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STJ define quando a sentença pode deixar de fazer a detração sem violar o art. 387, § 2º, do CPP

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não viola o art. 387, § 2º, do CPP a sentença que deixa de fazer a detração, quando o desconto do tempo de prisão cautelar não teria o condão de alterar o regime inicial de cumprimento de pena fixado ao réu.

A decisão teve como relator o ministro Rogerio Schietti Cruz:

Ementa

RECURSO ESPECIAL DA DEFESA DE JOSÉ DA SILVA MARTINS. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TRIBUNAL DO JÚRI. VIOLAÇÃO DE PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO. AUSÊNCIA DE COMPETÊNCIA DO STJ. SÚMULA N. 284 DO STF. DISPOSITIVO LEGAL DISSOCIADO DA TESE. SÚMULA N. 283 DO STF. NECESSIDADE DE REBATER TODOS OS FUNDAMENTOS DO ACÓRDÃO. JULGAMENTO EM PLENÁRIO. CONVOCAÇÃO DE JURADOS SUPLENTES PARA EVITAR ESTOURO DE URNA. POSSIBILIDADE. PAS DE NULLITÉ SANS GRIEF. PENA-BASE. CULPABILIDADE. CRIME PREMEDITADO. CONSEQUÊNCIAS DO DELITO. REPERCUSSÕES SOCIAIS QUE DESBORDAM DO TIPO PENAL. IDC N. 2. GRAVE VIOLAÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS. FUNDAMENTAÇÕES IDÔNEAS. DECOTE DE CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL SEM REDUÇÃO DA PENA. INEXISTÊNCIA DE RECURSO DA ACUSAÇÃO SOBRE DOSIMETRIA. REFORMATIO IN PEJUS CARACTERIZADA. DETRAÇÃO. NÃO REALIZAÇÃO EM SENTENÇA. INEXISTÊNCIA DE ILEGALIDADE. NÃO ALTERAÇÃO DO REGIME INICIAL. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, PROVIDO EM PARTE. 1. Não compete ao Superior Tribunal de Justiça o exame de suposta violação de princípios e dispositivos constitucionais, mesmo com o cunho de prequestionamento, por ser matéria reservada à competência do Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 102, III, da Constituição Federal. 2. Aplica-se a Súmula n. 284 do STF à alegação de infringência de dispositivo legal dissociado das razões recursais. 3. Consoante o entendimento da Súmula n. 283 do STF, é ônus do recorrente infirmar, com particularidade, todos os fundamentos nos quais é amparado o acórdão impugnado se cada um deles, por si só, é suficiente para manter o decisum. 4. O direito às recusas imotivadas previsto no art. 468 do CPP é garantia do próprio réu, de modo que cada acusado poderá recusar, sem necessidade de motivação, três pessoas sorteadas para compor o Conselho de Sentença. 5. Não há nulidade no ato de se convocar suplentes a fim de evitar a ocorrência de estouro de urna, possibilidade concretamente extraída do cotejo do número de réus com o número de jurados a serem sorteados. Na espécie, a Juíza Presidente do Tribunal do Júri sorteou dez suplentes para suprir os ausentes em igual quantidade e, assim, formar a lista de 25 jurados. A conduta da julgadora foi fundamentada na real possibilidade de ocorrer estouro de urna, uma vez que as defesas dos cinco réus informaram que fariam as recusas imotivadas separadamente. 6. A declaração de nulidade de determinado ato processual requer a demonstração de prejuízo à parte que a alega. Precedentes. 7. É cabível a exasperação da pena-base, pela análise desfavorável da culpabilidade, fundamentada na premeditação do crime. No caso, denota maior reprovabilidade a conduta do acusado que, segundo as instâncias ordinárias, planejou a consecução do crime por meio de reuniões anteriores ao dia dos fatos com o corréu e pediu emprestada arma de fogo de grosso calibre a terceiro. 8. São idôneos os argumentos despendidos pelos Juízos de origem para valorar negativamente as consequências do crime, uma vez demonstrado que o homicídio da vítima Manoel Mattos causou repercussões sociais que desbordam do tipo penal. Tal como reconhecido no IDC n. 2, além da inerente ofensa ao bem jurídico tutelado pelo art. 121 do CP, o crime constituiu grave violação dos direitos humanos, uma vez que teve como objetivo silenciar uma das vozes que se pronunciava contra execuções sumárias e ações de grupos de extermínio na região da divisa entre Pernambuco e Paraíba.  