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Questões normativas e práticas sobre o delito da lavagem de dinheiro

Questões normativas e práticas sobre o delito da lavagem de dinheiro

Inicialmente, relevante se faz salientar que não há uma caracterização a respeito do que é crime de lavagem, porém, os conceitos e denominações abordados não possuem divergências, ou seja, nenhum autor discorda de que lavagem de dinheiro consiste em um processo em que determinado capital ilícito é apresentado de forma lícita. Nesta esteira, Segundo Mendroni afirma que:

 […] a lavagem de dinheiro é um método pelo qual um indivíduo ou uma organização criminosa processa os ganhos financeiros obtidos com atividades ilegais, buscando trazer a sua aparência para obtidos licitamente, isto é, a lavagem de dinheiro é um processo que visa à incorporação econômica de recursos, bens e valores decorrentes de meios ilícitos sobre a aparência de capital lícito através de basicamente três fases: colocação, ocultação e integração […]

O delito de clareamento de capitais caracteriza-se por um conjunto de operações comerciais ou financeiras que buscam a incorporação na economia de cada país, de modo transitório ou permanente, de recursos, bens e valores de origem ilícita e que se desenvolvem por meio de um processo dinâmico.

No que tange à introdução do tipo penal de lavagem de capitais no ordenamento jurídico brasileiro, tal conduta passou a ser tipificada através da Lei 9.613/98, com pena podendo variar de três a dez anos reclusão e pagamento de multa, de forma que a Lei dispõe sobre os crimes de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores e sobre a prevenção da utilização do sistema financeiro, além de criar o COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) e dar outras providências. Frise-se que o citado diploma legal foi alterado pela Lei nº 12.683, em 9 de julho de 2012, com o objetivo principal de aproximar a lei nacional às recomendações internacionais sobre o tema.

Neste sentido, Roberto Podval, ao discorrer sobre o bem jurídico do delito de lavagem de dinheiro, assevera que:

O que se nota é que a criminalização da lavagem de dinheiro surge como forma de coibir o tráfico ilícito de entorpecentes, já que não obstante a intervenção do Direito Penal nessa matéria (através de leis cada vez mais severas e com penas menos brandas), tal criminalidade não só persiste como aumenta. Assim, uma vez evidenciada a impossibilidade de o Direito Penal evitar o tráfico de drogas, houveram por bem os Estados punir suas consequências.

Dentre diversas alterações relevantes, a nova Lei ampliou o rol de destinatários, incluindo uma extensa gama de profissionais, tais como consultores, contadores, gestores de recursos, dentre outros.

Sua atual redação prevê em seu artigo primeiro o crime de lavagem de dinheiro. Tal crime se dá ao ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.

Qualquer pessoa pode tornar-se sujeito ativo do tipo penal, inclusive aquele que concorreu para a infração. Para William Terra de Oliveira, esta técnica legislativa – inovação na ordem jurídica, mediante a criação de figuras penais especiais – principalmente no caso da lavagem de dinheiro, possui um lado positivo e outro negativo. Senão, vejamos:

 […] De um lado, está a previsão de um texto legal autônomo que favorece a criação de um espectro punitivo próprio, pretendendo abarcar exaustivamente todo o âmbito da matéria, concentrando em um único diploma a resposta penal e os demais aspectos dela decorrentes. Por outro lado, temos a não inclusão do delito na Parte Especial do Código Penal, contribuindo para a erosão da harmonia legislativa e do sistema punitivo, adotando um modelo político-criminal fragmentado que não respeita o ideal codificador, nem possibilita a sistematização ordenada do universo de condutas sujeitas ao Direito Penal, afetando o processo de interpretação da norma e produzindo duvidosos efeitos da prevenção geral […]

Quando de sua criação, a Lei, ao tipificar o crime de lavagem ou ocultação de bens, diretos e valores, atrelava a ele um rol taxativo de crimes antecedentes, a alteração também eliminou este rol. Com a nova redação, quaisquer crimes ou até mesmo contravenções penais podem configurar crime antecedente de lavagem de dinheiro e também culminou no aumento da multa máxima de R$ 20 mil para R$ 20 milhões.

No que tange ao procedimento prático do delito de lavagem de dinheiro, o mesmo possui três etapas de evolução, sendo a primeira etapa denominada “COLOCAÇÃO”, onde o dinheiro é inserido no negócio de fachada através de pequenos depósitos e compras de ativos, distanciando, desta forma, o bem, direito ou valor de sua origem ilícita.

A lavagem de dinheiro pode ser realizada em qualquer lugar, geralmente em países com regras mais permissivas e sistema financeira mais liberal, onde as leis são ou inexistentes ou flexíveis, ou ainda, onde os esforços de controle não são fortes ou inexistentes (paraísos fiscais ou centros offshore). Podemos usar como exemplos práticos desta etapa a compra de um terreno, empreendimento, sociedade, crédito, ou direito creditório de propriedade do cotista.

Já a segunda etapa, denominada como “OCULTAÇÃO OU CAMUFLAGEM”, ocorre quando o dinheiro é transferido entre várias contas para que seja despistado, de difícil lastreamento ou rastreamento contábil. Mediante fraude o objeto ou origem do dinheiro, ficam camuflados, com a quebra da cadeia de evidências e da lavagem, torna-se lícito.

Em meio a diversas atividades aparentemente lícitas e legitimas do dia a dia, o infrator vai pouco a pouco se afastando do objeto do ilícito, e trazendo os recursos de volta por meio lícitos, gerando lucro contábil na atividade lícita (p.ex. operações em bolsas de valores, contratos e operações sem fundamentos econômicos). São exemplos dessa fase os resgates, amortizações e rendimentos.

Na terceira e derradeira fase, chamada de “INTEGRAÇÃO”, o dinheiro lavado é adicionado de forma legal, como se fossem investimentos. O objeto da lavagem é integrado no sistema como se lícito fosse. Os ativos são incorporados formalmente ao sistema econômico. As organizações criminosas buscam investir em empreendimentos que facilitem suas atividades, podendo tais sociedades prestar serviços entre si. Uma vez formada a cadeia, torna-se cada vez mais fácil legitimar o dinheiro ilegal.

Um exemplo desta fase é a utilização do produto do resgate ou amortização na compra de novos bens e aplicações. Nesta hipótese, o gestor de recursos seria o agente mais indicado para detectar o ilícito.


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Thiago Cabral

Pós-Graduando em Direito Penal e Processual Penal. Pós-Graduando em Ciências Penais. Advogado criminalista.

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