NoticiasDireito Penal

Chocante tendência no TikTok: Vítimas de crimes ‘ressurgem’ para contar os detalhes de seu trágico fim

Em um vídeo postado no TikTok, um homem relata de forma gráfica o assassinato brutal do jornalista da TV Globo em 2002. Esse assassinato foi ordenado pelo traficante Elias Maluco e envolveu o uso de uma espada samurai, perfuração dos olhos e pneus em chamas. No entanto, a cena não é protagonizada por Tim Lopes, mas por uma versão gerada por inteligência artificial.

Essa recriação faz parte de uma tendência perturbadora que circula no TikTok, na qual pessoas que foram assassinadas são recriadas digitalmente para narrar detalhadamente as próprias mortes.

Leia mais:

Resgate de trabalho análogo à escravidão registra o maior número em 12 anos

Suspeito de liderar grupo de exploração sexual infantil no Discord é preso em operação policial

É importante ressaltar que a recriação está longe de ser perfeita. O homem no vídeo, com cerca de 50 anos e pele branca, não se assemelha a Tim Lopes, que era negro na vida real. Além disso, a voz que narra a história, com uma dicção perfeita e um tom de dublado, também é gerada por inteligência artificial. Embora pareça quase humana, não é exatamente real. Esse vídeo é apenas um dos 16 que estavam presentes no perfil “Histórias Extraordinárias” do TikTok até a semana passada e tinha 32,2 mil seguidores. Outros vídeos apresentavam personagens como a atriz Daniella Perez e a menina Isabella Nardoni.

Alguns vídeos são narrados pelos próprios assassinos. Com uma voz grave para parecer ainda mais macabro, o palhaço serial killer John Wayne Gacy narra alguns dos 33 assassinatos que o levaram à execução em 1994. No entanto, assim como no caso de Tim Lopes, a representação do palhaço no vídeo não se assemelha ao Gacy real, lembrando uma versão mais velha do personagem fictício Pennywise, da franquia “It: A Coisa”.

É importante destacar que não é necessário ter morrido para ser “ressuscitado” nessas recriações. Dois dias antes da confirmação da implosão do submersível turístico Titan, dois vídeos apareceram em canais diferentes: um com o empresário, idealizador e piloto Stockton Rush; e outro com um passageiro, o também empresário Hamish Harding.

Em outro perfil, a jovem escritora Anne Frank foi animada digitalmente e conta em seu diário a perseguição que sua família sofreu pelo nazismo até 4 de agosto de 1944, quando a família foi traída e presa. Histórias Extraordinárias é apenas um dos canais que seguem a tendência de trazer “reanimadores” para o TikTok. Além desse canal, existem outros quatro perfis (Casos Reais Misteriosos, Minha Melhor Cena, Histórias Reais e Vozes do Passado) que também inspiram a ideia de trazer seres do além para assombrar os vivos, inspirados no livro de HP Lovecraft e em sua adaptação para o cinema.

Os donos desses perfis não responderam às mensagens deixadas nos comentários dos vídeos. Os milhares de seguidores desses perfis não criticam as produções, apenas apoiam seu espanto com as histórias contadas, expressando isso através de emojis de surpresa. Embora seja questionável em termos de bom gosto, exploração das vítimas e precisão, não está claro se é considerado crime. Especialistas consultados pelo Tilt afirmam que a legalidade de reanimar uma vítima com base em uma foto é incerta. Todos nós temos direitos sobre nossa imagem, nossa voz e tudo o que criamos. Isso é conhecido como direito de personalidade.

No caso de Tim Lopes, por exemplo, a família poderia impedir o uso dessa imagem com base no direito de imagem e também poderia processar os criadores por danos morais, por uma indenização. No entanto, como os criadores são anônimos, seria necessário acionar o TikTok para ajudá-los. De acordo com Cláudio Barbosa, advogado e especialista em direitos autorais na Kaznar Leonardos Advocacia, os criadores não poderiam ser legalmente responsabilizados apenas por criar vídeos de pessoas falecidas falando sobre suas mortes. Esse tipo de conteúdo é protegido pelo princípio da liberdade de expressão.

canalcienciascriminais.com.br chocante tendencia no tiktok vitimas de crimes ressurgem para contar os detalhes de seu tragico fim tiktok
Fonte: UOL

A pedido da reportagem, o especialista em deep fake Bruno Sartori, CEO da empresa Sintética (anteriormente conhecida como FaceFactory), explicou como esses vídeos são criados. Essas técnicas estão disponíveis para qualquer pessoa. Esses vídeos não são deep fakes, mas sim animações de imagens de áudios. Com base nesses áudios, eles conseguem realizar a “labialização”, ou seja, a inteligência artificial reconhece a posição dos lábios. É uma IA com redes generativas que produz conteúdo, mas não é feito da mesma maneira que os deep fakes.

TikTok afirmou que todos os usuários devem seguir as Diretrizes da Comunidade e que conteúdos ou perfis que as violem serão removidos assim que identificados

A técnica utilizada no aplicativo viral Wombo é muito semelhante a empregada nas deep fakes reais. Nesse caso, milhares de imagens são alimentadas em um modelo de inteligência artificial, permitindo a geração de replicações digitais da imagem de uma pessoa. Em resposta à Tilt, o TikTok afirmou que todos os usuários devem seguir as Diretrizes da Comunidade do TikTok e que conteúdos ou perfis que as violem serão removidos assim que identificados. No mesmo dia em que o TikTok respondeu, os cinco perfis mencionados na reportagem foram removidos.

A empresa afirmou que esses perfis violaram as diretrizes da plataforma. No entanto, o TikTok não especificou quais diretrizes foram infringidas. Apesar disso, após o contato da reportagem, uma pesquisa com o termo “casos reais” na plataforma revelou a existência de outros perfis semelhantes. Bruno Sartori insistiu: “Isso é uma tendência inevitável. Como acontece com tudo na internet, é algo difícil de controlar, sem muitos freios.”

Fonte: tiltuol

Daniele Kopp

Daniele Kopp é formada em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) e Pós-graduada em Direito e Processo Penal pela mesma Universidade. Seu interesse e gosto pelo Direito Criminal vem desde o ingresso no curso de Direito. Por essa razão se especializou na área, através da Pós-Graduação e pesquisas na área das condenações pela Corte Interamericana de Direitos Humanos ao Sistema Carcerário Brasileiro, frente aos Direitos Humanos dos condenados. Atua como servidora na Defensoria Pública do RS.

Artigos relacionados

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Botão Voltar ao topo