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Violação às prerrogativas e o tiro no Direito de Defesa

Por Carlos Augusto Ribeiro

Na secular Terceira Lei de Newton tem-se que toda a ação tem uma reação, de modo que, transplantando essa lição para o âmbito do direito de defesa, podemos definir a dinâmica desse direito como uma reação apta a repelir todos os ataques sofridos pela pessoa na sua esfera individual, constituindo-se tal reação em um verdadeiro escudo contra o rolo compressor estatal (a ação).

A história, principalmente nos sombrios tempos da inquisição, nos mostrou que o poder absoluto, sem contraposição, desencadeou um rol de arbitrárias condenações, no qual não foi resguardado o sagrado direito de defesa, tendo como resultado os mais temerários julgamentos realizados.

A magnitude do direito de defesa, como nota qualificadora do Estado Democrático de Direito, é o substrato da ordem legal. É o que nos separa, ainda, da inquisição. É o que nos garante que, antes de sermos jogados no inferno, seremos ouvidos pelos céus. No cenário penal, é o exercício da defesa que não nos deixa rebaixados à condição de meros materiais de investigação e saciedade do controle estatal punitivo.

Neste contexto, personificando o próprio direito de defesa, há os advogados, cujo papel precípuo é viabilizar a concretização da Justiça. O exercício da advocacia tem legitimidade constitucional (art. 133 da Constituição Federal), e para uma plena e independente atuação, necessita de respeito às suas prerrogativas, o qual não é mera formalidade, e sim verdadeira forma de salvaguardar os direitos do cidadão.  Note-se, pois, que o respeito às prerrogativas dos advogados é visceralmente ligado ao direito de defesa, porquanto como exercê-lo sem plena liberdade e independência?

Ora, assim como os juízes e promotores, quando encontram infortúnios no seu exercício profissional, podem se proteger em suas prerrogativas, o advogado também precisa desse conjunto de medidas para exercer seu ofício, sem ser coagido ou intimidado, no interesse da prestação jurisdicional.

Atualmente, há uma tendência sistemática em violar prerrogativas dos advogados criminalistas, pois, no imaginário social, eles, infelizmente, figuram como aqueles que impedem o Estado de “punir”, sendo confundidos com o próprio cliente. Chegamos ao ponto da mais alta corte do país quebrar o sigilo bancário de advogados para investigar a origem dos honorários recebidos. Um tiro na classe e no direito de defesa.

Tal decisão é uma tentativa de controle dos próprios advogados, uma tentativa de tolher a independência desses profissionais e do próprio direito de defesa. Ora, para defender, o advogado antes terá que investigar a origem de seus honorários? É inadmissível, pois até mesmo o próprio Código de Ética e Disciplina, no artigo 21, estabelece que “é direito e dever do advogado assumir a defesa criminal, sem considerar sua própria opinião sobre a culpa do acusado”. A partir do momento em que o advogado seja obrigado a saber do cliente ou investigar a origem dos honorários, formar-se-á um pré-julgamento incompatível tanto com a parcialidade que deve ser exercida a defesa quanto com o mencionado artigo.

Como lembrava Carnelutti, nunca na história foi proposta a supressão de médicos ou dos engenheiros, mas dos advogados sim. Hoje não se propõe que os médicos perquiram a origem do dinheiro recebido em razão de uma cirurgia feita, não se propõe que o engenheiro perquira acerca do dinheiro recebido em razão de um projeto pormenorizado, mas do advogado sugere-se, mesmo com escrituração fiscal.

Afinal, o quão incomodador é o advogado criminalista, aquele ser que carrega a cruz pelo outro e se senta com ele no último degrau?

CarlosAugustoRibeiro

Carlos Augusto Ribeiro

Advogado criminalista

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