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Para TJ-SP, condenado ao semiaberto não pode ser preso por ausência de vaga

A 13ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) decidiu, em análise do Habeas Corpus nº 2138472-78.2022.8.26.0000 que a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção de um condenado em regime prisional mais severo.

Os desembargadores utilizaram a Resolução 474 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que prevê que condenados em regime aberto e semiaberto não podem ser presos, quando verificada a inexistência de vagas nesses regimes, em regime mais gravoso.

TJ-SP
TJ-SP. Imagem: Jota.info

Para o TJ-SP, a substituição a prisão em regime fechado quando é estabelecido o semiaberto, viola, a um só tempo, os princípios da individualização da pena (artigo 5º, inciso XLVI) e da legalidade (artigo 5º, inciso XXXIX), ambos positivados na Constituição Federal de 1988.

O Habeas Corpus foi impetrado pela defesa de um réu que havia sido condenado por roubo, para cumprimento da medida em semiaberto. 

Não obstante a condenação ao semiaberto, em virtude da falta de vagas em unidade prisional adequada, o acusado teria que cumprir pena em regime fechado enquanto aguardava uma vaga no semiaberto.

Ao analisar o caso, o relator do writt, desembargador Luís Geraldo Lanfredi, apontou que os tribunais superiores possuem pacífica jurisprudência no sentido de que o recolhimento dos acusados à prisão trata-se de condição excessivamente gravosa.

“Pensar diferentemente é tolher do apenado o exercício pleno de sua defesa, com todos os meios e recursos a ela inerentes, tal como assegurado constitucionalmente”. 

Desta forma, os desembargadores da 13ª Câmara Criminal do TJ-SP votaram unânime para determinar a expedição da guia de recolhimento no sistema processual correspondente à condenação (semiaberto) e remetê-la ao juízo da execução da penal.

O acusado, por sua vez, deverá aguardar em liberdade uma vaga em unidade prisional adequada ao regime que lhe foi imposto. 

Ementa da decisão do TJ-SP:

Habeas Corpus. Roubo. Execução Penal. Mandado de prisão pendente de cumprimento. Condição para a expedição de guia de recolhimento. Reconhecimento de detração penal que pode implicar modificação ao cenário da execução da pena corporal imposta ao paciente. Constrangimento ilegal. Liminar indeferida. 1. Sistema progressivo de cumprimento de pena. Previsão projetada como ferramenta central da individualização da sanção. Situação que não se concretiza na prática. Cenário fático que resultou na banalização do conceito de prisão estrito senso e que leva pessoas condenadas a cumprir pena em regime inicial semiaberto ou aberto em centros de detenção provisória – em regime análogo ao fechado – para aguardar a disponibilização de vaga em estabelecimento prisional adequado ou até a respectiva liberação. 2. Contexto desencadeado, entre outros motivos, em razão de determinação do legislador acerca da imprescindibilidade do cumprimento de mandado de prisão como condição necessária para a expedição da guia de recolhimento que viabiliza o início da execução da pena privativa de liberdade propriamente dita. Inteligência do artigo 647 do Código de Processo Penal e do artigo 105 da Lei de Execução Penal. Cenário de flagrante ilegalidade, seja porque impede pessoas de postular perante o juízo das execuções penais acerca de temas a ele afetados, seja porque acaba permitindo o recolhimento e manutenção de pessoas indevidamente em meio mais gravoso do que aquele a que foi condenado, em virtude da falta ou inexistência de vaga em estabelecimento adequado. Controvérsia que já alcançou os Tribunais Superiores. Precedentes determinando a expedição de guia de recolhimento independentemente do cumprimento do mandado de prisão (AgRg no RHC 155785/MG, Rel. Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, o HC 599.475/SP, Rel. Ministro Rogerio Schietti Cruz e o HC 312.561/SP, Rel. Ministro Antonio Saldanha Palheiro). Julgamento do RE 641.320/RS que fixou o entendimento de que a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção de um condenado em regime prisional mais gravoso, eis que com essa providência se viola os princípios da individualização da pena – artigo 5º, inciso XLVI – e da legalidade – artigo 5º, inciso XXXIX, enquanto direitos individuais da pessoa presa, consagrados na Constituição Federal. 3. Edição da Súmula Vinculante nº 56, pelo STF. Necessidade de readequação da rotina administrativa de formação e instauração do processo de execução da pena privativa de liberdade, em conformidade à Súmula. 4. Conselho Nacional de Justiça. Pedido de Providências, formulado pela DPU, figurando como requerido o CNJ, deduzido para corrigir a distorção, a fim de que as pessoas que tenham respondido a processos em liberdade, uma vez condenadas ao cumprimento de pena em regime inicial aberto ou semiaberto, não sejam presas nem recolhidas a centros de detenção provisória – em regime análogo ao fechado – para aguardar a disponibilização de vaga em estabelecimento prisional semiaberto ou para simplesmente serem logo em seguida liberadas. Pedido de readequação do artigo 23 da Resolução CNJ nº 417/21 (que regulamenta o Banco Nacional de Medidas Penais – BNMP 3.0), julgado parcialmente procedente, estabelecendo nova regulamentação para a formação e instauração de processos de execução penal em todo o país. Determinação para que haja a intimação da pessoa condenada a pena privativa de liberdade em regime inicial semiaberto ou aberto, para início do cumprimento da pena corporal, sem que haja a necessidade da prévia expedição de mandado de prisão. 5. Hipótese dos autos. Paciente que foi condenado a cumprir pena privativa de liberdade em regime inicial semiaberto. Possibilidade de detração penal. Impedimento de se postular perante o juízo competente o reconhecimento do direito, enquanto negada a expedição de guia de recolhimento. Flagrante ilegalidade. Paciente que se encontra em liberdade, condenado em regime inicial semiaberto, por decisão transitada em julgado. Expedição da guia de recolhimento, e remessa ao juízo das execuções penais, independentemente da expedição de mandado de prisão. Verificação da existência de vaga em regime compatível. Expedição de mandado de prisão, única e tão-somente, se constatada a existência de vaga nesse regime adequado. 6. Ordem concedida, com determinação de expedição de contramandado de prisão e de guia de recolhimento, para remessa ao juízo das execuções penais. 

Fonte: Conjur

Daniele Kopp

Daniele Kopp é formada em Direito pela Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC) e Pós-graduada em Direito e Processo Penal pela mesma Universidade. Seu interesse e gosto pelo Direito Criminal vem desde o ingresso no curso de Direito. Por essa razão se especializou na área, através da Pós-Graduação e pesquisas na área das condenações pela Corte Interamericana de Direitos Humanos ao Sistema Carcerário Brasileiro, frente aos Direitos Humanos dos condenados. Atua como servidora na Defensoria Pública do RS.

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