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Prescrição penal e as alterações trazidas pela Lei 13.964/19

Prescrição penal e as alterações trazidas pela Lei 13.964/19

Olá amigos, espero que estejam bem.

Continuando nossa série de artigos sobre a Lei 13.964/19 (pacote anticrime), neste artigo iremos abordar as alterações relacionadas à prescrição penal, bem como as causas suspensivas e interruptivas desta.

Prevista no artigo 107, inciso IV do Código Penal, a prescrição é modalidade de extinção de punibilidade do agente pela perda da pretensão de punir o sujeito ativo do delito ou de executar essa punição, ante o decurso do prazo legal, por inércia do Estado.

A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime. Embora o tempo máximo de cumprimento de pena, no Brasil, tenha sido aumentado para 40 anos, nada foi alterado quanto aos prazos para prescrição, permanecendo a regra prevista no artigo 109 do CP.

Após o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, a prescrição regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.

Como se sabe, a prescrição possui causas suspensivas. A suspensão determina que o prazo deixe de fruir, ficando paralisado. Com o fim da suspensão, a prescrição volta a correr de onde parou. A título exemplificativo, se o prazo prescricional de determinado crime é de 8 anos e, ao completar 2 anos do prazo, sobrevém uma causa suspensiva, o prazo ficará suspenso (não corre) a partir do tempo já corridos Cessada a causa de suspensão do prazo, este voltará a fruir, reiniciando-se automaticamente. Assim, restaria mais 6 anos para a ocorrência da prescrição.

As causas suspensivas da prescrição estão previstas no artigo 116 do Código Penal. Eram apenas duas hipóteses. Contudo, este rol foi ampliado com o advento da Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019:

Art. 116 – Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre:

I – enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime;

II – enquanto o agente cumpre pena no exterior;

III – na pendência de embargos de declaração ou de recursos aos Tribunais Superiores, quando inadmissíveis; e

IV – enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não persecução penal.

O artigo 116, que originalmente previa duas hipóteses de suspensão da prescrição, passa a contar com quatro.

As novidades estão insertas nos incisos III e IV (o inciso II teve apenas sua redação alterada). 

Assim, a partir de agora, a prescrição não corre durante a pendência de embargos de declaração, bem como de recursos aos Tribunais Superiores, quando inadmissíveis. Deve-se analisar a não admissibilidade dos recursos para que haja a suspensão do prazo prescricional. A ideia é evitar a associação do sentimento da impunidade com o instituto da prescrição. Isso porque, sabe-se que, na prática forense, muitos manejos recursos meramente protelatórios com o intuito de abarrotar os tribunais que levarão anos para apreciá-los, levando assim o feito à prescrição.

Contudo, ao nosso ver, o que se criou foi uma causa impeditiva condicional, que certamente trará mais trabalho aos Tribunais Superiores.

Tal assertiva é perfeitamente ilustrada em texto de autoria de Franklyn Roger Alves Silva

O dispositivo alterado não trata das causas de interrupção da prescrição, mas das causas impeditivas de seu curso. Ou seja, uma vez interpostos os Embargos de Declaração ou manejados os recursos para as instâncias superiores a prescrição não correrá, conquanto que uma condição não se verifique, o acolhimento da impugnação recursal. Temos aqui uma verdadeira causa impeditiva condicional. Isto porque, não se pode se desconsiderar a hipótese de a prescrição ocorrer enquanto pendente de julgamento o recurso manejado ao tribunal superior. Todavia, o seu reconhecimento estará condicionado à apreciação e provimento da impugnação, já que a redação do dispositivo condiciona a inocorrência do fluxo prescricional ao não acolhimento do recurso, como forma de desestimulo ao recurso protelatório. Em outras palavras, obrigam-se os tribunais superiores, já assoberbados de processos, a apreciarem um recurso em processo potencialmente prescrito, cuja extinção da punibilidade estará condicionada ao acolhimento do apelo manejado pela defesa. O tribunal então, se acolher o recurso, na sequência declarará a prescrição já existente, tornando inútil o julgamento anterior de mérito.

Outra novidade diz respeito ao acordo de não persecução penal. É que com a Lei 13.964, criou-se o artigo 28-A do CPP que informa que não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as condições fixadas no aludido artigo e que será objeto de outro material nosso.

Quando da celebração do acordo fica suspensa a prescrição enquanto ele não for cumprido ou rescindido.

Entendemos que as modificações só podem ser aplicadas para os crimes cometidos após o início da vigência da Lei, já que a prescrição tem natureza penal, limitando o poder de punir. Disso se conclui que será afastado a regra do artigo 2° do CPP (A lei processual penal aplicar-se-á desde logo, sem prejuízo da validade dos atos realizados sob a vigência da lei anterior) , observando o que diz a Carta Magna:

Art. 5º XL – a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu.

Deste modo, as hipóteses dos incisos III e IV do artigo 116 só podem ser aplicadas aos crimes cometidos a partir da entrada em vigor da Lei 13.964/19. Vale mencionar que o inciso II só teve sua redação modificada, sem alteração de conteúdo da norma que dele se extrai.

Por fim, a prisão do indivíduo, por outro motivo, é uma causa suspensiva da prescrição. Enquanto o agente estiver preso por delito diverso, a prescrição não corre. Só voltará a correr quando ele for posto em liberdade, enfatizando que ele deveria estar preso por motivo diverso, ou seja, não em razão do delito cujo prazo prescricional estava suspenso.

A suspensão do curso do prazo prescricional, embora não possua prazo limite na legislação, foi objeto da Súmula 415 do Superior Tribunal de Justiça que possui a seguinte redação:

O período de suspensão do prazo prescricional é regulado pelo máximo da pena cominada. (Súmula 415, STJ)

Deste modo, superado o tempo que corresponda ao máximo da pena cominada, o prazo prescricional deve voltar a fluir, estando ou não superada a causa suspensiva, firme na Súmula 415 do STJ.

É o nosso entendimento, salvo melhor juízo.


FONTES AUXILIARES

PEREIRA, Jeferson Pereira. A novíssima Lei nº 13.964, de 2019 e o pacote anticrime. Disponível aqui. Acesso em: 20 jan 2020.

SILVA, Franklyn Roger Alves. A lei “anticrime” e seu paralelo com a reforma Bonafede na Itália. Revista Consultor Jurídico, 7 de janeiro de 2020. Disponível aqui. Acesso em: 27 jan 2020.


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Jairo Lima

Advogado Criminalista e Membro do Núcleo de Advocacia Criminal. WhatsApp: (89) 9.9474 4848.

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