Dahmer: Um Canibal Americano: o que é realidade e o que é ficção na série? (Parte 1)
A série “Dahmer – Um canibal Americano”, recém lançada pela Netflix e listada como sua produção top 1 do momento há dias, tem um grande cuidado em ser o mais próxima dos fatos que realmente aconteceram, tanto quanto possível, porém é certo que sempre haverá inconsistências e uma certa romantização da realidade.
Mas o que é verdade e o que é apenas ficção nesse novo sucesso da Netflix?
Nessa primeira parte, vamos embarcar em uma análise dos episódios 1, 2 e 3.
EPISÓDIO 1
O primeiro episódio começa mostrando as várias trancas que Jeffrey Dahmer tinha na porta de sua casa. Esse fato é verdadeiro, pois o serial Killer instalou fechaduras extras e chegou até mesmo a ter um sistema de câmeras, adquirido em um shopping. Além dos crimes que ele desejava ocultar, a localidade onde residia era perigosa e ele já havia sido roubado.
Outra cena é aquela em que ele é interpelado por sua vizinha quanto ao mau cheiro que vinha de seu apartamento e ele responde dizendo que a carne da geladeira estragou e seus peixes morreram. E sim, ambas foram algumas das desculpas usadas por Dahmer dadas à vizinha e ao síndico do prédio. Contudo, diferentemente do que mostrou a cena, a sua vizinha não teve medo dele, pois ele não era um cara assustador, tampouco assustava pessoas de maneira intencional.
Quanto à cena do canibal dançando em uma boate gay e interagindo com três homens, incluindo Tracy Edwards, sabe-se não ser verdadeira, primeiro porque Dahmer era esquizotípico, ou seja ele não interagia com pessoas, e segundo porque Edwards foi abordado durante o dia, na porta de um shopping, o Grand Avenue Mall.
Edwards não era homossexual e não frequentava boates gays. Ele até mesmo foi condenado por estupro.
Já na cena do apartamento, há também algumas situações inventadas: Dahmer não colocou droga na bebida de Edwards, pois ele estava sem “estoque” e foi exatamente que salvou a vida dele, que foi capaz de se defender. A faca usada por Dahmer para ameaçar Edwards também era muito menor do que a da série.
Outro fato inventado é a vizinha escutando sons vindo do apartamento de Dahmer pelo duto de ar.
Um ponto verdadeiro foi Dahmer colocando o filme O Exorcista III. Ele colocava alguns filmes que gostava no videocassete para assistir junto com suas vítimas. O que a série não mostrou foi a conduta dissociativa de Dahmer, que se balançava para frente e para trás em determinados momentos. Edwards também nunca tentou seduzir Dhamer de modo a enganá-lo.
Dahmer realmente acelerava cenas do filme até as que ele mais gostava, geralmente quando o “demônio da possessão” mostrava poder; gostava de ouvir os batimentos cardíacos das vítimas e, de fato, falou para Edwards que comeria o coração dele.
Quando Edwards foge, a série mostra que ele enfiou o dedo no olho de Dahmer, acertando-o com uma lâmpada. Mas o que aconteceu, de fato, foi diferente, Edwards socou Dahmer durante uma das “crises” dissociativas dele. Dahmer realmente tentou ir atrás do rapaz mas estava muito bêbado, o que permitiu Edwards abrir a porta e sair correndo.
Na dinâmica da ida dos policiais até o apartamento de Dahmer com Edwards, houve muita reação agressiva contra os agentes, o que não é mostrado na série, mas de fato um dos policiais levou as fotografias que encontrou até o seu parceiro e disse: “elas são reais”.
Lionel Dahmer, o pai do canibal, somente descobriu que o filho havia sido preso quando ligou na manhã seguinte para o apartamento dele e um detetive atendeu. Ele não foi despertado de madrugada como mostra a série. Na vida real, Lionel não foi informado de muita coisa pela polícia, mas descobriu tudo o que podia sozinho. Ele também não dirigiu de Ohio até Milwaukee, no Wisconsin, ele pegou um avião. Lionel nunca foi interrogado por dois detetives, mas de fato acreditou, num primeiro momento, que o filho era a vítima, não o algoz. Sobre o canibalismo do filho, Lionel somente soube durante o julgamento, meses depois.
Para Lionel, o filho era um cara lento e apático, que realmente foi submetido a uma cirurgia de hérnia e à separação da mãe de Jeff, e como isso o afetou aos 18 anos.
As provas e evidências encontradas no apartamento estão de acordo com a realidade: crânios humanos, partes de corpos congelados, fotografias das vítimas, ossos, um esqueleto completo. Apenas o barril azul não foi aberto na cena do crime, mas o médico legista Jeffrey Jentzen achou melhor levar o item até às instalações do instituto médico legal.
A série também mostra que foram descobertos 15 corpos humanos no apartamento do canibal, mas na realidade foram 11 e os moradores do prédio realmente foram “evacuados”.
