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Violar prerrogativas e/ou direitos do advogado é crime!

Violar prerrogativas e/ou direitos do advogado é crime!

Na última sexta-feira (03), entrou em vigor a Lei 13.869/19, que dispõe sobre os crimes de abuso de autoridade e altera a legislação sobre o tema. A referida norma tipifica as condutas abusivas praticadas por agente público, servidor ou não, no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las que vise a prejudicar outrem ou beneficiar a si mesmo ou a terceiro, ou, ainda, que por mero capricho ou satisfação pessoal.

O novel diploma prescreve importantes modificações em relação ao abuso de autoridade, que chegam em boa hora, em um contexto em que práticas abusivas cometidas por agentes públicos tem sido cada vez mais recorrentes, em especial sob pretexto de “dar cabo” a impunidade, alguns destes agentes, que deveriam garantir e proteger, tem violado, de forma irresponsável, direitos e garantias fundamentais do ser humano. A referida lei mais parece uma resposta do Poder Legislativo, legítimo representante do povo, aos demais poderes da República após várias usurpações de sua função e violação das normas emanadas por ele, por parte destes. 

A Lei 13.869/19 define 45 condutas que poderão ser penalizadas, dentre elas as de: decretar condução coercitiva de testemunha ou investigado antes de intimação judicial; promover escuta ou quebrar segredo de justiça sem autorização judicial; divulgar gravação sem relação com a prova que se pretenda produzir; continuar interrogando suspeito que tenha decidido permanecer calado ou que tenha solicitado a assistência de um advogado; interrogar à noite quando não é flagrante; e procrastinar investigação sem justificativa além da que será debatida neste texto, qual seja a de violar alguns dos direitos e prerrogativas do advogado.

Apesar da tipificação de tais condutas, diante do contexto atual, ser motivo de comemoração, por outro lado é triste pensar que foi necessário o legislador criminalizar condutas, que já deveriam ser barradas pelo próprio espírito de nossas normas constitucionais e seus princípios, que poderiam ser sanadas apenas na seara administrativa e civil, porém em face do desrespeito a nossa Carta Magna o Legislativo se viu obrigado a invocar a ultima ratio, o Direito Penal para conter os abusos estatais frente ao indivíduo.

Dentre os novos tipos penais, um dos mais relevantes é o previsto no artigo 43 da lei de “abuso de autoridade” que inseriu o artigo 7°-B no Estatuto da OAB (Lei 8.906/94) com a seguinte redação:

Art. 7º-B  Constitui crime violar direito ou prerrogativa de advogado previstos nos incisos II, III, IV e V do caput do art. 7º desta Lei:

Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa.

Dispõe os incisos mencionados na lei:

Art. 7º São direitos do advogado:

II – a inviolabilidade de seu escritório ou local de trabalho, bem como de seus instrumentos de trabalho, de sua correspondência escrita, eletrônica, telefônica e telemática, desde que relativas ao exercício da advocacia;  

III – comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis;

IV – ter a presença de representante da OAB, quando preso em flagrante, por motivo ligado ao exercício da advocacia, para lavratura do auto respectivo, sob pena de nulidade e, nos demais casos, a comunicação expressa à seccional da OAB;

V – não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas, assim reconhecidas pela OAB e, na sua falta, em prisão domiciliar.

A tipificação supracitada é uma vitória da advocacia, apesar de que. como já mencionado, é lamentável a necessidade de criminalização para fazer com que as autoridades públicas cumpram a lei.

Sem dúvidas, será um avanço na luta em defesa dos direitos e garantias. Afinal, não é apenas uma vitória da advocacia, mas principalmente da sociedade, pois o pleno exercício da advocacia é essencial para efetivação de um Estado Democrático de Direito. 

Diante da relevância do pleno exercício da advocacia, foram concedidos aos advogados prerrogativas, que são resguardadas em lei. São garantia à sociedade para concretização de seus direitos, mas tais prerrogativas são diariamente violadas.

Os links abaixo são exemplos claros de violação das prerrogativas conferidas aos advogados, que demonstram o tamanho desrespeito dos agentes públicos a lei e que justificam a tipificação da conduta trazida na lei 13.869/19. Cenas lamentáveis e não raras nos ambientes forenses, delegacias e etc.

Postado no Youtube, no canal Papo de Criminalista, o advogado Mário de Oliveira Filho denuncia um ataque de fúria de uma Juíza em razão do defensor ter feito uso da sua prerrogativa de interferência “pela ordem”: 

https://www.youtube.com/watch?v=fnD2DkNSI-U;

Neste outro, postado pelo canal Processo em Revista, o advogado é impedido de permanecer em sala de audiência e tentam o prender sem o representante da OAB:

Este trata-se de uma reportagem do canal Migalhas que relata uma covarde agressão feita por um membro do Ministério Público a um advogado de 84 anos em plena sessão de júri:

O cenário atual é crítico para advocacia. Frequentemente a imagem do advogado é deturpada, injusto este que muitas vezes é veiculado pelas grandes mídias. Há quase que uma criminalização da figura do advogado, em especial o criminalista, que muitas vezes é vinculado com o réu que defende, quando não com o crime praticado. É taxado de “inimigo da justiça” apenas pelo correto manejo dos recursos previstos em lei.

Conforme a própria Constituição Federal prevê, o advogado é indispensável à administração da justiça e é através dele que os cidadãos garantem seu direito de ampla defesa. Portanto, o advogado não defende apenas a lei, mas o Direito e a democracia. Ele possui a árdua missão de zelar pela legalidade e não se acovardar frente os abusos e arbitrariedades do Estado. 

Esperamos que a Lei 13.869/19 de fato tenha aplicabilidade, não seja apenas mais uma das tantas normas que “não pegaram” e contribua para a mudança do presente cenário. A advocacia precisa conquistar seu merecido reconhecimento e respeito. Abusos e cenas como as acima demostradas não podem voltar a se repetir.


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