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Teoria dos jogos aplicada ao Tribunal do Júri

Teoria dos jogos aplicada ao Tribunal do Júri

O objetivo deste artigo é realizar uma análise da teoria dos jogos aplicada aos processos penais submetidos ao Tribunal do Júri, a partir do conceito doutrinário do que seja a teoria dos jogos e baseado em experiências profissionais.

Durante dois anos estagiei no Ministério Público Estadual do Rio Grande do Sul, mais precisamente na Promotoria Criminal responsável, dentre outras matérias, pelos processos submetidos ao Tribunal do Júri.

No decurso desse período tive contato com diversos processos, inúmeras histórias e pude presenciar algumas sessões do júri, e é com base nessa experiência e considerando o entendimento doutrinário é que faço uma análise da teoria dos jogos e sua aplicabilidade no tribunal do júri.

Primeiramente irei fazer uma breve contextualização do que seja a teoria dos jogos, em seguida irei relatar dois casos presenciados (sem obviamente especificar elementos que possam identificar as partes envolvidas no processo), e por fim, farei a análise de como a teoria dos jogos foi aplicada nos fatos descritos.

Sobre a teoria dos jogos aplicada a outras áreas, leia também:

Teoria dos jogos aplicada ao júri

Desta forma, inicialmente tem-se, de acordo com o autor André Luiz Francisco da Silva VITAL (2010), acerca da teoria dos jogos que:

O uso dos jogos para a compreensão do comportamento humano reporta-se a Platão. Todavia, o grande marco do desenvolvimento da moderna teoria dos jogos, responsável por tornar o tema interessante para as ciências, foi a publicação de 1928, do matemático John Von Neumann, professor da Universidade de Berlim. Esse pesquisador procurou padrões para escolhas de estratégias nos chamados “jogos de soma zero”, nos quais os ganhos de uma parte necessariamente significam igual prejuízo à outra. […] Tal teorema mostra-se bastante útil ao garantir uma forma de encontrar o “ótimo”, entre várias estratégias, mesmo que em diversas situações o seu papel seja apenas o de demonstrar o caminho para o menor prejuízo. Ao passo que um dos jogadores deseja maximizar os seus ganhos, o outro deseja minimizar as suas perdas, essa é a base operacional desse teorema fundamental. […] a melhor atitude possível, em um dado contexto, portanto, pode ser a adoção de uma atitude que resultará no menor prejuízo, em vista das reações dos opositores. A escolha do “melhor” pode ser, simplesmente, a eliminação das piores opções.

Depreende-se do trecho acima descrito, em suma, que a teoria dos jogos pode ser aplicada a diversas áreas, e que ao aplicar essa teoria todas decisões passam a ser tomadas de forma estratégica, visando algum ganho.

Relato agora dois episódios destacados do período em que estagiei no Ministério Público, tendo em vista o tema aqui proposto, para em seguida analisá-los sob o prisma da teoria dos jogos.

O primeiro caso foi que, durante meu estágio o promotor titular que atuava no tribunal do júri implementou um sistema novo, ao menos naquela comarca, durante as sessões do júri. O método dele consistia em utilizar uma televisão para mostrar aos jurados fotos, laudos e vídeos anteriormente anexados ao processo.

Ainda, passou a fazer uso durante suas falas no júri de objetos similares ou idênticos aos que haviam sido utilizados na prática delitiva, também contava com o uso de bonecos de brinquedo que pudessem representar com a maior das semelhanças a(s) vítima(s) do delito.

Nesse primeiro fato tem-se que a utilização de recursos eletrônicos e objetos que possam elucidar e contextualizar os fatos descritos na denúncia são na verdade uma “tática de jogo” adotada pelo promotor do caso. Ao projetar imagens e vídeos para os jurados, a “jogada” do promotor é aproximar o máximo possível os jurados do caso.

Da mesma forma, quando a acusação faz uso de bonecos/brinquedos no plenário, transformando o plenário quase como se fosse um palco de teatro, acentuando fala e gestos do réu, é tida também como uma estratégia para despertar os mais diversos sentimentos dos jurados. Logo, no tribunal do júri trabalha-se muito mais com a emoção dos jurados do que com a razão propriamente dita.

O segundo fato ocorrido e que aqui eu destaco, foi que, ao término de uma outra sessão do júri, uma servidora questionou o promotor de justiça acerca do transcorrer da sessão, ao passo que a resposta dele foi:

Esse júri foi difícil de conseguir a condenação, o réu chegou de cadeira de rodas, enquanto que a vítima chegou conduzida pela Susepe.

No segundo caso, à luz da teoria dos jogos, quando o promotor refere ter sido mais difícil conseguir a condenação tendo em vista as condições pessoais do réu e vítima, na cadeira de rodas e conduzido pela Susepe, respectivamente, tem-se na verdade aqui uma leitura do jogo por parte do promotor.

É presumível que o promotor tenha chegado ao plenário já com uma tática definida a ser seguida durante o júri, no entanto, aí entra uma interpretação minha do cenário contextualizado, ao perceber a reação dos jurados diante das condições pessoais do réu e da vítima, o promotor opta por mudar sua tática anteriormente já definida.

Esse é um dos pontos importantes a ser observado na teoria dos jogos, é necessário ter um plano, uma tática, porém também é necessário, se quiser obter êxito, que se tenha um “plano B”, ou seja, que se saiba perceber as variáveis durante o jogo, e principalmente saber reagir de forma eficiente o mais rápido possível.

Os jurados são influenciados por aquilo que veem, por aquilo presente fora do processo, suas decisões não se limitam de capa a capa do processo. O tribunal do júri é basicamente um jogo de convencimento entre acusação e defesa.

Desse modo, dos dois casos é possível depreender que, por mais que os jurados não sejam “jogadores” no processo submetido ao tribunal do júri, são peças essenciais para a acusação e a defesa, eles conseguem, mesmo que inconscientemente, por simples reações gestuais e faciais, mudar toda uma tática anteriormente elaborada por uma das partes.

Portanto, desses dois relatos é possível extrair elemento essencial para um bom êxito no jogo que é o processo penal do tribunal do júri, nunca menosprezar os mínimos detalhes, até mesmo daqueles que não são jogadores, pois pode ser esse pequeno detalhe o fator decisivo do jogo.


REFERÊNCIAS

VITAL, André Luiz Francisco da Silva. A teoria dos jogos no contexto social e a visão de controle. Revista de Direito Público da Economia, Belo Horizonte, n.32, p.17-20, out./dez. 2010.

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