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Parlatório: o confessionário do acusado


Por Jean de Menezes Severo


Fala moçada, tudo certo? Maravilha. Mais uma coluna sendo preparada na madrugada após um dia exaustivo de muito trabalho e, principalmente, de muita emoção. Após um longo período, eu e minha mãe voltamos a nos ver e confesso a vocês: meu coração esta em festa. Mãe, te amo, e obrigado por tudo. Não fico mais longe da senhora um minuto sequer. Bem, já abri meu coração aos amigos leitores e vamos para mais uma coluna no Canal Ciências Criminais, o maior e melhor portal jurídico-penal do Brasil!

Em muitas colunas já escrita por este rábula diplomado, venho sempre destacando as dificuldades encontradas por nós criminalistas para exercer o nosso ofício. Situações básicas e de grande importância, tais como falar em reservado com o cliente, começam a se tornar uma verdadeira odisseia para o advogado. E eu estou falando apenas em falar em reservado com o meu cliente e nada mais!

Quando alguém é preso e tem sua liberdade suprimida, essa pessoa tem no advogado sua única esperança. O advogado torna-se a voz desse cidadão, ou melhor, a esperança maior em fazer com que ele retorne ao seu status anterior de homem livre.

O defensor, Dr. Advogado, precisa ouvir aquele acusado com a maior atenção possível para que então possa realizar uma defesa bem feita em favor do seu cliente, mas para isso é necessário que essa conversa seja RESERVADA, apenas entre o advogado e o preso. Não se pode admitir em hipótese alguma que essa conversa esteja sendo gravada ou escutada por terceiros, porque, se assim o for, estaremos violentando o principio da ampla defesa, se não vejamos:

Lei nº. 8.906/94, art. 7º:

São direitos do advogado:

III – comunicar-se com seus clientes, pessoal e reservadamente, mesmo sem procuração, quando estes se acharem presos, detidos ou recolhidos em estabelecimentos civis ou militares, ainda que considerados incomunicáveis; 

Ocorre que, em alguns presídios federais, todos de segurança máxima, as conversas entre o advogado e o preso têm sido gravadas. Além disso, o profissional não pode ingressar com os autos no parlatório ou levar sequer uma caneta para fazer apontamentos. Sim, isso acontece no Brasil em presídios federais e Catanduvas é um exemplo dessa arbitrariedade cometida contra o defensor e seu assistido.

A “desculpa” dos juízes da execução que autorizam essa barbárie é que o advogado pode ser um mensageiro de facções criminosas. Então, uma classe inteira de advogados honestos e éticos paga pelo erro de uma meia dúzia de criminosos que se dizem advogados e que atravessaram dolosamente a fronteira que divide a advocacia criminal e o crime.

Parece-me, sim, que tentam criminalizar a advocacia, sendo errado defender alguém que cometeu um ilícito penal. Querem diminuir e ridicularizar nossa classe. Nós advogados nunca pedimos ou tivemos quaisquer privilégios; só queremos trabalhar dentro das regras constitucionais e conversar com o cliente em reservado é uma delas.

Agora, inventaram que o acusado pelo crime de terrorismo tem que ficar incomunicável durante dez dias. Sequer pode falar com o seu defensor. Uma portaria oportunista tem mais força do que nossa Constituição Federal que prevê que, ainda que o país esteja em estado de sítio, é vedada a incomunicabilidade do preso, nos termos art. 136, § 3º, IV. Vivemos em uma democracia mais autoritária que a ditadura.

É um absurdo jurídico atrás do outro. Torna-se difícil explicar direito penal e processo penal em sala de aula. A sensação que tenho é que em breve vão exterminar todos nós, advogados criminalistas, da face da Terra, quando apenas gostaríamos de trabalhar ouvindo reservadamente nosso cliente em qualquer parlatório do Brasil.

Os padres que ouvem confissões que se cuidem. Em breve algum Moro da vida propõe uma portaria para que se revele os segredos ditos no confessionário, afinal de contas, o Estado tem que ter acesso a todas as informações, mesmo que para isso se tenha que extinguir o advogado e transformar o padre em um X-9.

JeanSevero

Jean Severo

Mestre em Ciências Criminais. Professor de Direito. Advogado.

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