9. Afastada a análise desfavorável de circunstância judicial pelo Tribunal a quo, ante a inidoneidade de seus fundamentos, é necessária a redução proporcional da reprimenda, se não houver recurso da acusação acerca da dosimetria da pena. In casu, o TRF-5 considerou inválida a motivação da conduta social e da personalidade do agente para aumentar a pena-base, mas não reduziu a sanção do réu ao afastar as referidas vetoriais. 10. Aplica-se a Súmula n. 284 do STF quando não é possível compreender a controvérsia apresentada nas razões recursais, por não guardar pertinência com o que foi decidido pela Corte de origem. É igualmente aplicável o óbice sumular se a parte não aponta dispositivo legal com força normativa capaz de subsidiar o pleito formulado. 11. Não viola o art. 387, § 2º, do CPP a sentença que deixa de fazer a detração, quando o desconto do tempo de prisão cautelar não teria o condão de alterar o regime inicial de cumprimento de pena fixado ao réu. 12. Recurso parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido, apenas para redimensionar a pena do recorrente para 21 anos de reclusão. RECURSO ESPECIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TRIBUNAL DO JÚRI. CONTRADIÇÃO ENTRE O SEGUNDO E O TERCEIRO QUESITO. NÃO CONHECIMENTO. SÚMULA N. 283 DO STF. INTERPOSIÇÃO FUNDADA NA ALÍNEA “C”. AUSÊNCIA DE COTEJO ANALÍTICO. ART. 593, III, “D”, DO CPP. NÃO VIOLAÇÃO. DECISÃO DOS JURADOS AMPARADA NA PROVA DOS AUTOS. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, NÃO PROVIDO. 1. Consoante o entendimento da Súmula n. 283 do STF, é ônus do recorrente infirmar, com particularidade, todos os fundamentos nos quais é amparado o acórdão impugnado se cada um deles, por si só, é suficiente para manter o decisum. 2. Na hipótese, o TRF-5 afastou a alegação ministerial de contradição entre o segundo e o terceiro quesito por dois argumentos: (a) o quesito absolutório genérico é obrigatório e deve ser formulado independentemente das teses suscitadas na sessão de julgamento; (b) o acusado sustentou, em plenário, a tese de ausência de tipicidade, pela inexistência de dolo em prestar auxílio material ao executor. Qualquer um dos fundamentos é, por si só, bastante para manter o acórdão recorrido. Todavia, o Ministério Público não refutou, com particularidade, o segundo motivo. 3. A decisão tomada pelos jurados, ainda que não seja a mais justa ou a mais harmônica com a jurisprudência dominante, é soberana, conforme disposto no art. 5º, XXXVIII, “c”, da CF/1988. Tal princípio, todavia, é mitigado quando os jurados proferem decisum teratológico, em manifesta contrariedade às provas colacionadas nos autos, casos em que o veredito deve ser anulado pela instância revisora e o réu, submetido a novo julgamento perante o Tribunal do Júri. 4. Em apelação fundada no art. 593, III, “d”, do CPP, ao órgão recursal se permite, apenas, a realização de um juízo de constatação acerca da existência de suporte probatório para a decisão tomada pelo Conselho de sentença. Somente se admite a cassação do veredito se flagrantemente desprovido de elementos mínimos de prova capazes de sustentá-lo. Caso contrário, deve ser preservado o juízo feito pelos jurados, no exercício da sua soberana função constitucional, como ocorreu na espécie. 5. Na hipótese, os jurados escolheram a versão que lhes pareceu mais verossímil e decidiram a causa conforme suas convicções. Consoante o cotejo feito pela Corte de origem, a despeito de haver provas que corroboram a tese acusatória, há também elementos nos autos que respaldam a versão da defesa. 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
(REsp 1843481/PE, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 07/12/2021, DJe 14/12/2021)

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