homicida em razão de falha meramente ocasional do armamento, considerando que o laudo pericial constatou sua eficácia para a realização de disparos. De rigor, pois, a manutenção da incidência do redutor de 1/3 (um meio), sob o título de causa de diminuição de crime tentado (CP, art. 14, II). 8. O crime continuado é benefício penal, modalidade de concurso de crimes, que, por ficção legal, consagra unidade incindível entre os crimes parcelares que o formam, para fins específicos de aplicação da pena. Para a sua aplicação, a norma extraída do art. 71, caput, do Código Penal exige, concomitantemente, três requisitos objetivos: I) pluralidade de condutas; II) pluralidade de crime da mesma espécie; III) e condições semelhantes de tempo lugar, maneira de execução e outras semelhantes (conexão temporal, espacial, modal e ocasional). 9. Adotando a teoria objetivo-subjetiva ou mista, a doutrina e jurisprudência inferiram implicitamente da norma um requisito outro de ordem subjetiva, que é a unidade de desígnios na prática dos crimes em continuidade delitiva, exigindo-se, pois, que haja um liame entre os crimes, apto a evidenciar de imediato terem sido os crimes subsequentes continuação do primeiro, isto é, os crimes parcelares devem resultar de um plano previamente elaborado pelo agente. Dessa forma, diferenciou-se a situação da continuidade delitiva da delinquência habitual ou profissional, incompatível com a benesse. 10. No caso dos crimes de roubo majorado e latrocínio, sequer é necessário avaliar o requisito subjetivo supracitado ou o lapso temporal entre os crimes, porquanto não há adimplemento do requisito objetivo da pluralidade de crimes da mesma espécie. São assim considerados aqueles crimes tipificados no mesmo dispositivo legal, consumados ou tentada, na forma simples, privilegiada ou tentada, e, além disso, devem tutelar os mesmos bens jurídicos, tendo, pois, a mesma estrutura jurídica. Perceba que o roubo tutela o patrimônio e a integridade física (violência) ou o patrimônio e a liberdade individual (grave ameaça); por outro lado, o latrocínio, o patrimônio e a vida. 11. Os crimes de roubo e latrocínio em questão foram cometidos em concurso material, porquanto praticados mediante ações inequivocamente autônomas. Não se pode confundir a unidade do contexto em que os fatos ocorreram com a unidade de ações ou condutas então exigidas para que se caracterize o concurso formal de crimes, motivo pelo qual se impõe a manutenção da regra do concurso material. 12. Agravo regimental desprovido. (AgRg no HC 609.131/SP, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 24/08/2021, DJe 30/08/2021)
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