EPISÓDIO 2
Após a prisão do canibal, ele foi interrogado por Patrick Kennedy, na série mostra Kennedy e Murphy, no entanto, Murphy somente chegou horas depois. Kennedy ganhou a confiança de Dahmer e extraiu sua confissão, mas diferentemente do que mostra a série, isso levou horas.
Quando começou a confessar, Dahmer voltou ao passado para tentar justificar a si mesmo e suas atitudes, motivo pelo qual a série inicia os flashbacks: Joyce, a mãe, sempre lutou contra uma doença mental que não sabia qual era, seu pai mais focado no trabalho e distante, as brigas entre o casal.
O episódio também mostra o canibal em Miami, após ser dispensado pelo exército. Quando morou em Miami, Dahmer não implorou para voltar para a casa do pai em Ohio como é mostrado, pelo contrário, alcóolatra, apenas pediu dinheiro para manter sua estadia na cidade. Shari, sua madrasta, afirmou que foi ela quem atendeu ao telefonema e negou enviar dinheiro, oferecendo que ele voltasse para Ohio, o que ele aceitou.
Outras cenas que correspondem à realidade no episódio: Dahmer foi morar com a avó em Wisconsin, o roubo do manequim e a descoberta do boneco pela avó
Quanto à vítima Konerak Sinthasomphone: na verdade o garoto foi abordado durante o dia sozinho, e não ficava com atitude de vadiagem. Apesar de ser real que o canibal tenha abusado três anos antes de seu irmão, Konerak não sabia disso. O próprio assassino só descobriu o parentesco entre as vítimas durante a investigação policial.
Fatos reais sobre as cenas envolvendo Konerak: a bebida com drogas, as fotografias, o garoto drogado no quarto deitado ao lado de um morto, as lentes de contato amarelas, o furo na cabeça da vítima com a furadeira, a tentativa de criar um zumbi usando água quente e ácido, a fuga do apartamento. Mas a dinâmica com os policiais não ocorreu daquela forma e os agentes não se convenceram tão facilmente.
Glenda Cleveland, que ligou para o MPD, não tem personagem na série. Na cena, ela foi substituída pela vizinha do canibal.
EPISÓDIO 3
Ao que tudo indica, a série baseou-se no livro de Lionel, “A Father’s Story”, para contar sobre o nascimento de Dahmer. Joyce já não era mais viva para dar sua versão dos fatos. Ao que tudo indica, Joyce grávida, se entupindo de drogas, andando numa noite fria sem rumo, encontrada pelo marido (só que não em uma parada de ônibus, mas sim estirada na grama de uma casa da vizinhança), realmente ocorreu. A perseguição de Joyce atrás de um suposto disco voador, também ocorreu (ela chegou a sair) em uma matéria de um jornal da região.
Outro ponto do episódio que é verídico, é que o canibal tinha uma estranha fascinação por entranhas de seres vivos, o que foi confirmado pelo psiquiatra Judith Becker, durante o julgamento em 1992.
Outros fatos fidedignos do episódio: Dahmer tentou socializar imitando pessoas com paralisia cerebral; a dissecação do porco na aula de biologia (porém com outra idade);
Sobre o abandono de Joyce, não é possível dizer o que é real e o que não é, já que Jeffrey, Lionel e Shari contam uma história diferente uns dos outros. O próprio Dahmer já deu versões diferentes, ora afirmou que foi pego de surpresa, ora que a saída dela foi conversada. Mas nada indica que ela tenha agido de forma grosseira e abrupta com o filho mais velho.
David, o irmão mais novo de Jeffrey, que poderia dar sua versão da história, desapareceu após a prisão do irmão e chegou até mesmo a mudar de sobrenome.
Quanto ao seu primeiro homicídio (de Steven Hicks), na série Jeffrey é mostrado parando o carro para dar carona a um jovem chamado Steven que deseja ir até um show em Chippewa Lake Park. Na vida real, Steven já havia assistido ao show e estava voltando para casa quando entrou no carro do canibal.
Não se tem certeza da real dinâmica do homicídio, mas Dahmer realmente acertou Steven com um peso de musculação, após ele querer ir embora. Steven agonizou no chão e foi estrangulado.
Jeffrey não saiu na mesma noite para descartar o corpo desmembrado de Steven, como mostra o episódio, mas ele realmente foi parado por uma viatura policial, após dirigir em zigue-zague numa estrada de madrugada, sofrendo uma multa.
A pulverização e o descarte dos ossos de Steven não ocorreram como mostrou a série e foram feitos anos depois, quando Dahmer retornou do Exército. Os ossos estavam escondidos dentro de um saco na floresta e foram espalhados pelo quintal de sua casa.
Na parte dois, apresentaremos a análise de outros quatro episódios da série sobre a vida do canibal. Até breve!
Fonte: OAV Crime