Tréplica sem réplica no Tribunal do Júri
Tréplica sem réplica no Tribunal do Júri
Inicialmente, no que tange ao direito da defesa de ir à tréplica no Tribunal do Júri, mesmo que a acusação não apresente a réplica, temos que tal situação, não sendo admitida, ofenderá frontalmente o princípio da plenitude de defesa.
Isso porque o referido princípio preceitua que, além de ser uma garantia do acusado defender-se com amplitude, no Júri a plenitude de defesa deve ser característica expressiva e essencial da própria instituição, pois Júri sem defesa plena não é um Tribunal justo e, desse modo, jamais será um direito fundamental. Em plenário, é certo que a ampla defesa está presente, mas, além de ser ampla, repita-se, a defesa tem de ser plena.
Ademais, conforme mencionado por Guilherme de Souza Nucci, no Júri, onde vigora o princípio da oralidade e da imediatidade, a atuação da defesa deve ser perfeita, mais que ampla, deve ser plena, visto inexistir outra chance.
Ainda nesta esteira, veja-se o pensamento do sempre brilhante Aury Lopes Jr. sobre o tema:
Contudo, em que pese ser majoritário o entendimento, questionamos: Por que não pode haver tréplica sem réplica? Qual a base legal desta “tradição” do júri brasileiro, de que somente haverá tréplica se o Ministério Público decidir ir para réplica? Deixar ao poder discricionário do acusador não é uma quebra da igualdade? Uma fragilização do contraditório? Não viola a garantia constitucional da “plenitude de defesa”? A despeito de majoritário entendimento em sentido diverso, pensamos que há uma violação inequívoca do devido processo.
Não obstante, em nenhum momento o Código de Processo Penal define que a tréplica só é possível com apresentação da réplica. Dessa forma, percebe-se que o artigo 476, § 4º, do CPP define que os períodos de réplica e tréplica são autônomos e independentes, de maneira que, além da acusação, a defesa também pode requerer a concessão de tempo complementar (tréplica) desde o início dos debates.
O referido artigo do CPP determina que:
Encerrada a instrução, será concedida a palavra ao Ministério Público, que fará a acusação, nos limites da pronúncia ou das decisões posteriores que julgaram admissível a acusação, sustentando, se for o caso, a existência de circunstância agravante.
Depois da acusação, a palavra será dada para a defesa, nos termos do § 3º, 3:
Finda a acusação, terá a palavra a defesa.
A réplica e a tréplica estão previstas no § 4.º, 4:
A acusação poderá replicar e a defesa treplicar, sendo admitida a reinquirição de testemunha já ouvida em plenário.
Sobre o tema, escreve com maestria Jader Marques:
Acontece que o § 4.º prevê que a acusação poderá replicar e a defesa (poderá) treplicar. Estaria a lei vinculando a tréplica à réplica? Muitos dizem que sim. Respeito, mas não me convence. Repita-se o que diz o § 4.º: “A acusação poderá replicar e a defesa treplicar, sendo admitida a reinquirição de testemunha já ouvida em plenário”. Se o juiz questiona o promotor quanto ao desejo de usar a faculdade da réplica e a resposta é negativa, o que impediria o magistrado de questionar o defensor quanto à faculdade de ir à tréplica? Nada.
Não obstante, frise-se que o Código de Processo Penal deve passar pelo filtro constitucional, haja vista que o constituinte foi claro e extremamente garantidor em relação à defesa do acusado, de forma que os postulados do contraditório, da ampla defesa e da plenitude de defesa devem ser princípios norteadores do Tribunal do Júri.
Assim, não podemos admitir que acusação fique com a prerrogativa de determinar o tempo dos debates segundo seus próprios interesses. Tal situação afronta a noção da paridade de armas perante o processo penal, além de violar frontalmente o já citado princípio da plenitude de defesa.
Nestes termos, na prática o acusador poderá utilizar da faculdade da réplica como estratégia processual, gerando graves prejuízos para a defesa. Para tanto, basta que o acusador dispense a réplica, por exemplo, no momento em que perceber a insuficiência da exposição da tese defensiva.
Além disso, constitui vantagem indevida para a acusação o simples fato de o acusador já saber desde o início dos debates como dirigir sua sustentação, pois pode contar ou não com a ampliação do tempo, diante da faculdade de usar a réplica. A defesa ao contrário, deverá sempre estar preparada para atuar com menos tempo de exposição aos jurados, pois só poderá contar com o período destinado à primeira manifestação, sendo temerário fazer o trabalho de plenário, contando com o prosseguimento dos debates.
Assim, verifica-se que nos debates do tribunal do Júri a defesa poderá sempre treplicar, independentemente da utilização ou não do tempo destinado à acusação para réplica, pois o direito da defesa à tréplica não depende da vontade de quem acusa.
REFERÊNCIAS
LOPES JR., Aury. Direito processual penal. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
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