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STJ: é lícita a prova obtida pela autoridade policial, sem autorização judicial, mediante acesso a registro telefônico

A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou, por unanimidade, provimento a agravo regimental, entendendo que é lícita a prova obtida pela autoridade policial, sem autorização judicial, mediante acesso a registro telefônico ou a agenda de contatos de celular apreendido ato contínuo no local do crime atribuído ao acusado, não configurando esse acesso ofensa ao sigilo das comunicações à intimidade ou a privacidade do indivíduo (CF, art. 5º, X e XII).

O Relator foi o Ministro Sebastião Reis Júnior. Participaram do julgamento os Ministros Rogerio Schietti Cruz, Antonio Saldanha Palheiro, Olindo Menezes (Desembargador Convocado do TRF 1ª Região) e Laurita Vaz.

EMENTA:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. LEGISLAÇÃO EXTRAVAGANTE. TRÁFICO DE DROGAS. TESE DE NULIDADE. VERIFICAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. MENSAGENS VIA WHATSAPP. PROVAS OBTIDAS NO APARELHO CELULAR SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. ACESSO A REGISTRO TELEFÔNICO/AGENDA DE CONTATOS EM ATO CONTÍNUO NO LOCAL DO CRIME ATRIBUÍDO AO RECORRENTE. OUTROS ELEMENTOS AUTÔNOMOS. APREENSÃO, EM FLAGRANTE, DE 49,850 KG DE MACONHA. FONTE INDEPENDENTE. SUFICIÊNCIA. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA. NÃO RECONHECIMENTO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. INTEGRAÇÃO À ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA IDONEAMENTE JUSTIFICADA. ALTERAÇÃO DO ENTENDIMENTO. INVIABILIDADE. SÚMULA 7/STJ.

  1. No que se refere à tese de nulidade relativa à apreensão de mensagens via whatsapp, a Corte de origem dispôs que a autoridade policial, ao iniciar a coleta do material probatório da prática da infração penal, deve, além de ouvir todas as pessoas que tenham conhecimento dos fatos, apreender todo o material que tiver com eles qualquer conexão. […] Desse modo, ao apreender os celulares dos réus e analisar os dados ali contidos, a autoridade policial agiu em conformidade com o que dispõe o artigo 6º, II e III, do CPP, na busca das provas acerca do envolvimento dos acusados com a venda de drogas. […] Sendo, por conseguinte, apreendidos os aparelhos celulares no momento do flagrante, não há que se falar em violação à garantia constitucional do sigilo. […] Frise-se que o acesso aos dados dos aparelhos celulares ocorreu somente após os acusados fornecerem as respectivas senhas para desbloqueio, autorizando, pois, a colheita de dados pela autoridade policial.
  1. Não se divide a presença de nulidade, porquanto, para a jurisprudência desta Corte Superior, é lícita a prova obtida pela autoridade policial, sem autorização judicial, mediante acesso a registro telefônico ou a agenda de contatos de celular apreendido ato contínuo no local do crime atribuído ao acusado, não configurando esse acesso ofensa ao sigilo das comunicações à intimidade ou a privacidade do indivíduo (CF, art. 5º, X e XII).

(STF, Plenário, ARE 1.042.075, decisão de 30/10/2020 – Repercussão Geral). […]. Fora dessa hipótese (celular apreendido ato contínuo no local do crime), a jurisprudência das Turmas que compõem a Terceira Seção firmou-se no sentido de considerar ilícita a devassa de dados e das conversas de whatsapp, obtidas diretamente pela polícia em celular apreendido sem prévia autorização judicial.

Precedentes (AgRg no HC n. 705.349/MG, Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF/1ª Região), Sexta Turma, DJe 20/5/2022).

  1. […] o reconhecimento da ilicitude da visualização de conversas de WhatsApp, sem prévia autorização judicial, não impede a manutenção da condenação quando se verifica que as instâncias ordinárias encontraram outros elementos que comprovam a materialidade e autoria do crime, sem qualquer indicação de terem as autoridades chegado a eles como decorrência da prova reconhecida como ilícita (AgRg no HC n. 694.410/RS, Ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, DJe 10/5/2022). No caso concreto, independentemente das provas colhidas nos aparelhos celulares, a droga apreendida no interior do carro (49,850 kg de maconha ? fl. 209) é suficiente a justificar o édito condenatório.
  1. Quanto ao pedido de reconhecimento da causa especial de diminuição de pena do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, as instâncias ordinárias asseveraram que, embora os réus sejam primários, exsurge dos autos que o envolvimento de ambos com o tráfico de drogas não era eventual, pois nos aparelhos celulares apreendidos com os acusados constam fotos de drogas, armas e balanças. […] Além disso, apesar de não ter sido possível acessar as conversas de Whatsapp, no celular de ROBSON foram encontrados áudios que evidenciam estar o réu trabalhando para um traficante não identificado, de quem seria o “corre”, ou seja, a pessoa responsável pelo transporte de drogas, como se observa da transcrição de fls. 311/312. […] Ou seja, a análise de apenas parte dos arquivos contidos nos celulares dos réus, posto que não foi possível acessar todo o conteúdo dos mesmos, já revela que os acusados eram, na realidade, traficantes habituais, e não pessoas que faziam esse tipo de conduta pela primeira vez ou de forma eventual. […] Os recorrentes também pleiteiam a aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no § 4º, art. 33 da Lei nº 11.343/2006, o que não merece amparo, visto que ambos segundo bem decidiu o juízo “a quo”, “a natureza e a quantidade das drogas apreendidas, bem como o teor dos dados retirados dos aparelhos celulares dos réus, demonstram que o material ilícito apreendido pertencia a uma associação criminosa, da qual eles concordaram em fazer parte, ao aceitar transportá-las, assumindo ambos um papel relevante para a distribuição de drogas”.
  1. Os fundamentos apresentados pelas instâncias ordinárias possuem robustez suficiente para justificar a negativa de aplicação do privilégio disposto na Lei de Drogas.
  1. Tendo as instâncias ordinárias concluído que o agravante não preenchia os requisitos para se beneficiar da causa de diminuição do art. 33, § 4º, da Lei n. 11.343/2006, mormente pela integração a uma organização criminosa, sobretudo porque a natureza e a quantidade das drogas apreendidas, bem como o teor dos dados retirados dos aparelhos celulares dos réus, demonstram que o material ilícito apreendido pertencia a uma associação criminosa, da qual eles concordaram em fazer parte, ao aceitar transportá-las, assumindo ambos um papel relevante para a distribuição de drogas (fl. 690), é inviável entender de modo diverso, dada a necessidade de revisão desses elementos fáticos, vedada em recurso especial, por força da Súmula 7/STJ.
  1. Agravo regimental desprovido.

(AgRg no REsp n. 1.768.954/CE, relator Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 27/9/2022, DJe de 30/9/2022.)

Fonte: EREsp nº 1768954 / CE

Priscila Gonzalez Cuozzo

Priscila Gonzalez Cuozzo é graduada em Direito pela PUC-Rio, especialista em Direito Penal e Criminologia pelo ICPC e em Psicologia pela Yadaim. Advogada e Consultora Jurídica atuante nas áreas de Direito Administrativo, Tributário e Cível Estratégico em âmbito nacional. Autora de artigo sobre Visual Law em obra coletiva publicada pela editora Revista dos Tribunais, é também membro do capítulo brasiliense do Legal Hackers, comunidade de inovação jurídica.

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