Artigos

Mas, afinal, o que é ciberterrorismo?


Por Dayane Fanti Tangerino 


Estamos já há algumas colunas tecendo comentários sobre o terrorismo, os atos de terror e o ciberterrorismo. Nessa linha, seria então salutar conceituar tais institutos, a fim de delimitarmos o nosso objeto de estudo.

Assim, inicialmente, sabendo-se que o ciberterrorismo, por sua caracaterística “novidadesca” não está previsto legalmente em diplomas legais pátrios, podemos procurar um conceito legislativo de terrorismo, para então, partindo dele, tentar elaborar um conceito válido de ciberterrorismo e, em não havendo conceito legal, podemos elaborar um conceito inicial válido e útil.

Em 2016 – recentíssimamente – fora promulgada a Lei 13.260, que trata da regulamentação do artigo 5º, inciso XLIII, da Constituição Federal, disciplinando o terrorismo e dispondo sobre a investigação, processo e conceito de organização terrorista, alterando, por fim, a Lei 7.960, de 1989 – que trata da prisão temporária – e a Lei 12.850, de 2013 – cujo tema são as organizações criminosas.

Como bem destaca o Delegado de Polícia e colunista deste Canal, Ruchester Marreiros Barbosa,

“cinco meses antes das Olimpíadas no Rio de Janeiro, o legislador, possivelmente motivado por manifestações populares mais intensas ocorridas no Brasil, algumas delas violentas, bem como pelos ataques em novembro de 2015 na França, editou a Lei 13.260/2016”.

Ou seja, não fora em decorrência de alguma espécie de ato de terror que referida legislação viera integrar o sistema jurídico nacional, mas sim, visando uma espécie de caráter preventivo para buscar “impedir” a ocorrência desse tipo de ação criminosa. Mas a lei em comento conceituou “terrorismo”?

Vejamos:

A constituição federal de 1988, no artigo 5º, XLIII, determina ao legislador brasileiro que se promova a previsão do crime de terrorismo. E, buscando atender ao comando constitucional, editou, o Legislativo, a referida Lei 13.260/2016. Tal normativa, em seu artigo 2º, parágrafo 1º, enumera “atos de terrorismo”, trazendo no caput que

“o terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública”.

E elenca os seguintes atos:

– usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa;

– sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento;

– atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa.

E, em seu artigo 19, alterando o artigo 1º, parágrafo 2º da Lei 12.850, de 2013, nele incluindo o inciso II, conceitua organizações terroristas como sendo “aquelas voltadas para a prática dos atos de terrorismo legalmente definidos”, no caso, os atos elencados na Lei 13.260, de 2016.

Assim, podemos dizer que, não obstante a Lei 13.260, de 2016 mereça inúmeras críticas – já brilhantemente tecidas pelo colega acima citado – teve tal normativa o mérito de trazer um rol de condutas consideradas como atos terroristas, sendo que, a nosso ver, por tratar-se de norma incriminadora e devendo, portanto, ser interpretada restritivamente, tal rol seria taxativo.

Nesse passo, podemos buscar extrair desta normativa um conceito “brasileiro” para o “terrorismo”, conceito este que assim sugerimos:

O terrorismo consiste na prática, por um ou mais indivíduos, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, de atos cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, paz pública ou incolumidade pública e que se utilizem de meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa de pessoas ou bens ou que, de qualquer forma, sabotem ou se apoderem do controle total ou parcial das estruturas essenciais de organização e funcionamento de uma comunidade.

Sabemos que, por tratar-se de um conceito inicial, passível está de incidir em falhas, pelo que estamos abertos a sugestões e críticas a fim de qualificar tal conceituação, tornando-a mais adequada. Mas, ainda que falho, é um conceito e, não havendo outro, dele vamos nos valer para alçar nosso objetivo neste artigo.

Assim, partindo desse conceito ora sugerido, verificamos que quando ele trara de meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa de pessoas ou bens” ou “atos que de qualquer forma, sabotem ou se apoderem do controle total ou parcial das estruturas essenciais de organização e funcionamento de uma comunidade”, estamos abrindo a possibilidade de incluir os atos praticados por meio das novas tecnologias. E a própria legislação quando elencou os atos de terrorismo, no já mencionado artigo 2º, parágrafo 1º, incluiu tal previsão:

“São atos de terrorismo: sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento;”.

Ou seja, podemos dizer que o conceito de ciberterrorismo está inserido no conceito maior de terrorismo, já que se trataria de um ato de terrorismo praticado por meio cibernético ou através das novas tecnologias.

Nesse diapasão, não obstante a Lei 13.260, de 2016 tenha suas muitas falhas que devem ser apontadas e discutidas, é inegável dizer que tal normativa trouxe, ainda que de forma demasiadamente aberta e vaga, ao menos, os traços daquilo que se entende como atos de terrorismo e devemos dela partir para buscar qualificar e aquilatar tal conteúdo, buscando dilapidar o conceito que dela se pode extrair a fim de torná-lo válido, eficaz e útil, permitindo-se, com isso, a ampliação e o aprofundamento das necessárias reflexões sobre o tema.

_Colunistas-Dayane

Dayane Fanti Tangerino

Mestre em Direito Penal. Advogada.

Artigos relacionados

Botão Voltar ao topo