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Visita íntima às adolescentes privadas de liberdade

No dia 17.12.2020, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) aprovou uma resolução que estabelece diretrizes para o atendimento socioeducativo às adolescentes privadas de liberdade no Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE).

A polêmica

Um assunto abordado naquele ato normativo acabou chamando atenção e causando grande polêmica nos meios de comunicação. Trata-se da previsão para visita íntima às adolescentes privadas da liberdade.

Para discorrer sobre o tema, importante transcrever dois artigos da presente resolução, quais sejam:

Artigo 2º – Para os fins desta Resolução considera-se:

I – adolescente privada de liberdade: a pessoa com identidade de gênero feminina que tenha entre 12 (doze) e 17 (dezessete) anos de idade, assim como excepcionalmente entre 18 (dezoito) e 21 (vinte e um) anos, conforme o art. 2º, parágrafo único da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, que estejam cumprindo medidas socioeducativas de meio fechado;

[…]

Artigo 41 – Deverá ser garantido o direito à visita íntima para as adolescentes, independentemente de sua orientação sexual ou identidade e expressão de gênero, nos termos do artigo 68, da Lei nº 12.594, de 18 de janeiro de 2012.

Pois bem, com a leitura dos dois dispositivos, a questão polêmica levantada foi a de que a mencionada resolução estava permitindo visita íntima às adolescentes a partir dos 12 (doze) anos, o que seria ilegal, já que aquele que pratica conjunção carnal ou ato libidinoso com menor de 14 (quatorze) anos, mesmo que haja consentimento da vítima, comete estupro de vulnerável, pois, nesta situação a violência é presumida (artigo 217-A do Código Penal).

Visita íntima às adolescentes privadas de liberdade?

Sem entrar na polêmica se tal permissão é imoral ou não, passarei a responder a seguinte questão: será que realmente foi autorizada a visita íntima para as adolescentes de 12 (doze) anos que estão reclusas? Resposta: NÃO! E explico a seguir.

Como dito anteriormente, com a leitura dos dispositivos previstos na resolução talvez até dê para concluir que foi autorizada a visita íntima para adolescentes de 12 (doze) anos. Contudo, tais artigos não podem ser analisados sozinhos.

O próprio artigo 41 da resolução, afirma que a visita íntima para as adolescentes deverá seguir o que dispõe o artigo 68 da Lei 12.594 de 18.01.2012, vejamos o que estabelece o texto legal mencionado:

Artigo 68 (Lei 12.594/2012) – É assegurado ao adolescente casado ou que viva, comprovadamente, em união estável o direito à visita íntima.

Analisando o referido dispositivo, chegamos a algumas conclusões:

  • A visita íntima para adolescente é assegurada por lei desde 2012;
  • Não foi a resolução aqui analisada que autorizou este benefício;
  • Somente o adolescente casado ou que vive em união estável tem direito;
  • Só a partir dos 16 (dezesseis) anos os adolescentes podem casar ou viverem em união estável.

Assim, posso afirmar que tanto a Lei 12.594/2021 quanto a resolução do Conanda, ao condicionarem a visita íntima ao casamento ou união estável, impediram que ela fosse realizada por adolescentes menores de 16 (dezesseis) anos, já que esta é a idade mínima exigida para se casar ou conviver.

Isso porque nosso Código Civil em seu artigo 1.517, determina que “o homem e a mulher com dezesseis anos podem casar, exigindo-se autorização de ambos os pais, ou de seus representantes legais, enquanto não atingida a maioridade civil”, aplicando-se, por analogia, à união estável.

Por outro giro, importante mencionar também que seria impossível uma resolução autorizar a visita íntima para adolescentes de 12 (doze) anos, pois, ela não é apta a alterar uma lei federal, já que hierarquicamente inferior. Inclusive, a resolução por ser um ato normativo, deve obedecer todas as leis federais que dispõe sobre o assunto, sob pena de ser ilegal.

Logo, não foi autorizada a visita íntima para adolescentes de 12 (doze) anos.

Leia também:

Fundamentação do Estado e da pena: uma resposta ao abolicionismo penal


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Marco Antonio Pedroso Cravo

Advogado. Especialista em Direito e Processo Penal

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